Eunice Marta - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Eunice Marta
Eunice Marta
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Licenciada em Filologia Românica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre (Mestrado Interdisciplinar em Estudos Portugueses) pela Universidade Aberta. Professora de Português e de Francês. Coautora do Programa de Literaturas de Língua Portuguesa, para o 12.º ano de escolaridade em Portugal. Ex-consultora do Ciberdúvidas e, atualmente, docente do Instituto Piaget de Benguela, em Angola.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Nós somos um grupo de estudantes que gostara de tirar uma dúvida em relação ao verbo haver. Estamos a elaborar um trabalho onde temos de saber a diferença entre o havia e o haviam, mas surgiu uma dúvida.

Sabemos que na utilização do havia não há sujeito, e que na utilização do haviam existe sujeito, mas, se o sujeito no haviam for «ele», continua a ser haviam, ou passa para havia?

Por exemplo, na frase: «Ele informou os colegas que haviam perdido a pen

Resposta:

Antes de responder às perguntas, há aspetos determinantes a referir sobre a particularidade deste verbo. Por isso, temos de ter em conta que o verbo haver pode ocorrer sob duas formas:

— como verbo existencial (ou impessoal, na terminologia tradicional), na aceção de «existir», o verbo haver é usado só na 3.ª pessoa do singular e «seleciona um argumento interno complemento/objeto direto, marcado com caso acusativo» (Mira Mateus et al., Gramática da Língua Portuguesa, Lisboa, Caminho, 2003, p. 302). Por isso, sempre que é usado com o valor de existir (como existencial/impessoal) nunca tem sujeito, mas complemento direto, o que se pode verificar nos seguintes exemplos:

«Haverá uma solução» [«uma solução» – compl. direto].

«Houve momentos de pânico» [«momentos de pânico» – compl. direto].

«Não acredito em bruxas, mas que as há, há» [«as» (pron. ) – compl.direto].

«Havia muita gente» [«muita gente» – compl. direto].

— como verbo auxiliar (verbo auxiliar dos tempos compostos) que, tal como o verbo ter, ocorre em sequências em que o verbo auxiliar precede o verbo auxiliado/principal (particípio passado ou no infinitivo). Neste caso, o verbo haver concorda com o sujeito da frase, sendo conjugado em todas as pessoas. Por exemplo:

«Havíamos comprado livros» (= «Tínhamos comprado livros») – sujeito (subentendido): nós.

«Hás de fazer este exercício» (= «Tens de fazer este exercício») – sujeito: tu.

...

Pergunta:

Gostaria de saber qual é a estrutura correta (ou, se as duas são corretas, quando é usada uma ou a outra):

«Pensei que fosse.»

«Pensei que era.»

Por exemplo, na seguinte frase:

«Pensei que o filme era mais comprido.»

«Pensei que o filme fosse mais comprido.»

A gramática normativa condena alguma das duas estruturas?

Resposta:

As duas formas verbais — imperfeito do indicativo [era] e do conjuntivo [fosse] — estão corretas, porque se trata de um caso em que é possível usar-se o modo indicativo ou/e o conjuntivo.

Enquanto verbos de orações completivas verbais de complemento/objeto direto1— «que fosse», «que era», «que o filme era mais comprido», «que o filme fosse mais comprido» —, selecionadas por um verbo epistémico [«Pensei»], a norma seleciona «o modo indicativo2» (Mira Mateus et al., Gramática da Língua Portuguesa, Lisboa, Caminho, 2003, p. 599), mas, por outro lado, também «é possível a ocorrência do modo conjuntivo mesmo quando a frase superior não é negativa [em completivas verbais selecionadas como argumento interno não preposicionado por verbos epistémicos]» (idem, p. 605), o que se pode observar através dos seguintes exemplos:

«Os estudantes pensavam que podiam repetir a prova.»

«Penso que ele ainda está na faculdade a esta hora.»

«Penso que ele ainda esteja na faculdade a esta hora.»

Portanto, uma vez que nos encontramos perante um caso «em que existe opção entre indicativo e conjuntivo, a seleção do modo conjuntivo exprime maior distância do locutor relativamente à verdade do conteúdo proposicional da frase completiva» (idem).

Nota: Importa referir que a única situação, com os verbos epistém...

Pergunta:

Mundo é nome comum, ou coletivo?

Resposta:

Se nos fixarmos nos significados, verificamos que o termo mundo designa «Universo», «parte do Universo e os seres que nele habitam», «Terra», «género humano», «planeta ou sistema de planetas; «cada um dos dois grandes continentes: o antigo e o novo; multidão» (Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora, 2010), «totalidade de astros e planetas», «o firmamento», «raça humana», «humanidade» (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, 2009).

Perante estas definições — e, apesar de o nome mundo se encontrar classificado como nome coletivo [«conjunto do espaço, corpos e seres que a vista humana pode alcançar»] por Luiz Autuori e Oswlado Proença Gomes, no capítulo «Coletivos», de Nos Garimpos da Linguagem (Liv. São José, 1959) —, temos algumas restrições em o enquadrar nesse tipo de nome, uma vez que não corresponde a um «conjunto de objetos ou entidades do mesmo tipo» (Dicionário Terminológico) nem a um «substantivo que, no singular, designa um conjunto de seres ou coisas da mesma espécie (Cunha e Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, Lisboa, Sá da Costa, 2002, p. 178).

Repare-se que um nome que designa «parte do Universo e os seres que nele habitam» ou «totalidade de astros e planetas» não representa «um dado conjunto que são uma parte plural encarada como um elemento [companhia, rebanho, equipa...]» (Mira Mateus et al., Gramática da Língua Portuguesa, Lisboa, Caminho, 2003, pp. 233-23...

Pergunta:

Montanha é nome comum, ou coletivo?

Resposta:

O termo montanha designa «monte muito alto e extenso», «relevo da crusta terrestre de altura considerável, de vertentes muito declivosas, que ocupa uma grande extensão», «grande volume, grande quantidade» (Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora, 2010), assim como «elevação significativamente alta e de base extensa em um terreno», «cadeia extensa de elevações, constituída por montes, penedos» e «grande elevação de qualquer coisa» (Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, 2009).

Ora, se tivermos como referência as definições das gramáticas e do Dicionário Terminológico para nomes coletivos1, apercebemo-nos de que o nome montanha não corresponde a um conjunto de elevações do mesmo tipo, significando, na grande maioria das vezes, uma elevação de grande volume e extensa. Por isso, montanha não se insere nos nomes coletivos, sendo um nome comum.

Repare-se que serra e cordilheira é que são nomes coletivos, pois designam conjuntos de montanhas. Não é por acaso que as serras e as cordilheiras têm nomes próprios, como, por exemplo: serra da Estrela, serra da Arrábida, serra do Marão, cordilheira dos Andes.

1 Segundo o Dicionário Terminológico, nome coletivo é «nome que se aplica a um conjunto de objetos ou entidades do mesmo tipo», definição que não difere da da gramática tradicional — «substantivos...

Pergunta:

Gostaria de saber se, segundo o novo AO, o nome dos continentes, países e cidades continua a escrever-se com letra inicial maiúscula.

Resposta:

O Acordo Ortográfico de 1990 não alterou a grafia dos nomes próprios, onde se incluem os nomes dos continentes e de todo o tipo de topónimos (nomes de países, cidades, vilas, aldeias e localidades), assim como dos nomes de pessoas (antropónimos), tal como se pode verificar pelo que estipula a Base XIX («Das maiúsculas e das minúsculas») do AO:

«A letra maiúscula inicial é usada:

a) Nos antropónimos/antropônimos, reais ou fictícios: Pedro Marques; Branca de Neve, D. Quixote.

b) Nos topónimos/topônimos, reais ou fictícios: Lisboa, Luanda, Maputo, Rio de Janeiro, Atlântida, Hespéria.»

Portanto, os continentes (Europa, África, Ásia, América, Oceânia) assim como os países (Portugal, Espanha, França, etc.), as cidades (Lisboa, Setúbal, Coimbra, Londres, etc.), as vilas e todos os outros topónimos continuam a escrever-se com maiúscula inicial1.

Relativamente à mudança para minúscula, o AO determina o seguinte: «A letra minúscula inicial é usada:

a) Ordinariamente, em todos os vocábulos da língua nos usos correntes.

b) Nos nomes dos dias, meses, estações do ano: