Na pesquisa que realizámos em bibliografia1 específica sobre ditados, expressões correntes e frases feitas, não encontrámos dicionarizada nem registada a expressão «Não há figos para ninguém».
No entanto, se fizermos uma breve análise dessa expressão — e tendo em conta o valor do figo como um fruto desejado, agradável —, poder-se-á inferir que está associada a algo como «já não há aqui nada de que possas usufruir», «já se acabou o que tu pretendias», sobressaindo uma ideia de negação, de perda de algo agradável que era objecto de desejo da pessoa a quem o sujeito de enunciação se dirige.
Se remetermos para a simbologia do figo — que, por ter «inúmeras sementes, está associado à fertilidade» (Jean Chevalier e Alain Gheerbrant, Dicionário de Símbolos, Lisboa, Teorema, 1994, p. 323) — e da figueira — que, tal como a oliveira e a videira, «simboliza a abundância» —, apercebemo-nos de que esse fruto está, desde as suas origens, ligado ao campo semântico da riqueza e do prazer. Esse conceito está bem explícito no provérbio «Uns comem figos, a outros rebenta-lhes a boca» (Grabiela Funk e Mattias Funk, Dicionário Prático dos Ditados Portugueses, Lisboa, Cosmos, 2008, p. 519), em que se evidencia o contraste entre a sorte de uns, representada pelos figos, e o azar de outros, que só conhecem o mal e o sofrimento.
1 Deolinda Milhano, Dicionário de Ditados (Provérbios) e Frases Feitas, Lisboa, Colibri, 2008; Grabiela Funk e Mattias Funk, Dicionário Prático dos Ditados Portugueses, Lisboa, Cosmos, 2008; R. Magalhães Júnior, Dicionário de Provérbios e Curiosidades, São Paulo, Cultrix, 1959; Orlando Neves, Dicionário das Origens das Frases Feitas, Porto, Lello & Irmão, 1992; Orlando Neves, Dicionário de Frases Feitas, Porto, Lello & Irmão, 1991; Orlando Neves, Dicionário de Expressões Correntes, Lisboa, Editorial Notícias, 1999; José Alves Reis, Provérbios e Ditos Populares, Lisboa-Porto, Litexa Editora, 1995; Alexandre Parafita e Isaura N. Fernandes, Os Provérbios e a Cultura Popular, Vila Nova de Gaia, Gailivro, 2007; Sérgio Luís de Carvalho, Nas Bocas do Mundo, uma viagem pelas histórias das expressões portuguesas, Lisboa, Planeta, 2010; Antenor Nascentes, Tesouro da Fraseologia Brasileira, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1986.