Eunice Marta - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Eunice Marta
Eunice Marta
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Licenciada em Filologia Românica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre (Mestrado Interdisciplinar em Estudos Portugueses) pela Universidade Aberta. Professora de Português e de Francês. Coautora do Programa de Literaturas de Língua Portuguesa, para o 12.º ano de escolaridade em Portugal. Ex-consultora do Ciberdúvidas e, atualmente, docente do Instituto Piaget de Benguela, em Angola.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Qual a silaba tónica da palavra compreendi?

Resposta:

Na forma verbal compreendi [com-pre-en-di], a última sílaba [di] é a sílaba tónica da palavra, razão pela qual se trata de uma palavra aguda ou oxítona, tal como sucede com o verbo com·pre·en·der (cf. Dicionário da Divisão Silábica).

Pergunta:

A palavra mais tem quantas sílabas?

Resposta:

O advérbio mais é constituído por uma só sílaba, pois os sons da palavra constituem um «grupo de sons pronunciados numa só expiração», razão pela qual é uma palavra monossílaba (cf. Cunha e Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, Lisboa, Sá da Costa, 2001, p. 54).

Repare-se que a sílaba de mais é formada pelo ditongo ditongo ai acompanhado de consoantes (mais).

Pergunta:

Encontramos sujeito simples em:

a) «Caíram no chão uma árvore e um poste.»

b) «Alguns passageiros do avião embarcaram nervosos.»

c) «Choveu torrencialmente de madrugada.»

d) «Armazenaram toda a comida em um depósito.»

Gostaria de saber a resposta correta.

Resposta:

A frase b) — «Alguns passageiros do avião embarcaram nervosos» — é aquela onde há um sujeito simples.

Repare-se que não é o facto de um sujeito ser plural que lhe confere a classificação de composto. Esse caso seria evidente se, em vez de «Alguns passageiros do avião» ocorressem dois pronomes ou dois grupos nominais, como, por exemplo, «ele e ela» ou «O João e a Maria». Assim, seriam casos de sujeitos compostos.

Importa lembrar que tanto a gramática tradicional como as novas correntes linguísticas são unânimes a nível da classificação de sujeito simples e composto. Repare-se na definição formulada pelos gramáticos Cunha e Cintra — «Quando um sujeito tem um só núcleo, isto é, quando se refere a um só substantivo/nome [Matilde entendia isso; Os olhos dela estavam secos], ou a um só pronome [Ele arrumava a gravata;  Esperam que eles as tomem], ou a um só numeral [Os dois riram-se satisfeitos], ou a uma só palavra ou expressão substantivada [O por fazer é só com Deus; Só o existirdes me consola], o sujeito é simples» (Nova Gramática do Português Contemporâneo, Lisboa, Sá da Costa, 2002, p. 127) — e pelo Dicionário Terminológico: «Sujeito constituído exclusivamente por um grupo nominal ([O Manuel] telefonou pelas nove horas) ou por uma oração ([Quem não arrisca] não petisca). A este contrapõe-se o sujeito composto.

Pergunta:

Qual a preposição, ou preposições, que rege(m) o adjetivo concomitante? Por exemplo, na frase:

«A política de preços é concomitante [da/com (a)/a (a)… ?] capacidade dos importadores em colocarem no mercado grandes quantidades do produto.»

Uma busca simples no Google (páginas de Portugal) devolve 4361 resultados para a preposição a (contraída com cada um dos artigos definidos — ao/à/aos/às), 16 800 para de (mais 10 750 quando contraída — do/da/dos/das) e um total de 41 623 para «com o/a/os/as».

Resposta:

A regência de concomitante é construída preferencialmente com as preposições com ou a, muito embora a ocorrência de de não seja impossível.

Com efeito, em relação a contextos em que concomitante tem a função de predicativo do sujeito, como acontece no caso apresentado, o dicionário Aurélio XXI apresenta exemplos da associação deste adjetivo a com e a para introduzir um complemento:

(3) «Sua partida foi concomitante com a chegada do irmão.»

(4) «A queda do avião foi concomitante à explosão.»

Também o Dicionário UNESP do Português Contemporâneo apresenta exemplos do uso predicativo de concomitante em que apenas figuram as preposições a e com:

(5) A vinda do ator ao Brasil será concomitante ao lançamento de seu filme.

(6) A redução das taxas inflacionárias será concomitante com a retomada do crescimento.

Noutras fontes, por exemplo, no Dicionário Houaiss ou no dicionário da Academia das Ciências de Lisboa (DACL),1 os exemplos aí apresentados incluem a preposição de aparentemente relacionada com o adjetivo em apreço, mas tal não se deve à regência:

(7) «Sintomas concomitantes de uma doença.» (DACL)

(8) «A análise concomitante dos discursos dos processos e da experiência cotidiana dos populares nos seus bairros possibilitou reconhecer o discurso e a representação dos atores.»

Pergunta:

Habituado é adjetivo, ou substantivo?

Não sei qual será a sua resposta, mas para o [Dicionário] Aurélio habituado é apenas substantivo.

Resposta:

A palavra habituado é mais frequentemente usada como adjetivo participal (do particípio passado do verbo habituar), como sinónimo de «acostumado, acomodado, adaptado», de que são exemplos as seguintes frases:

«Foi ela, a criança frágil, habituada a sofrer e a chorar, quem nos valeu e nos inoculou a energia com que chegámos a cabo de tantas canseiras» (Henrique Galvão, Velo d`Oiro, 238).

«Quem manda aqui sou eu! De repente compreendi que tinha caído nas mãos de um déspota, de uma pessoa habituada a vergar os outros aos seus caprichos» (Branquinho da Fonseca, Barão, 16).

Por sua vez, o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa contempla, para além do adjetivo, o substantivo/nome habituado, que designa «frequentador assíduo, certo, de um lugar», como se pode verificar pelo exemplo apresentado:

«Eles são habituados daquele bar.»

Contudo, este uso não parece ter difusão no Brasil* e é desconhecido em Portugal. De qualquer modo, importa acrescentar que nos parece ser o resultado da adaptação para português (um aportuguesamento) do estrangeirismo habitué — que pode ser um substantivo/nome ou um adjetivo, usado para designar «frequentador»:

«Ele é um habitué destas sessões de teatro.»

* Comunicação pessoal do consultor Luciano Eduardo de Oliveira, que também assinala que no Corpus do Português (Mark Davies e Michael Ferreira) se encontram cinco o...