Eunice Marta - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Eunice Marta
Eunice Marta
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Licenciada em Filologia Românica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre (Mestrado Interdisciplinar em Estudos Portugueses) pela Universidade Aberta. Professora de Português e de Francês. Coautora do Programa de Literaturas de Língua Portuguesa, para o 12.º ano de escolaridade em Portugal. Ex-consultora do Ciberdúvidas e, atualmente, docente do Instituto Piaget de Benguela, em Angola.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

O que está correto?

«O facto do aluno não respeitar...», ou «O facto de o aluno não respeitar...»?

Resposta:

«O facto de o aluno não respeitar» é a forma correta, uma vez que a preposição não se deve contrair (com o artigo ou qualquer outro determinante) quando é seguida de uma oração de infinitivo.

Pergunta:

O que é mais correcto dizer-se: desfar-se-iam, ou desfazer-se-iam?

Resposta:

Tal como dir-se-iam (desdir-se-iam) e far-se-iam, desfar-se-iam é a forma correta.

Como se trata de uma forma (pronominal) do verbo desfazer, cuja conjugação é feita como a do verbo fazer1, tem como base a mesma forma irregular do futuro e do condicional [faria(m)], seguindo a regra da formação do condicional (e do futuro) dos verbos reflexivos ou conjugados pronominalmente, em que o pronome é colocado no interior da forma verbal (mesóclise pronominal) após o infinitivo do verbo e antes da forma reduzida -iam.

Nota: Importa lembrar que o futuro e o condicional são formados habitualmente «pela aglutinação do infinitivo do verbo principal às formas reduzidas do presente e do imperfeito do indicativo do auxiliar haveramar + hei = amarei; amar + hia = amaria» (Cunha e Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, Lisboa, Sá da Costa, 2001, p. 391). No entanto, como se trata de uma conjugação pronominal, em que há a colocação do pronome (mesóclise) no interior das formas do condicional, o pronome emprega-se depois da forma abreviada de infinito (far) do verbo principal (de far + ia) — e antes da desinência própria daquele tempo verbal -iam.

1 No futuro e no condicional, os verbos dizer, fazer e trazer perdem a consoante -z- do radical (usada nas formas regulares: dizemos, trazes, fazes ou dizes, do presente do indicativo), e usam uma outra fo...

Pergunta:

A expressão «valorização do mérito» constitui, ou não, um pleonasmo?

A pergunta é feita com base no raciocínio de que o substantivo mérito significa justamente «valor/valorizar».

Resposta:

De facto, ao substantivo/nome mérito está associada a ideia positiva de «valor ou qualidade apreciável», ou, ainda, de «conjunto de qualidades intelectuais e morais que são especialmente valorizadas», razão pela qual é sinónimo de «virtude», de «superioridade», de «excelência», de «merecimento» e de atributo «que torna alguém digno de apreço, aprovação ou consideração» ou «que torna alguém merecedor de recompensa». Por isso, a palavra mérito assume, naturalmente, tom elogioso, sendo usada como termo que dignifica algo ou alguém pelas suas particularidades excecionais, como se pode verificar pelos seguintes exemplos:

«Obra de mérito»

«Pessoa de mérito»

«É num mérito saber escolher as boas influências»

«Na realidade, o mérito pertence aos médicos que estão a trabalhar nos centros de saúde» (DAR, 23/03/1990).

Por sua vez, a palavra valorização (de valorizar + suf. -ção) designa «ação ou resultado de atribuir valor a alguém ou alguma coisa ou de lhe conferir mais valor ou importância».

Ora, o mérito de alguém pode ser reconhecido por alguns, mas é frequentemente minimizado por outros, não sendo sempre valorizado por todos, razão pela qual nem sempre é objeto de valorização pública.

Por isso, embora o uso dos dois termos possa, à primeira vista, parecer redundante — o que se tornaria um caso de pleonasmo —, a verdade é que mérito e valorização não são sinónimos, pois um não implica o outro. Pode haver mérito e não haver valorização, assim como pode haver casos de valorização de algo que não tenha mérito. Parece um jogo de palavras, mas, de facto, não o é.

Fontes: Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia das Ciências de ...

Pergunta:

Como se deve dizer? «Esta menina é uma excelente música»... Como se deve dizer no feminino? Músico, ou música?

Resposta:

Embora pareça estranho, tanto o Vocabulário Ortográfico do Português (do ILTEC) como o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa1 (da Porto Editora) só registam a forma feminina — música — do adjetivo músico, mas não exibem o feminino do nome/substantivo músico (= «aquele que compõe, canta e/ou toca música profissionalmente ou como passatempo»), contemplando somente a flexão no plural — músicos.

Por outro lado, o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa indica o nome/substantivo música como feminino de músico.

Ora, na frase apresentada — «Esta menina é uma excelente música» —, a palavra música é um nome, e não um adjetivo, o que pode lugar a dúvidas sobre a correção da flexão.

No entanto, e como não há qualquer indicação nas gramáticas de que músico é um nome/substantivo comum de dois géneros — o que implicaria que se «distinguem o masculino do feminino pelo género do artigo ou determinante acompanhante» (Cunha e Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, Lisboa, Sá da Costa, 2001, p. 196), tal como no caso de «o artista»/«a artista» — nem de um caso de «substantivos term...

Pergunta:

Quais as palavras da família de autocarro?

Resposta:

Segundo o Dicionário Terminológico, família de palavras é o «conjunto das palavras formadas por derivação ou composição a partir de um radical comum. Exemplos: mar, maré, marítimo, marinheiro, marina são palavras da mesma família».

Ora, o nome/substantivo autocarro (o mesmo que ônibus no Brasil) tem sido classificado, precisamente, como uma palavra derivada por prefixação (auto- + carro), uma vez que o elemento auto- aparece frequentemente classificado como prefixo (sobretudo quando analisado como um prefixo resultante da truncação de automóvel).

Por sua vez, o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa indica que a palavra autocarro foi introduzida em português por empréstimo do francês autocar, por sua vez adaptação «do ing[lês] autocar, "automóvel", com especialização de sentido para (1895) "carro automóvel equipado para o transporte coletivo de passageiros"».

Por isso, e uma vez que se tem estabelecido como critério de identificação da família de palavras a ocorrência de radical comum1, parece-nos que teremos de considerar autocar como referência para a identificação de palavras da mesma família. Portanto, os nomes autocarro-biblioteca e miniautocarro são exemplos de palavras que pertencem à família de palavras de autocarro.

Nota: Para questões deste tipo, aconselha-se a pesquisa no Portal da Língua Po...