D´Silvas Filho - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
D´Silvas Filho
D´Silvas Filho
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D´Silvas Filho, pseudónimo literário de um docente aposentado do ensino superior, com prolongada actividade pedagógica, cargos em órgãos de gestão e categoria final de professor coordenador deste mesmo ensino. Autor, entre outros livros, do Prontuário Universal — Erros Corrigidos de Português. Consultor do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa.

 
Textos publicados pelo autor
Estrangeirismos

Artigo que faz parte de um projeto de melhoria do Acordo Ortográfico de 1990 em que o autor está envolvido. Trata-se de um conjunto de critérios para aplicação aos estrangeirismos (substituição por formas vernáculas, adaptação à língua, manutenção da grafia original).–

Pergunta:

Tentei esclarecer um comentador do Eurosport, acerca do relato da leitura de cronometragem dos tempos. Lê esse comentador em directo: «Fulano fez o tempo de um minuto, cinquenta e dois segundos e quinze centésimas» (ponto). Quando devia dizer centésimos, uma vez que na leitura do tempo se refere aos segundos que precederam a leitura consecutiva desse tempo em concreto, não às partes dum segundo desse tempo. O caso é importante, porque num canal especializado em desporto, seguido maioritariamente por desportistas e pessoas ligadas ao desporto, causa algum desconforto ouvir a cronometragem de forma diversa da corrente! Porém gerou-se uma discussão, e esse comentador defendeu-se com o que está exposto [numa resposta] que é, aliás, o único exemplo em toda a Internet que de certa forma está de acordo com uma forma errada de relatar os tempos!

Resposta:

Dizemos que o centímetro é a “centésima” parte do metro. Mas também dizemos “euros e cêntimos” (abreviatura de centésimo). No primeiro caso, estamos em presença de um adjetivo numeral que qualifica parte; no segundo caso, em presença de um nome. Obviamente, deve escrever-se segundos e centésimos do segundo, como euros e cêntimos.

O leitor de Ciberdúvidas interpretou mal a minha resposta em linha. Na resposta assinala-se muito claramente: que «cada uma das partes é uma décima (parte)» e que cada intervalo pode ser designado por «um» décimo (de segundo).

O consulente Fernando Pereira também não pode dizer que a resposta está errada. No seu caso, porém, a verdade é que tem razão no facto de que está incompleta, e, por isso, deu lugar a confusões.

Eu deveria ter acrescentado que uma das qualidades que se exigem na língua é a propriedade na escolha das palavras. O nosso P.de António Vieira deu-nos uma lição magistral no seu Estatuário: pois num pequeno trecho usa mais de uma dezena de verbos diferentes para os movimentos do escultor: «Ondeia-lhe os cabelos, alisa-lhe a testa, rasga-lhe os olhos, etc.» com cada verbo propriamente escolhido para a ação descrita.

Ora, no nosso caso em apreço, os termos, embora equivalentes, têm cada um a sua aplicação própria. As duas designações são equivalentes no seu significado, mas não podem ser usadas indiferentemente. E podemos sintetizar a resposta, agora com propriedade, na frase: «cada uma das centésimas partes de um segundo é o centésimo de segundo.»

Ao seu dispor.

«Crise humanitária», expressão válida?

Sim, responde o nosso consultor D’Silvas Filho, concordando com a recomendação1 da Fundación del Español Urgente (Fundéu), como fazíamos referência na Abertura de 13/04 p.p. Muito diferente – acrescenta – de «tragédia “humanitária”, que vai mais longe no sentido pretendido: há nesta expressão desumanidade (podendo ser intencional: atrocidade, crueldade, selvajaria, ou incidental com os mesmos efeitos).»

 

 

Pergunta:

Segundo sei, e pelo que consegui pesquisar aqui no Ciberdúvidas em respostas a outras perguntas, o AO não altera a grafia dos nomes próprios, nos quais se incluem os nomes de continentes, países e demais topónimos.

Assim sendo, julgo que, mesmo com AO, a grafia correcta do nome do continente gelado seria Antárctida, e não Antártida. Eventualmente, seriam admitidas ambas as grafias, caso em português do Brasil se escrevesse já antes sem c. O mesmo se passaria com Círculo Polar Árctico/Ártico.

Seguindo ainda a lógica do AO, apenas nos adjectivos se suprimiria o c, como, por exemplo, em «o frio antártico/ártico».

Pedia, por favor, que me esclarecessem se este raciocínio está correcto, ou se, afinal, as novas grafias passam a ser Antártida/Círculo Polar Ártico e estamos perante mais uma das excepções à regra do AO.

Obrigado!

Resposta:

Nenhuma base do Acordo de 1990 recomenda que se mantenham sempre inalteráveis os nomes próprios usados na norma anterior. O que consente é unicamente (Base XXI) que se possa usar essa grafia no caso de haver costume ou registo público de assinaturas, firmas comerciais, nomes de sociedades, marcas ou títulos.

Quando há um novo acordo ortográfico, os dicionários onomásticos são atualizados para a nova ortografia. Por exemplo, as escritas antigas Nazareth, Victor passaram a ser Nazaré, Vítor em normas posteriores. De esperar que o mesmo aconteça com o novo AO quanto aos nomes próprios não abrangidos pela Base XXI.

Como parênteses, registe-se que, na Norma de 1945, a Enciclopédia Portuguesa e Brasileira tem Antárctida e Antárctica, mas que Rebelo Gonçalves só aceita o topónimo Antárctida. Antárctica/o era um adjetivo (ex.: oceano Antárctico).

Lembremos agora que no Acordo de 1990 (novo AO), segundo a Base IV e na sequência consonântica -ct-, a consoante etimológica c pode ser suprimida se for muda (ex.: acionar, exato). Assim, como em Portugal esta consoante não é articulada no vocábulo em apreço, a grafia conveniente do topónimo no português europeu é Antártida. Notar que o idóneo corretor da Priberam nem aceita Antárctida para o novo A...

Pergunta:

Gostaria de saber como se escrevem as palavras "intragrupo" e "interquartil", no antigo e no novo Acordo Ortográfico.

Obrigada.

Resposta:

 

Intragrupo

NORMA ANTERIOR A 1990

O vocábulo intragrupo aparecia registado no Vocabulário da Academia Brasileira de Letras (ABL) anterior ao novo Acordo.

Rebelo Gonçalves não regista este vocábulo.

A grafia estava, contudo, também correta na nossa Norma anterior ao novo AO, porque o segundo elemento começa com uma consoante que recomenda a fusão (ex.: como em intracerebral, intramuros, etc.).

ACORDO DE 1990

O vocábulo intragrupo está registado no Vocabulário da Academia Brasileira de Letras para o novo AO (VOLP da ABL) em linha.

Não foi encontrado no Vocabulário Comum (VOC) em linha; igualmente não foi encontrado no Vocabulário Ortográfico do Português (VOP) do ILTEC para o novo AO.

Mas está correto nas regras do novo AO e abonado pelo VOLP da ABL.

Interquartil

NORMA ANTERIOR A 1990

O vocábulo interquartil aparecia registado no Vocabulário da ABL anterior ao novo AO.

Não foi encontrado em Rebelo Gonçalves.

A grafia estava também correta na nossa Norma anterior ao n...