Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Gostaria de saber se, segundo a norma culta, a raça canina se escreve "perdigueiro-português" ou "perdigueiro português". Li a resposta sobre pastor-alemão, mas este é um caso especial, pois trata-se de nome criado e registrado por associação privada. Se possível, peço-lhes ainda que expliquem por que se deve escrever dessa ou daquela forma.

Obrigado.

Resposta:

Recomendo perdigueiro-português, pelas razões que adiante exponho.

Antes da adopção do novo Acordo Ortográfico (AO 1990), a situação era esta:

— em Portugal, recomendava-se pastor-alemão, com hífen, seguindo o Vocabulário da Língua Portuguesa, de Rebelo Gonçalves, pelo que a tendência era hifenizar nomes de espécies, subespécies e raças animais (lobo-marinho, lobo-d´alsácia, gato-bravo);

— no Brasil, os dicionários registavam pastor alemão, sem hífen (Aurélio XXI, publicado em 1999, e Dicionário Houaiss, versão brasileira, de 2001).

A respeito do nome em questão, não encontro registos lexicográficos, mas suponho que as tendências atrás indicadas também eram aplicáveis: perdigueiro-português, em Portugal, e perdigueiro português no Brasil.

O AO 1990 unifica estes casos, porque determina que em compostos que designam espécies botânicas e zoológicas se use sempre o hífen (Base XV, 3.º): donde, perdigueiro-português.

Pergunta:

A palavra farinha-de-pau é aguda? As palavras justapostas mantêm uma acentuação independente, mas não posso dizer que farinha-de-pau é grave e aguda, se tivesse de classificar esta palavra quanto à sua acentuação, certo?

Muito obrigada.

Resposta:

A palavra farinha-de-pau é aguda, pelo menos, na transcrição fonética disponível no dicionário da Academia das Ciências de Lisboa, a qual apresenta acento tónico na última sílaba: [fɐɾiɲɐdɨpáw]. Existe um acento secundário em farinha, na sílaba -ri-, mas este aspecto não costuma ser considerado no contexto dos ensinos básico e secundário.

Pergunta:

Cidades como Chicago, São Francisco, Atlanta, Sacramento, Colúmbia, Honolulu teriam gentílico na nossa língua?

Muito obrigado.

Resposta:

Nem sempre, porque, como já temos dito, há muitas regiões e cidades, quer no mundo de língua portuguesa quer fora dele, que não têm gentílico generalizado. Mesmo assim, apresento algumas breves sugestões:

Chicago: chicagoano (como criação de Luiz Autuori e Oswaldo Proença Gomes, Nos Garimpos da Linguagem, Rio de Janeiro, Livraria S. José)1

São Francisco: sanfranciscano (idem; criação dos autores citados)

Atlanta: não existe forma generalizada

Sacramento: não existe forma generalizada.

Colúmbia: não existe forma generalizada.

Honolulu: honoluluense (cf. chicagoano e sanfranciscano; criação dos autores).

1 Os autores da obra em referência assinalam os gentílicos que são sua criação («Os gentílicos com asteriscos são dos AA»).

Pergunta:

Quais são os gentílicos de Beirute, capital do Líbano? Tenho encontrado "beirutense", "beirutino", "beirutiano", mas nenhum está dicionarizado, daí a minha dúvida.

Que irrompa o gêiser vigorosíssimo de sabedoria chamado Ciberdúvidas!

Muito obrigado.

Resposta:

Todas as formas apresentadas são morfologicamente válidas, mas só beirutense encontro registado como proposta de Luiz Autuori e Oswaldo Proença Gomes, autores da obra Nos Garimpos da Linguagem (Rio de Janeiro, Livraria S. José).

Pergunta:

Ainda que se possa usar o próprio sobrenome conforme a tradição familiar o escreve, ou conforme está no registro civil, e esta regra vale para todos, gostaria de vos perguntar se os apelidos portugueses Bonfilho, Bompeixe, Bonpeixe passaram a Bom Filho e Bom Peixe, a partir da nova ortografia do século XX.

Creio que, apesar de se poder usar os sobrenomes de família como se tem costume, ou conforme o registro civil, há, todavia, a forma correta, e portanto melhor, do ponto de vista da moderna ortografia portuguesa. Vede os casos Queiroz/Queirós, Rezende/Resende, Corrêa/Correa/Correia, nos quais Queirós, Resende, Correia são as grafias corretas e melhores.

Muito obrigado.

Resposta:

Do ponto de vista da actual ortografia portuguesa, pode escrever Bonfilho ou Bom Filho, Bompeixe ou Bom Peixe. O primeiro apelido/sobrenome é registado por José Pedro Machado, no Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa apenas como Bom Filho, embora a sua origem, «do latim eclesiástico Bonfilius, legitime a forma aglutinada. Sendo assim, só Bonpeixe se justifica pelo critério do costume ou de outra circunstância aceite em registo civil.