Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Uma vez que existem obras de carácter normativo para a língua portuguesa que permitem a forma intoxicar (em que o x tem valor de "ch"), será que é igualmente permitido dizer tóxico ("tóchico") e toxinas ("tochinas")?

Resposta:

A pronúncia do x de tóxico como o x de baixo (consoante fricativa lâmino-pré-palatal surda, cujo símbolo fonético é [ʃ]; cf. António Emiliano, Fonética do Português Europeu: Descrição e Transcrição, pág. 107) não está registada nem no dicionário da Academia das Ciências de Lisboa nem no Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora, os quais transcrevem essa palavra como [`tɔksiku]. O mesmo acontece com toxina, transcrita como [`tɔksinɐ]. Por isso, recomenda-se a pronúncia com [ks].

Pergunta:

Repetidamente se tem afirmado aqui que «ter que ver com» está correcto e «ter a haver com» está errado. Nunca vi, na argumentação, qualquer referência ao latim para consubstanciar essa afirmação. Porquê? O latim não nos pode ajudar aí?

Por outro lado chamo a atenção de que o equivalente em inglês é «this has nothing to DO with that», e em holandês é «dit heeft daar niets mee te MAKEN». Em ambos os casos, os verbos (to do e maken) estão mais próximos do sentido de haver do que de ver, o que pode indiciar que a vossa interpretação pode não estar correcta. Quererão V. Exas. voltar a este assunto?

Resposta:

Sobre as origens latinas da expressão portuguesa (sinónima de «dizer respeito a») e das suas equivalentes noutras línguas de origem europeia, não encontro informação clara. Uma tradução latina acessível de «ter que ver com» ou «ter a ver com» parece ser feita com o verbo pertinēre («estender-se até, ir até, chegar a; tender a, ter por fim, visar a; referir-se, dizer respeito a», Dicionário Houaiss, s. v. ten-), o qual, como se vê, é uma unidade vocabular, mas não uma expressão fixa de dois ou mais termos. Tampouco acho elementos sobre uma hipotética origem no latim vulgar ou no latim usado como língua franca, administrativa e científica, em grande parte da Europa; supondo que estas variedades do latim tiveram influência sobre a genaralidade das línguas europeias (românicas ou não), seria de esperar que esta conjectura permitisse compreender um pouco melhor as semelhanças e dissemelhanças entre a expressão portuguesa e as suas equivalentes. Trata-se de uma investigação por fazer.

Já não me parece válido invocar o inglês e o neerlandês para apoiar a legitimidade de haver em lugar de ver na expressão em apreço, porque o que mostra a correspondência termo a termo entre as três expressões é o seguinte:

a) o verbo inglês have (has) e o neerlandês hebben (heeft) traduzem-se por ter;

b) o verbo inglês do e o neerlandês maken traduzem-se por fazer;

c) dizer que fazer está mais próximo de haver do que de ver é uma afirmação apressada, porque não se diz de que ponto de vista é avaliada essa proximidade semântica: por exemplo, a afinidade com haver pode igualmente relevar de certa...

Pergunta:

Seria "Hasmoneus" ou "Asmoneus" a denominação daqueles reis judeus também conhecidos como Macabeus?

Creio que todas estas formas admitiriam flexões de gênero e número, não? Também funcionam ora como substantivos próprios, ora como adjetivos, não?

Quando devem ser escritas com inicial maiúscula ou minúscula?

Poderiam dar exemplos em todos os casos?

Obrigadíssimo eternamente.

Resposta:

Só num artigo da Wikipédia encontro Hasmoneus; noutras fontes a palavra não tem h inicial. Na verdade, a Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira (Página Editora, 1998) regista Asmoneus, sem h, que é o mesmo que Asmoneanos, «nome por que se designa a família dos macabeus, originária de Asmon, a qual governou a Judéia durante um período de 126 anos» (mantive a ortografia do original). Estas formas são confirmadas por José Pedro Machado, que as regista no seu Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa.

No Dicionário Houaiss, ocorre asmoniano, sem h e com o sufixo -iano, à semelhança de termos como açoriano e cabo-verdiano. A forma está correcta, na medida em que asmoniano deriva de Asmon e não da sequência asmone- deduzida de asmoneu.1 Estes termos usam-se como adjectivo e substantivo, admitindo contraste de género e flexão em número: asmoneu, asmoneia (como macabeia), asmoneus, asmoneias; asmoniano, asmoniana, asmonianos, asmonianas. Têm a seguinte definição: «relativo aos asmonianos, de cuja família descendem os macabeus, ou indivíduo desse grupo [Os macabeus obtiveram a liberdade religiosa para os judeus em 162 a. C.] [...]» (idem).

Quanto à maiúscula inicial em nomes como estes, em Portugal, neste momento ainda se aplica o que prevê a Base XXXIX do

Pergunta:

Como se chama o natural ou habitante da Crimeia, península e república autônoma da Ucrânia? Seria mesmo "crimeano", como tenho visto?

Muito obrigado.

Resposta:

Não encontro forma dicionarizada nem generalizada pelo uso. Crimeano é palavra bem formada, à semelhança de coreano, relativo a Coreia, que termina em -eia como Crimeia. Outra forma é admissível: por exemplo, crimeense, se se tiver em conta que o natural ou habitante de Niceia, nome próprio também terminado em -eia, pode ser chamado niceense ou niceno (cf. Dicionário Houaiss).

Pergunta:

Gostaria que me facultassem uma palavra derivada por prefixação da palavra primitiva medo.

Obrigada.

Resposta:

Termo dicionarizado ou de uso generalizado, não encontro, mas, como criação pontual, posso admitir antimedo, devidamente contextualizado.