Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Gostaria de saber qual das duas frases que se seguem está correcta, ou se estão ambas correctas:

«Apelidou-o ignorante.»

«Apelidou-o de ignorante.»

Obrigado.

Resposta:

As duas frases estão correctas, mas sucede que o uso do verbo apelidar com a preposição de é o que se encontra registado com mais frequência em dicionários de regências e outras obras afins (por exemplo, Vocabulário — Regime Preposicional de Verbos, de Carmen Nunes e Leonor Sardinha, e o Dicionário Estrutural, Estilístico e Sintáctico da Língua Portuguesa, de Énio Ramalho). O Dicionário Sintáctico de Verbos Portugueses, de Winfried Busse, apresenta as duas possibilidades de uso, com e sem preposição: «Sempre o apelidei de burro e não me enganei»; «apelido-o "moço de fretes"».

Pergunta:

Qual o gentílico das antigas Honduras Britânicas, atual Belize? Caso exista, por favor, dizei-me se ele funciona como adjetivo e substantivo.

Resposta:

Em relação à antiga designação Honduras Britânicas não encontro gentílico  que lhe corresponda em obras publicadas em português antes da mudança de nome do território em 1973 ou da data de independência, em 1981 (cf. Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira e Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura Verbo).

Como nome pátrio correspondente a Belize, o Dicionário Houaiss e o Aulete Digital registam belizenho, quer como substantivo, quer como adjectivo. O Dicionário Houaiss acolhe também a forma belizense.

Pergunta:

Bom dia!

Gostaria de saber se é incorrecto dizer «contactar com ele». Segundo opinão de um amigo, «contactar» já implica «com», devendo então dizer-se «contactá-lo».

Obrigada.

Resposta:

O verbo contactar pode ser usado quer como transitivo directo («contactar alguém»), quer como transitivo indirecto, seleccionando um complemento oblíquo («contactar com alguém»), conforme se pode consultar no Dicionário Sintáctico de Verbos Portugueses, de Winfried Busse (Coimbra, Livraria Almedina, 1994).

Pergunta:

Ouvi hoje uma palavra horrível que não ouvia há imenso tempo: lambisgoia.

Por curiosidade, fui perceber de onde vinha tal palavra, e o dicionário sugere origem em lambiscar, que significa depenicar ou comer pouco.

É possível explicar a evolução da palavra e qual é a sua origem?

Melhores cumprimentos à equipa do Ciberdúvidas.

Resposta:

O substantivo do género feminino lambisgóia,1 parece ter relação com lamber, pelo menos, no que se refere ao radical lamb-, que a palavra exibe. No entanto, torna-se difícil determinar com precisão a origem da sequência -(i)sgóia. José Pedro Machado, no Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, propõe como hipótese que lambisgóia se ligue a  lambiscar, «comer pouco, depenicar» (cf. Grande Dicionário da Língua Portuguesa, também de José Pedro Machado), por sua vez derivado de lamber. O Dicionário Houaiss indica apenas que se trata de «voc[ábulo] expressivo pej[orativo], prov[avelmente] cunhado a partir de lamber».

1 Segundo o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa (que já aplica o Acordo Ortográfico de 1990), lambisgóia é palavra usada nas seguintes acepções: «1. [Informal, Depreciativo]  Mulher desenxabida. 2. [Informal, Depreciativo]  Mulher pretensiosa e antipática. = CONVENCIDA 3. [Informal, Depreciativo]  Mulher intriguista. = METEDIÇA, MEXERIQUEIRA»

Pergunta:

Tenho uma prima que é cônsul, a questão é: como é feminino, diz-se «a minha prima é consulesa», ou a «minha prima é cônsul»?

Obrigado.

Resposta:

Pode usar cônsul também em referência a um indivíduo do sexo feminino.

Em princípio, o feminino correspondente a cônsul será consulesa, tendo em conta que esta forma se encontra dicionarizada na acepção de «funcionária do Ministério dos Negócios Estrangeiros de um país que exerce a sua atividade em país estrangeiro e tem a seu cargo a defesa dos interesses dos seus compatriotas e das boas relações comerciais entre os dois países», a par da mais tradicional «esposa do cônsul» (Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora, disponível na Infopédia).

Contudo, verifica-se actualmente a tendência para usar cônsul como substantivo uniforme («o/a cônsul»), independentemente de se tratar de um funcionário ou de uma funcionária, conforme explica Evanildo Bechara na sua Moderna Gramática Portuguesa (2002, pág. 134):

«As convenções sociais e hierárquicas criaram usos particulares que nem sempre são unanimemente adotados na língua comum. Todavia já se aceita a distinção, por exemplo, entre a cônsul (= senhora que dirige um consulado) e a consulesa (= esposa do cônsul), a embaixadora (= senhora que dirige uma embaixada) e Embaixatriz (= esposa do embaixador).»