Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

A palavra autocarro é derivada, ou composta?

Resposta:

Não me parece fácil dar uma resposta inequívoca.

Do ponto de vista sincrónico, isto é, considerando o funcionamento do português numa dada fase, no caso atual, podemos descrever a palavra de duas maneiras:

a) composto morfológico, dado que auto- é um radical de origem grega que significa «mesmo», tal como acontece em autoconfiança ou autómato;

b) contudo, o elemento auto- aparece frequentemente classificado como prefixo, sobretudo quando analisado como um prefixo resultante da truncação de automóvel; nesse caso, diz-se que autocarro é uma apalavra derivada por prefixação.

Não obstante, do ponto de vista da história da palavra, não se confirmam as análises em a) e b). Na verdade, o Dicionário Houaiss indica que a palavra autocarro foi introduzida em português por empréstimo do francês autocar, por sua vez adaptação «do ing[lês] autocar, "automóvel", com especialização de sentido para (1895) "carro automóvel equipado para o transporte coletivo de passageiros"».

Pergunta:

Gostaria de saber quais os melhores "truques" para identificar o sujeito de uma frase e qual a sua oração principal.

Nas gramáticas é fácil de percebê-lo, pois os exemplos dados são sempre simples, porém, em frases mais complexas...

Resposta:

Sobre a identificação do sujeito, basta dizer que este se define como «função sintática desempenhada pelo constituinte da frase que controla a concordância verbal». Só nas frases identificacionais é que tal pode não se verificar, visto o verbo copulativo poder concordar com o predicativo do sujeito (ver Textos Relacionados).

Pergunta:

Poderiam ajudar-me na análise sintática da frase «Os alunos do 6.º ano estavam muito entusiasmados com Álvaro, o professor de Matemática»?

Qual a função sintática de «com Álvaro»?

Resposta:

Trata-se do complemento do adjetivo (participial) entusiasmado. Este adjetivo seleciona um complemento introduzido pelas preposições com ou por: «entusiasmado com o espetáculo»; «entusiamado pelo espetáculo» (cf. Francisco Fernandes, Dicionário de Regimes de Substantivos e Adjetivos (São Paulo, Editora Globo, 1995).

Pergunta:

Qual a concordância verbal correta do verbo alcançar na oração seguinte: «Vós sois filhos de Deus e, devotando-se ao trabalho apostolar, alcançarão o estado de iluminação», ou «Vós sois filhos de Deus e, devotando-se ao trabalho apostolar, alcançareis o estado de iluminação»? Ambas as formas estão corretas?

Resposta:

A forma correta é «Vós sois filhos de Deus e, devotando-vos ao trabalho apostolar, alcançareis o estado de iluminação». O verbo da segunda oração (coordenada) deve ter a forma «alcançareis», visto o seu sujeito ser o mesmo que o da primeira oração («vós»). A forma de 3.ª pessoa do plural só seria possível se a forma de tratamento de 2.ª pessoa fosse «vocês»: «Vocês são filhos de Deus e, devotando-se ao trabalho apostolar, alcançarão o estado de iluminação.»1

Note-se que, no contexto em questão, é também impossível o uso do pronome se, que deve ser substituído por vos, de modo a observar a concordância com o sujeito vós.

1 Em Portugal, vos é compatível com vocês, podendo, por isso, escrever-se: «Vocês são filhos de Deus e, devotando-vos ao trabalho apostolar, alcançarão o estado de iluminação.» Sobre este uso, ver resposta "As formas de tratamento vós e vocês e os possessivos".

Pergunta:

Tenho uma dúvida acerca da utilização dos dois-pontos depois da palavra como, quando se segue uma enumeração.

Por exemplo, neste caso, o que estaria mais correto?

– «Não envie dados pessoais como a sua morada, número de telefone, data de nascimento, etc.»

– «Não envie dados pessoais como: a sua morada, número de telefone, data de nascimento, etc.»

Não encontro nenhuma regra que indique que seja obrigatório utilizar os : num caso destes, mas já presenciei várias discussões sobre isto.

Resposta:

Não é obrigatório colocar dois-pontos depois da conjunção como, quando esta introduz uma oração. Pelo contrário, é até prática corrente usar como seguido de uma enumeração sem esse sinal de pontuação interposto: «Não envie dados pessoais como a sua morada, número de telefone, data de nascimento, etc.»