Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

As palavras iniciática e inicial são sinónimas, no entanto, sendo a primeira menos utilizada, gostaria de saber o que determina a utilização de uma ou de outra.

Resposta:

Inicial é adjetivo que remete para o substantivo início e significa «que principia». Iniciático é efetivamente menos usual (no Corpus do Português, de Mark Davies e Michael Ferreira, ocorre só 8 vezes, em claro contraste com as 1244 ocorrências de inicial) e relaciona-se com iniciação, sobretudo na aceção de «admissão de uma pessoa no culto de uma divindade ou como membro de uma seita ou sociedade secreta» (Dicionário Houaiss). Deste modo, quando se fala de um «percurso iniciático», tem-se em mente o processo de adesão a uma sociedade secreta ou um processo de aperfeiçoamento espiritual.

Pergunta:

Na frase «O contacto com a poesia é benéfico na infância, como tal ofereci um livro de poemas ao meu irmão mais novo», como devo classificar, quanto à classe de palavras, a locução «como tal» à luz da nova gramática? E à luz da gramática tradicional?

Grata pelo vosso trabalho.

Resposta:

Quer no contexto da terminologia tradicional, quer de acordo com o Dicionário Terminológico (DT), «como tal» é sempre uma locução adverbial, quando significa «assim sendo», «desta forma», «por essa razão»; cf. dicionário da Academia das Ciências de Lisboa, que apresenta o seguinte exemplo: «Empenhou-se bastante, como tal foi recompensada.» Note-se que esta locução é usada como conetor discursivo, de valor explicativo (cf. DT, C.1.1. Comunicação e interação discursivas).

Pergunta:

A palavra freguesia (enquanto divisão administrativa) pode ser considerada um nome coletivo?

Resposta:

Não, como unidade administrativa, mas, sim, se se referir a um grupo de clientes ou fregueses; p. ex.: «Esta padaria perdeu a freguesia que tinha» (cf. Dicionário Houaiss).

Pergunta:

O que é "rosa de toucar"?

Resposta:

A palavra está registada no Vocabulário Ortográfico do Português do ILTEC e no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa da Porto Editora, sempre com hífen – rosa-de-toucar – e significa «roseira de pequenas flores» (cf. Dicionário Priberam da Língua Portuguesa).

Pergunta:

A propósito da famosa divisão do cérebro em três partes, em que a primeira é o tronco encefálico, mais conhecido por «cérebro reptiliano», fui alertado para o facto de ter usado o adjectivo reptílineo em vez de reptiliano. Ora, se é verdade que tenho lido muitas vezes a palavra reptiliano, fiquei um pouco baralhado sobre qual o adjectivo de uso corrente em Portugal. O dicionário da Porto Editora regista reptilíneo, e não reptiliano, tendo no entanto reptilário (presumo que não muito em voga). Podem ajudar-me a esclarecer esta questão? 

Obrigado.

Resposta:

A forma adjetival reptilíneo está de facto registada no Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora, o qual, no entanto, não regista reptiliano. Outros dicionários gerais elaborados e publicados em Portugal (Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, Grande Dicionário da Língua Portuguesa, de José Pedro Machado, e dicionário da Academia das Ciências) não consignam nenhum dos dois adjetivos.

Quanto aos dicionários brasileiros, a consulta do Dicionário Houaiss e do Dicionário Unesp do Português Contemporâneo revela que aí se inclui reptiliano, sem haver entrada para reptilíneo. Esta situação poderia sugerir que os adjetivos em apreço têm uma distribuição geográfica bem marcada, mas não me parece que seja exatamente isso que ocorre. Com efeito, de uma forma intuitiva e sem negar a correção de reptilíneo, eu diria que, mesmo em Portugal, se usa reptiliano em relação ao assunto em causa, tendo-se assim consagrado a expressão «cérebro reptiliano», que é, muito provavelmente, um decalque do inglês reptilian brain, ou seja, «cérebro reptiliano» (cf. Linguee).