Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Sei que com o novo Acordo Ortográfico é suposto a palavra "pêlo" perder o seu acento circunflexo. Queria saber se é uma regra obrigatória ou facultativa, já que para algumas palavras se permite dupla grafia. Estou a escrever uma tese de mestrado na área de Dermatologia e faz-me muita confusão escrever «pelo» em vez de «pêlo». Parece descabido.

Obrigada.

Resposta:

A supressão do acento circunflexo em pelo (antigamente pêlo) é mesmo obrigatória, conforme o disposto no Acordo Ortográfico de 1990, na Base IX, 9:

«Prescinde-se, quer do acento agudo, quer do circunflexo, para distinguir palavras paroxítonas que, tendo respectivamente vogal tónica/tônica aberta ou fechada, são homógrafas de palavras proclíticas. Assim, deixam de se distinguir pelo acento gráfico: para (á), flexão de parar, e para, preposição; pela(s) (é), substantivo e flexão de pelar, e pela(s), combinação de per e la(s); pelo (é), flexão de pelar, pelo(s) (é), substantivo ou combinação de per e lo(s); polo(s) (ó), substantivo, e polo(s), combinação antiga e popular de por e lo(s); etc.»

A supressão do acento diferencial está, portanto, expressa aqui: «... pelo (é), flexão de pelar, pelo(s) (é), substantivo ou combinação de per e lo(s)...»

Pergunta:

Gostaria de saber se a expressão «em tempo» ou «e.t.» ainda se usa na escrita. Um exemplo: «Em tempo, estou enviando sua proposta anexa.»

Isso ainda se usa?

Resposta:

Entre as fontes a que tenho acesso, impressas em Portugal, encontro a expressão «em tempo», com o significado de «oportunamente», mas não acho registo da sua abreviatura. Contudo, em buscas feitas na Internet, foi-me possível recolher a forma E. T. como abreviatura de «em tempo» em páginas e documentos brasileiros: por exemplo, no Manual de Linguagem Jurídico-Judiciária/Departamento de Taquigrafia e Estenotipia, Porto Alegre: Departamento de Artes Gráficas, 2005, documento que apresenta como abreviatura de «em tempo» as forma E/T e E. T. Em suma, parece que E.T. é uma abreviatura (sobretudo) usada no Brasil que ainda tem atualidade.

Pergunta:

A palavra redemoinho é uma palavra composta por processo morfossintático (rede moinho), ou por derivação não afixal do verbo remoinhar, ou é outro processo?

Obrigado.

Resposta:

Considera-se que a palavra redemoinho é variante de remoinho e que esta última forma é um derivado não afixal (antigamente, regressivo) de remoinhar (cf. Dicionário Houaiss). A sílaba de da variante redemoinho talvez tenha surgido por analogia com roda (idem).

Pergunta:

Qual a origem do topónimo Chouso: «Rua do Chouso»?

Obrigado.

Resposta:

Como item do léxico comum, chouso é um arcaísmo que se relaciona com outra palavra também de sabor arcaico – chousa, «pequena quinta ou tapada; curral rústico móvel onde o gado passa o verão no campo; terreno cercado; cerrado» (Dicionário Houaiss). Como topónimo, Chouso terá aparecido, portanto, como conversão do nome comum chouso, empregado como identificação de um terreno cercado. Considera-se que chousa é a evolução do latim vulgar clausa, neutro de clausum, nome do género neutro que significava «lugar fechado, cercado» (idem). Sendo assim, é plausível que chouso proceda diretamente de clausum, substantivo relacionado com o verbo latino claudo, is, clausi, clausum, ere, «fechar, cerrar, encerrar».

Pergunta:

Diz-se «os boxers», ou «as boxers», quando nos referimos à peça de roupa interior masculina?... E, já agora, o termo já foi aportuguesado?

Obrigado mais uma vez!

Resposta:

Não há consenso quanto ao género a atribuir a boxers, mas, em Portugal, parece favorecer-se o género masculino («os boxers»).

No Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, a palavra boxers – um anglicismo – figura já aportuguesada (bóxeres) e pode ser usada quer no masculino quer no feminino: «bó·xe·res (inglês boxers) substantivo feminino ou masculino plural [Vestuário] Peça de roupa interior masculina constituída por uns calções de tecido leve.» Porém, o dicionário da Porto Editora regista apenas boxers, à inglesa (embora, nesta língua, também sejam conhecidos como boxer shorts), dando-lhe o significado de «cuecas de homem com o formato de calção» e atribuindo-lhe apenas o género masculino.

O que é melhor: «os boxers», ou «as boxers»? A opção não é evidente, porque a palavra, se, por um lado, subentende um tipo de cuecas, justificando a atribuição do género feminino («as bóxeres»), por outro, é possível associar-lhe a noção de calções, vocábulo que, tendo o género masculino, legitima o uso de «os "boxers"». Querendo identificar tendências de uso, uma pesquisa na Internet por meio do Google, restringindo os resultados a .pt (em princípio, páginas portuguesas), sugere que se prefere atribuir o género masculino à palavra (ver «comprei uns boxers» aqui).

Quanto ao aportuguesamento proposto (pelo menos) pelo dicionário Priberam, observe-se que está bem formado e aproveita um outro já existente para denominar uma raça d...