A professora Carla Marques explora os significados do provérbio «Burro velho não toma andadura» no seu apontamento divulgado no programa Páginas de Português, da Antena 2, em 20/10/2024.
Doutorada em Língua Portuguesa (com uma dissertação na área do estudo do texto argumentativo oral); investigadora do CELGA-ILTEC (grupo de trabalho "Discurso Académico e Práticas Discursivas"); autora de manuais escolares e de gramáticas escolares; formadora de professores; professora do ensino básico e secundário. Consultora permanente do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacada para o efeito pelo Ministério da Educação português.
A professora Carla Marques explora os significados do provérbio «Burro velho não toma andadura» no seu apontamento divulgado no programa Páginas de Português, da Antena 2, em 20/10/2024.
Relativamente ao emprego de como e que – penso que neste caso sejam conjunções –, poderiam dizer-me qual é a forma correta de escrever a seguinte frase?
«Sem lhe responderem perante tamanha postura sisuda, ela assentou com um pestanejo, baixou o olhar para o chão e retirou-se do mesmo jeito como tinha chegado.»
ou: «Sem lhe responderem perante tamanha postura sisuda, ela assentou com um pestanejo, baixou o olhar para o chão e retirou-se do mesmo jeito que tinha chegado.»
Obrigada!
As duas construções são possíveis. No entanto, a opção pela conjunção que parece ser a mais frequentemente adotada.
Acrescente-se ainda que a estrutura «do mesmo jeito» é mais típica da variedade de português do Brasil, como nos indica uma pesquisa no Corpus do Português, de Mark Davies. Por esta razão, se a opção for a de redigir o texto em português europeu, poderá utilizar construções como «da mesma maneira/forma» ou «do mesmo modo», que serão sentidas como mais naturais.
Disponha sempre!
Na frase «Sorriu, apontando para o Sol», o segmento destacado corresponde a que função sintática? A um complemento oblíquo?
Agradeço a vossa confirmação.
Na frase em análise, o constituinte «para o Sol» desempenha a função de complemento oblíquo.
Entre as suas várias possibilidades, o verbo apontar pode ser usado como transitivo indireto regendo a preposição para:
(1) «O António apontou para o quadro.»
Neste contexto, o verbo apontar tem o significado de «indicar através dos sentidos; indicar»1 e o constituinte «para o quadro» é um argumento do verbo que desempenha a função de complemento oblíquo.
A mesma situação ocorre na frase apresentada pelo consulente.
Disponha sempre!
1. Malaca Casteleiro (dir.), Dicionário gramatical dos verbos portugueses. Texto editores.
Li a seguinte frase: «O que tiveres feito para a enfurecer, sugiro que pare agora.»
A minha dúvida é se é correto mudar o tempo verbal para : «O que tivesses feito para a enfurecer...» ou «o que tenhas feito para a enfurecer, sugiro que pare agora».
Se não me engano, o uso do verbo ter no futuro do conjuntivo (tiveres) refere-se a uma ação que pode ou não acontecer no futuro, mas acho que a frase no exemplo acima, «O que tiveres feito para a enfurecer, sugiro que pare agora», tem sentido passado.
Muito obrigada antecipadamente pela ajuda!
Com efeito, o futuro do conjuntivo não parece ser a solução mais ajustada à frase e à sua intenção. Será preferível optar pelo presente ou pelo pretérito perfeito composto do conjuntivo, de acordo com as intenções.
Poderá optar-se pelo presente do conjuntivo, que indica a sobreposição das duas situações:
(1) «O que faças para a enfurecer, sugiro que pare agora.»
Nesta frase, o uso do presente aponta para o facto de a situação descrita como «ter feito para enfurecer» ocorrer até ao momento de enunciação ou então aponta para uma situação que se repete de forma iterativa.
Também o pretérito perfeito composto do conjuntivo pode descrever situações que se sobrepõem ao momento de enunciação:
(2) «O que tenhas feito para a enfurecer, sugiro que pare agora.»
Do ponto de vista aspetual, este tempo verbal também apresenta a situação como concluída, ou seja, no caso em análise verbaliza-se a expectativa de que a situação já tenha terminado.
Por fim, uma frase que inclua o futuro do conjuntivo tem problemas do ponto de vista da semântica temporal:
(3) «*O que fizeres para a enfurecer, sugiro que pare agora.»
Habitualmente, o futuro do conjuntivo assinala um tempo futuro relativamente ao momento de enunciação. Ora, neste caso, solicita-se que se pare uma situação que ainda vai acontecer, o que traz problemas de coesão temporal à frase.
Disponha sempre!
* Assinala a inaceitabilidade da frase.
O assunto que me traz é relativo à regência do verbo trazer.
Se pretendermos trazer algo à tona – algum assunto – ou despertar alguma emoção: «A postura sisuda, com a qual ela chegou, trouxe-o de novo para a realidade.»
Ou será «A chegada sisuda dela trouxe-o de novo à realidade»?
Portanto, a minha dúvida é se, de facto, esse verbo pode ou não estar sujeito a uma regência.
Obrigada!
A questão é um pouco confusa, pelo que não consigo perceber bem qual a dúvida.
Não obstante, no que se refere ao verbo trazer, poderemos dizer que este pode ser usado como transitivo direto, como em (1):
(1) «Ele trouxe o livro.»
O verbo pode ser também usado como transitivo direto e indireto, tendo um complemento direto seguido de complemento indireto (2) ou de complemento oblíquo (3):
(2) «Ele trouxe um livro ao João.»
(3) «Ele trouxe um livro para casa.»
Neste último contexto, o verbo trazer pode reger a preposição para (como em (3)), indicando a direção, ou a preposição de, indicando a proveniência (4):
(4) «Ele trouxe um livro de casa.»
Se atentarmos nas frases apresentadas pela consulente, uma opção possível será a apresentada em (5):
(5) «A postura sisuda com que ela chegou trouxe-o de novo para a realidade.»
Também é possível marcar a direção com a locução «até à»:
(6) «A postura sisuda com que ela chegou trouxe-o de novo (até) à realidade.»
A frase com esta ideia poderá ocorrer apenas com a preposição a (contraída com artigo a), como se assinala com os parênteses na frase (6).
Disponha sempre!
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