Carla Marques - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carla Marques
Carla Marques
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Doutorada em Língua Portuguesa (com uma dissertação na área do  estudo do texto argumentativo oral); investigadora do CELGA-ILTEC (grupo de trabalho "Discurso Académico e Práticas Discursivas"); autora de manuais escolares e de gramáticas escolares; formadora de professores; professora do ensino básico e secundário. Consultora permanente do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacada para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

«Todos os dias são dia da criança ou «todos os dias é dia da criança»?

Resposta:

A forma «são» é preferível atendendo ao predomínio da concordância no plural e à própria  sonoridade da frase.

De uma forma geral, nas frases copulativas, assinalam-se situações em que o verbo concorda não com o sujeito, mas com o predicativo (ver textos relacionados).

Por vezes, a opção está também relacionada com o ritmo ou a sonoridade da frase em função da flexão do verbo no singular ou no plural.

No caso da frase em apreço, a frase apresentada em (1) parece preferível:

(1) «Todos os dias são dia da criança.»

Relativamente a esta situação, Raposo afirma que «[q]uando o sujeito e o predicativo desencadeiam flexão verbal em número de valor diferente – singular e plural –, é o valor plural que tem primazia na concordância verbal, independentemente de se manifestar no sujeito ou no predicativo»1.

Neste caso, a opção será, pois, a de fazer concordar o verbo com o seu sujeito.

Disponha sempre!

 

1. Raposo et al., Gramática do Português. Fundação Calouste Gulbenkian, p. 2483.

Pergunta:

Devo considerar o complemento «a pagar» da frase «procedam à intimação a pagar» como oração completiva nominal reduzida de infinitivo, deixando o verbo obrigatoriamente no singular?

Ou posso considerá-la como oração adverbial final, nesse caso, deixando o verbo na terceira pessoa do plural (porque, esclarecendo o contexto, a intimação é de várias pessoas)?

Grato desde já.

Resposta:

A oração em questão constitui uma oração subordinada reduzida de infinitivo.

A oração «a pagar» está dependente do nome intimação, funcionando como um argumento pedido pelo nome, pelo que constitui uma completiva nominal que integra o sintagma nominal que tem intimação como núcleo. Não se trata, portanto, de uma oração subordinada adverbial final, que se relacionaria com a oração subordinante estabelecendo uma finalidade a atingir.

Em contextos de subordinação nominal, pode usar-se tanto o infinitivo flexionado como o infinitivo não flexionado, verificando-se liberdade na escolha1. Por essa razão, são aceitáveis ambas as construções apresentadas em (1) e (2):

(1) «procedam à intimação a pagar»

(2) «procedam à intimação a pagarem»

Disponha sempre!

 

1. Cf. Barbosa e Raposo in Raposo et al., Gramática do Português. Fundação Calouste Gulbenkian, p. 1936.

Pergunta:

Venho pedir a vossa ajuda acerca de uma dúvida relacionada com o valor aspetual.

A frase «A leitura de romances é um hábito» apresenta um valor aspetual genérico ou habitual?

Muito obrigada pelo vosso esclarecimento.

Resposta:

A frase veicula uma leitura de valor aspectual genérico.

Recorde-se que o valor aspetual habitual descreve uma situação descrita como uma repetição ilimitada: «representa um padrão de repetição da situação suficientemente relevante a ponto de poder ser considerado como uma propriedade característica da entidade representada pelo sujeito gramatical»1.

Já o valor aspetual genérico descreve uma situação que é apresentada como tendo uma duração intemporal, cujos estados de coisas não estão limitados do ponto de vista temporal. O uso do presente do indicativo contribui para esta leitura.

De acordo com o que ficou dito, verificamos que a frase apresentada veicula um valor genérico na medida em que descreve a situação descrita como «leitura de romances» como algo intemporal, verdadeiro em diferentes intervalos de tempo.

Disponha sempre!

 

1. Cunha in Raposo et al., Gramática do Português. Fundação Calouste Gulbenkian, p. 586.

Pergunta:

Qual a formulação correta: «dar o nome de x», ou «dar o nome x»?

Se, no caso do verbo chamar, é importação do Brasil a utilização da preposição de, será que na designação «dar o nome» se deve apor a preposição de, ou ela também está a mais?

Resposta:

A construção «dar o nome de» está prevista no dicionário1 como sendo equivalente a nomear, designar.

Para obtermos uma construção equilibrada, nome deve ligar-se ao constituinte que indica a designação adotada por meio da preposição de: «o nome de x»

Assim, na construção com o verbo suporte dar, usa-se a preposição de após nome: «dar a alguém/algo o nome de x».

Disponha sempre!

 

1. Foram consultados o Dicionário Houaiss e o Dicionário da Língua Portuguesa.

A grafia de <i>supramencionado</i>
Regras para o uso do hífen

A grafia da palavra supramencionado permite uma revisão de algumas regras do uso do hífen, segundo o Acordo Ortográfico de 90, pela professora Carla Marques.

(Apontamento divulgado no programa Páginas de Português, da Antena 2)