Aura Figueira - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Aura Figueira
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Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas, variante de Estudos Portugueses e Franceses, pela Faculdade de Letras da Universidade Clássica de Lisboa, com uma pós-graduação em Ciências da Documentação e da Informação, variante de Biblioteconomia. É professora de português dos ensinos básico e secundário. 

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Recentemente, tenho notado que há jovens (sobretudo jovens) que dizem “pensar de”, por exemplo: «Pensei de dizer-te para irmos ao festival». E ainda com mais frequência, "curtir de": «Não curto muito dele.»

Está bem empregada a preposição? Os verbos em questão regem a preposição de?

Obrigado.

Resposta:

    O verbo pensar, utilizado como transitivo indireto e selecionando complemento oblíquo, não rege a preposição de, mas as preposições em e sobre:

  • «A senhora pensava nos pormenores.»*
  • «O director pensará sobre o assunto.»*

    Quanto ao verbo curtir, na aceção de «gostar», é transitivo direto e seleciona complemento direto, não regendo preposição:

  • «Eu curto muito este sítio.»* 

*Casteleiro, João Malaca (dir.), Dicionário Gramatical de Verbos Portugueses, Lisboa: Texto Editores, 2007

Pergunta:

     É igualmente correto dizer/escrever «parecido com» e «parecido a» («parecer-se com» e «parecer-se a»)? Não consigo encontrar uma resposta a esta dúvida nas gramáticas de português a que tive acesso.

    Obrigada.

Resposta:

O verbo parecer-se, na aceção «ser semelhante», pode ser intransitivo:

  • «Toda a família se parece.»*

Pode também ser transitivo indireto, selecionando, neste caso, complemento oblíquo, introduzido pelas preposições a ou com:

  • «A crítica diz que este livro se parece ao anterior.»*
  • «Eu acho que os animais se parecem com os donos.»* 

*CasteleiroJoão Malaca (dir.), Dicionário Gramatical de Verbos Portugueses, Lisboa: Texto Editores, 2007

Pergunta:

Estava fazendo uma leitura e me deparei com a seguinte frase: «Nunca ocorreram aos grandes cronistas, em seus textos, basearem-se tão somente nas experiências de fato vividas por eles». Aí me veio a dúvida: O verbo "ocorrer" tem de vir no plural?

Tentei encontrar o sujeito da oração, no entanto, não consegui.

Gostaria também de saber a classificação do verbo "ocorrer" na frase em questão.

Resposta:

    Comecemos por dividir e classificar as orações da frase apresentada.

   O sujeito da frase apresentada é a oração subordinada e corresponde a "isto", logo, singular, pelo que o verbo terá de fazer concordância com este sujeito singular.

   A frase correta será, então, «Nunca ocorreu aos grandes cronistas, em seus textos, basearem-se tão somente nas experiências vividas, de facto, por eles».

  O verbo ocorrer, com este sentido de «aparecer ao pensamento», é transitivo indireto, pois seleciona complemento indireto: «aos grandes cronistas».

Pergunta:

No excerto «um país que, recentemente, em termos históricos, passou quatro décadas sob uma ditadura e que ainda exibe as suas cicatrizes», a palavra ainda contribui para a coesão interfrásica ou para a coesão temporal?

Resposta:

    Na frase apresentada, «ainda» é um advérbio que contribui para a coesão temporal, pois estabelece entre as duas  orações uma ordenação temporal, assegurada simultaneamente pela relação entre os tempos verbais pretérito perfeito («passou») e presente do indicativo («exibe»).

    A coesão interfrásica, designando os mecanismos de sequencialização que permitem a articulação das frases ou dos parágrafos entre si, é assegurada aqui pelo conector «e» e pelos pronomes relativos «que», a introduzirem orações subordinadas relativas.

Pergunta:

Por favor, esclareçam a todos. Entre os brasileiros, está tornando-se comum o uso da palavra «noético(a)» como se esta estivesse relacionada a ou fosse derivada de Noé, a personagem bíblica.

Por outro lado, sabemos que em português existe a forma “Noá” (de "Noah"). Portanto, poliónimos ou palavras derivadas de Noá (variante de Noé) (para relativo a, para proveniente de, e para que se refere a) só podem ser: {noá+ico} noaico(a), {noá+ita} noaíta, e {noá+ítico} noaítico(a). Como em inglês existem "noahic", "noahite" e "noahitic". Confere? Jamais “noético”, até porque noético(a) é outra coisa (em inglês, "noetic"). Confere?

Resposta:

    Segundo as nossas pesquisas nos dicionários, das palavras «noaico», «noaíta» e «noaítico» não existe qualquer registo.

   Quanto a noético, as definições encontradas esclarecem o seu significado como do âmbito da filosofia, relativo ao ato de pensar, à noese¹, à «parte da Lógica que estuda o pensamento»².

   Não se encontra, nas definições das palavras apresentadas, qualquer referência a Noé. 

¹ in Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea. João Malaca Casteleiro, coordenador (Academia das Ciências de Lisboa). Lisboa: Academia das Ciências de Lisboa e Editorial Verbo, 2001