Pergunta:
Ao ler a ode Nem vã esperança vem, não anos vão, de Ricardo Reis – que reproduzo abaixo –, encontrei no quinto verso a palavra labento. Em vão procurei esta palavra no dicionário eletrónico Priberam e na Infopédia. A minha questão é a seguinte: qual o significado desta palavra?
Muito agradeço, se me puderem elucidar, assim como, se for possível, que expliquem a sua etimologia.
«Nem vã esperança vem, não anos vão,
Desesperança, Lídia, nos governa
A consumanda vida.
Só espera ou desespera quem conhece
Que há que esperar. Nós, no labento curso
Do ser, só ignoramos.
Breves no triste gozo desfolhamos
Rosas. Mais breves que nós fingem legar
A comparada vida.»
28-9-1926
Resposta:
O significado de labento nos versos referidos é fugaz, efémero, inconstante e sinónimos afins. Situa-se no mesmo campo semântico que lábil, labilidade.
Labento – que não aparece nos dicionários da nossa língua – parece ser uma invenção de Fernando Pessoa, tão ao jeito dos latinismos de Ricardo Reis. Será um erro de transcrição? Deveria ser, porventura, labente, porque deriva do particípio presente labens, do verbo latino labor, eris, i, lapsus sum (cair, escorregar, etc.). Veja-se, por ex., o ablativo absoluto de Virgílio: labente anno, «encaminhando-se o ano para o seu fim». A desinência latina -ens em geral dá -ente em português:.Por exemplo: dolente, sapiente, continente, presidente, etc.
O significado (bem claro no poema) gira à volta da transitoriedade e fugacidade da vida.
Por outro lado, não sei se labento será um hápax legómenon (algo dito só uma vez) mesmo em Fernando Pessoa. Virá tal adjetivo a ter um uso corrente? Duvido. Mas aí está ele, e não figura mal no ritmo dos melancólicos versos de Ricardo Reis.