Ana Martins - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Ana Martins
Ana Martins
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Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas – Estudos Portugueses, pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto, e licenciada em Línguas Modernas – Estudos Anglo-Americanos, pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Mestra e doutora em Linguística Portuguesa, desenvolveu projeto de pós-doutoramento em aquisição de L2 dedicado ao estudo de processos de retextualização para fins de produção de materiais de ensino em PL2 – tais como  A Textualização da Viagem: Relato vs. Enunciação, Uma Abordagem Enunciativa (2010), Gramática Aplicada - Língua Portuguesa – 3.º Ciclo do Ensino Básico (2011) e de versões adaptadas de clássicos da literatura portuguesa para aprendentes de Português-Língua Estrangeira.Também é autora de adaptações de obras literárias portuguesas para estrangeiros: Amor de Perdição, PeregrinaçãoA Cidade e as Serras. É ainda autora da coleção Contos com Nível, um conjunto de volumes de contos originais, cada um destinado a um nível de proficiência. Consultora do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa e responsável da Ciberescola da Língua Portuguesa

 
Textos publicados pela autora

     O livro

      António Victorino d’Almeida 2003 – Músicas da Minha Vida, Lisboa, Dom Quixote.

      Cada capítulo, dedicado a um compositor/época, é um agregado de notas, comentários, episódios, deambulações e descargas sobre críticos de arte e políticos.

      O estilo

      Se lermos o livro num sítio silencioso, ainda o...

1. Uma questão de género

Quando vagueamos numa livraria e somos levados a pegar num livro, procuramos no paratexto, mais ou menos inconscientemente, o género ou tipo textual.

 

Longe de Manaus tem uma nota prévia, colocada mesmo antes da epígrafe: "Um romance policial, como se sabe, tem as suas regras. Este não tem."

Ora isto é uma contradição: as regras de um romance policial são regras constitutivas de género. Se este romance não tem essas regras não é um romance policial.

Pergunta:

Tenho por hábito inventar palavras novas que, geralmente, não passam do círculo restrito de familiares e amigos, mas espanta-me o uso sistemático (por parte até de figuras públicas, leia-se políticos) de miríades de palavras que não constam dos dicionários, ou que até podem constar mas induzem uma aplicação noutros contextos. Da lista fazem parte verbos muito em voga como "elencar", "compaginar" e "plasmar" ou o mais do que inédito substantivo "implantamento", que ouvi outro dia numa reunião. Serão modismos, erros crassos ou sinal de que a língua portuguesa é uma língua viva, passível de ver o seu léxico engrossado com um ramalhete fértil de palavras novas e úteis? Passado o espanto, é de integrar ou excluir aquilo que muita gente pensa, por soberba ou ignorância, estar a pronunciar correctamente? Para já não falar de certos aportuguesamentos ("clicar" já existe?) e expressões da moda como "sendo que", verdadeira rival dos "portantos" de outrora. Outro aspecto tem a ver com a dificuldade em traduzir/inventar rapidamente palavras novas capazes de serem adoptadas pelo público em geral, para que não tenhamos, por exemplo, de passar uma boa parte da nossa vida a falar de "T-shirts" e a ter de escrever a palavra em itálico ou entre aspas.

Resposta:

1. Todas as línguas estão sujeitas a variação no tempo. A hesitação entre duas formas num dado momento é sinal de que no futuro se vai produzir mudança. Por exemplo, no período em que estamos, são purismos os usos de sobrescrito (por envelope) e de tinha pagado (por tinha pago); é seguramente um modismo dizer “colocar questões” em vez de fazer perguntas. Repare, no entanto, que o detalhe em vez de pormenor já não é tão mal visto. Uma coisa é certa: o facto de estranharmos a variação quer dizer que reconhecemos estabilidade e homogeneidade na língua.

2. Os termos elencar, compaginar, plasmar, clicar e T-shirt estão registados no Dicionário Porto Editora 2006. O seu colega, na reunião, equivocou-se e, em vez de dizer implantação, disse implantamento. Acontece.

          O que é que esperamos de um título como este Viagem por um País Longo e Estreito (Travel in a Thin Country)1?
Esperamos encontrar o que se encontra nos bons relatos de viagem: a experiência vicária de uma ida e de uma chegada; o fascínio sempre renovado pela descoberta de um novo local; a diversidade dos testemunhos recebidos. Tudo isso está no livro.
Há, porém, em muitos passos da tradução para o português opções muito questionáveis.

Eis um restrito número de exemplos.

Pergunta:

Agradeço o favor dos vossos comentários às seguintes frases:
«... devido a uma árvore que TOMBOU na estrada...»
«... de forma que os autocarros ENCHEM rapidamente»
«... algumas sarjetas que acabam de ENTUPIR de forma....»

Não deveria o verbo assinalado ser precedido por "se"? Fico antecipadamente grato pela vossa resposta.

Resposta:

O verbo entupir e o verbo tombar não exigem nem admitem se inerente. O verbo encher, quando usado intransitivamente, é um verbo “pseudo-reflexo”, ou seja, é activado com se inerente (o se é uma propriedade lexical do próprio verbo).
Para o esclarecimento de dúvidas semelhantes, consultar (entre outros):

Dicionário Prático de Conjugação dos Verbos da Língua Portuguesa, Bertrand Editora (secção “Índice dos Verbos”)