Filipinas, tantas histórias por descobrir - Diversidades - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
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Filipinas, tantas histórias por descobrir
Filipinas, tantas histórias por descobrir
Colonização e descolonização linguísticas

« (...) Em 1543, o arquipélago recebeu o nome de Las Filipinas, em honra do então príncipe herdeiro, que viria a ser Filipe II de Espanha e I de Portugal. Desde o início da colonização existiu a preocupação de tornar o espanhol a língua dominante na colónia (...).»

 

Quando pessoas da minha idade pensam nas Filipinas, associam-nas imediatamente a Imelda Marcos e os seus sapatos: a esposa de Ferdinando Marcos, presidente entre 1965 e 1986, teria mais de 3 mil pares de sapatos e, quando partiu para o exílio, no Havai, "só" levou consigo mais de mil pares e oitocentas malas de mão. Imelda Marcos tornou-se um ícone da cultura pop nos Anos 1970, inspirando, entre outras obras, a recente ópera-rock Here Lies Love, de David Byrne, que estreou este ano na Broadway.

[Os arquipélagos das Filipinas situam-se] no Sudeste Asiático e compreende mais de 7000 ilhas e ilhéus vulcânicos, muitos inabitados. O país estabelece fronteira marítima com Taiwan, PalauIndonésia e Malásia, tem uma superfície de 300 mil km2, uma população de mais de 100 milhões de habitantes e uma diáspora de mais de 12 milhões, um terço dos quais a residir nos EUA. A capital é Manila, situada na Ilha de Luzon. As Filipinas e Timor-Leste são os únicos países maioritariamente católicos da Ásia.

O primeiro contacto com europeus deu-se, em 1521, com a chegada de Fernão de Magalhães à Ilha de Homonhon, no decurso da viagem de circum-navegação; na mesma ilha, foi morto, ainda em 1521, na Batalha de Mactán. Em 1543, o arquipélago recebeu o nome de Las Filipinas, em honra do então príncipe herdeiro, que viria a ser Filipe II de Espanha e I de Portugal. Desde o início da colonização existiu a preocupação de tornar o espanhol a língua dominante na colónia; porém, como em muitos outros lugares, as ordens religiosas, os agentes educativos da época, optaram por aprender as línguas locais, para catequizar mais rapidamente a população, em vez de ensinar espanhol. Em 1590 foi criada a Universidade de Santo Inácio, em Manila; em 1595, o Colégio de Santo Ildefonso, em Cebu; em 1611, a Universidade de São Tomás, em Manila – a criação precoce de universidades nas colónias espanholas, contrariamente ao que fez Portugal nas suas, constituiu uma estratégia para formar elites locais passíveis de permanecer fiéis ao Império e de reforçar a presença da cultura espanhola. O espanhol tornou-se a língua franca da colónia.

A colonização espanhola terminou em 1898, com a Declaração da Independência e a implantação da Primeira República, como resultado da Revolução Filipina (1896-1898). Em 1898, dá-se a Guerra Hispano-Americana, que resultou na perda, para a Espanha, de Cuba, Porto RicoGuam e as Filipinas. Ainda em 1898, as forças militares dos EUA tomaram pela força o território filipino, negando-lhe a independência e transformando-o numa colónia norte-americana. Em 1899, o presidente Emilio Aguinaldo declarou guerra ao invasor; Aguinaldo foi capturado em 1904, mas a Guerra Filipino-Americana durou até 1913. Estima-se que um milhão de pessoas (10% da população do país na época) tenha morrido em consequência da limpeza étnica e cultural levada a cabo pelos norte-americanos, operação que ficou conhecida como Genocídio Filipino. A colonização estado-unidense durou até 1946, ano em que o país reconheceu oficialmente a independência das Filipinas, com a assinatura do Tratado de Manila. Durante esta colonização, à Igreja Católica foi retirado o estatuto de religião do Estado e ao espanhol, o de língua franca, tornando-se o inglês a língua oficial. O espanhol torna-se língua oficial em 1973, a par do inglês, mas perde esse estatuto em 1987, quando a Constituição desse ano institui o inglês e o filipino como línguas oficiais. Ao filipino é também conferido o estatuto de língua nacional.

 

N. E. – Ler também aqui o segundo artigo que a autora dedicou ao tema no Diário de Notícias em 28 de agosto de 2023.

Fonte

Artigo da autoria da professora universitária e linguista prtuguesa Margarita Correia, transcrito, com a devida vénia, do Diário de Notícias de 21 de agosto de 2023.

Sobre a autora

Margarita Correia, professora  auxiliar da Faculdade de Letras de Lisboa e investigadora do ILTEC-CELGA. Coordenadora do Portal da Língua Portuguesa. Entre outras obras, publicou Os Dicionários Portugueses (Lisboa, Caminho, 2009) e, em coautoria, Inovação Lexical em Português (Lisboa, Colibri, 2005) e Neologia do Português (São Paulo, 2010). Mais informação aqui. Presidente do Conselho Científico do Instituto Internacional da Língua Portuguesa (IILP) desde 10 de maio de 2018. Ver, ainda: Entrevista com Margarita Correia, na edição número 42 (agosto de 2022) da revista digital brasileira Caderno Seminal.