1. O Ciberdúvidas retoma as suas atividades habituais e deseja a todos os seus consulentes um excelente ano de 2023, sem esquecer, claro, o cuidado que a língua merece e exige. Este novo ano traz, por um lado, a notícia do falecimento de figuras públicas de importância maior em áreas muito distintas: o Papa emérito Bento XVI e o futebolista Pelé. Estes acontecimentos convocaram para o espaço mediático a palavra velório, que designa a vigília feita a um defunto. Relativamente a este termo, esclareça-se que a sua origem é comum à de vela, pois ambos derivam do verbo latino vigilare, que significava «vigiar, ficar acordado». Velório resultou da junção do verbo radical vel- e do sufixo -ório, e passou a designar o ato coletivo de velar o defunto. Já vela formou-se a partir de velar por derivação não afixal (derivação regressiva), referindo o objeto de cera que iluminava no decurso das vigílias noturnas feitas aos defuntos. O início de 2023 fica marcado, por outro lado, pela tomada de posse de Lula da Silva, no Brasil. Este acontecimento deu particular realce à palavra cuidar, usada pelo novo presidente no seu discurso de tomada de posse. Este é um verbo de significação muito rica, que vai do plano físico ao emocional. Assim, o novo presidente do Brasil comprometeu-se perante os brasileiros a «prestar atenção», a «realizar algo com atenção», a «preocupar-se com algo», a «tomar conta», a «tratar» ou a «responsabilizar-se». Um excelente exemplo de como falar também implica intrinsecamente uma ação, como defendia o filósofo da linguagem Austin.
2. Em português, a palavra cetro pode também grafar-se ceptro, um caso de dupla grafia que se justifica pelas duas possibilidades de pronúncia da palavra (com ou sem articulação do -p-). Esta é a explicação que integra a atualização do Consultório, à qual se vêm juntar sete novas respostas: «A regência de filiado», ««Morar com», «morar em» e «morar para»», ««A quantas ando» II», «Casadela», «Concordância no plural com dois infinitivos», «O português língua e o inglês language», «Inundamento, inundação».
3. A língua é sempre permeável a novidades e a criatividade linguística pode contribuir para enriquecer o léxico. É o caso do termo basculação, usado pela primeira vez pelo treinador português José Mourinho, como conta o jornalista João Querido Manha no trabalho que está a publicar no seu blogue sobre sobre a linguagem e a semântica do futebol, de A a Z.
Cf. Basculação + Futebolês
4. O crioulo de Querala, no sul da Índia, é ainda usado no país por um número muito residual de falantes, uma situação linguística descrita no artigo traduzido do inglês, onde se apresentam pormenores da investigação desenvolvida pelo professor universitário Hugo Cardoso (artigo transcrito com a devida vénia).
5. A professora universitária Margarita Correia apresenta um artigo de reflexão sobre algumas políticas linguísticas e educativas dinamizadas na Turquia (aqui transcrita com a devida vénia).
6. O árabe tem sofrido uma clara evolução ao longo dos tempos. A comunicação nos países de língua árabe, que não é feita em árabe clássico, uma língua formal e literária, deu lugar a um conjunto de línguas nacionais e dialetos por vezes tão distintos que impedem a intercompreensão entre povos árabes. Todavia, atualmente, emerge uma espécie de pan-árabe que parece assegurar a comunicação entre os diferentes países. Esta é a matéria que nos é apresentada neste artigo traduzido do francês da autoria do jornalista Akram Belkaïd, transcrito com a devida vénia.