Segundo o Dicionário de Termos Literários (1978), de Massaud Moisés, o termo galego-português dobre «designava, na poesia trovadoresca galaico-portuguesa1, a repetição de um vocábulo em dois ou mais lugares da estrofe, incluindo a fiinda». Elucida, ainda, que, regra geral, o dobre aparecia no primeiro e último verso de cada estrofe, mas podia ocorrer noutros passos: o importante é que a disposição adotada na primeira cobra/copla se reproduzia, simetricamente, nas demais. O termo repetido podia constituir a única rima em todos os versos de cada estrofe, como é o caso da cantiga de Pero Garcia Burgalês:
Ai eu coitad´! e por que vi
a dona que por meu mal vi!
Ca deus lo sabe, po-la vi,
nunca já mais prazer ar vi,
per boa fé, u a non vi;
ca de quantas donas u vi,
tão boa dona nunca vi.
É esta, decerto, a razão pela qual o dobre tem sido considerado «equivalente das rims equivocs (rimas equívocas) da poesia provençal, mas, ao que parece, trata-se de expedientes formais distintos» (idem, p. 160): enquanto o primeiro consistia na simples recorrência vocabular, por rimas equívocas «entendia-se, na lírica occitânica, a repetição, em lugares determinados de uma estrofe, de palavras foneticamente idênticas, mas de significação diversa, ou que se prestavam a duplo sentido» (Celso Cunha, Estudos de Poética Trovadoresca, 161, p. 204).
Por sua vez, mozdobre/mordobre — «do galego-português mosdobre, mos dobre» — correspondente à rims derivatius da poética provençal, designava, no lirismo trovadoresco galaico-português, a repetição de uma palavra no interior da mesma estrofe, mas em formas diversas»(Massaud Moisés, ob. cit., pp. 349-350), empregando «geralmente verbos, em diversos tempos: "Cativo, mal conselhado, / que me non sei conselhar! / e sempre vivén en cuidado, /pero
non posso cuidar" (trovador anónimo, Cancioneiro da Ajuda, 304).
Por outro lado, e como já foi indicado, o termo literário cobra (ou cobla/copla) é sinónimo de estrofe na poética medieval galaico-portuguesa. Massaud Moisés explicita, também, os conceitos de cobla/copla singular (quando cada estrofe apresenta rima própria), coplas/cobras uníssonas (quando é igual a rima ao longo das estrofes), coplas/cobras doblas (se a rima é idêntica em cada grupo de duas) e coplas/cobras replicativas (quando empregam a aliteração).
Perante estes dados, apercebemo-nos de que o conceito de copla — conjunto de versos que formam uma estrofe — é distinto do de dobre (repetição de uma palavra numa estrofe) e de mozdobre (repetição de diversas formas de um vocábulo ou de um verbo numa estrofe), o que nos leva concluir de que não poderão ser termos sinónimos, mesmo quando usados como palavras compostas.
1 Massaud Massaud transcreve um excerto (que consideramos importante citar) sobre o uso do dobre do autor da Poética Fragmentária que precede o Cancioneiro da Biblioteca Nacional: «é dizer uma palavra cada cobra/copla duas vezes ou mais; mas devem-no meter na cantiga mui gardadamente. E convém, como a meterem em uma das cobras/coplas, que assim o metam nas outras todas. E se aquele dobre que meteram em uma meteram nas outras, podem-no i meter em outras palavras, pero sempre naquele talho e daquela maneira que o meterem na prima. E outrossim, o devem de meter na fiinda per aquela maneira.»