Em Portugal, no ensino não superior, tem havido alguma tradição, cada vez mais combatida, de considerar o tipo de finais que está em apreço, não como orações, mas como complementos circunstanciais de fim. Talvez por isso surja a referência a infinitivos soltos, embora na página 153 da mesma gramática, quando se fala dos adjuntos adverbiais de fim, se não dê nenhum exemplo em que ocorra um verbo. Além disso, na página 609, dá-se como exemplo de final infinitiva «Conheces-lhe a vida para poderes afirmar tal coisa.»
Concordo, pois, consigo, e, ao que parece, a própria gramática de Cunha e Cintra também. Nos exemplos que apresenta, e que repito numerados, estamos perante frases complexas, em que a subordinada é uma oração infinitiva final.
1) «Canta-me cantigas para me embalar.» (Guerra Junqueiro)
2) «Para não fitá-lo, deixei cair os olhos.» (Machado de Assis)
3) «Para assustá-lo, os soldados atiravam a esmo.» (Carlos Drummond de Andrade)
A colocação do pronome nos exemplos 2 e 3 também me causa muita estranheza. Creio tratar-se de uma característica do português do Brasil, que, curiosamente, ainda que os dois autores citados sejam brasileiros, não é referida como específica daquele país nas áreas da gramática citada em que esses aspectos são focados. Para me situar e mais facilmente poder ajudá-lo a encontrar outros exemplos, consultei o Corpus do Português. Introduzi como tema de pesquisa a expressão «para fazê-lo» e obtive 63 exemplos como resposta, todos de textos oriundos do Brasil, o que, de alguma forma, reforça a minha intuição de que se trata de uma estrutura do português do Brasil.
Bom trabalho!