Sabemos que a linguagem molda o pensamento. Não é indiferente, por conseguinte, o modo como se escreve, reflectindo inevitavelmente uma visão do mundo. Vem isto a propósito da crescente “canibalização” do português pelo inglês, de que resulta um insuportável colonialismo linguístico. À semelhança das ervas daninhas, que sufocam tudo à sua volta, a praga do “portinglês” polui a paisagem mediática. Assim sendo, multiplicam‑se alarvemente os anglicismos semânticos. Vejamos alguns: com o sentido de prova, “evidência”; com o de crucial, “crítico”; com o de humano, “humanitário”; e, ainda, com o de intensificar/aumentar, “escalar”. É por isso que circulam impunemente os mais aberrantes sintagmas da lusa língua. Ei‑los: «evidência científica» (incrível oximoro!); «infra‑estruturas críticas» (perigosas?!); «crise humanitária» (crise?); e (como é possível?) «escalar o conflito».
Até quando, perguntar‑se-á, teremos de aturar tal rol de contra‑sensos? Haja paciência!
Eurico de Carvalho*
Vila do Conde
* in jornal Público, Cartas ao diretor, 22/06/2023. Texto escrito segundo a norma ortográfica de 1945.