Do ponto de vista linguístico, tem o consulente razão, porque já Vasco Botelho de Amaral (Grande Dicionário de Dificuldades e Subtilezas do Idioma Português, 1958), referindo-se ao uso de «um vez dois», observava que a forma correta é «uma vez dois». Também Rodrigo de Sá Nogueira, em Dicionário de Erros e Problemas de Linguagem (Lisboa, Clássica Editora, 1989, p. 145), considerava que o uso correto era «[...] "uma vez...", "duas vezes", e não, de modo nenhum, "um vez" e "dois vezes e menos ainda "dois vez" [...]».
Observe-se, porém, que o dicionário da Academia das Ciências de Lisboa abona o uso de vezes no plural como palavra referente ao operador da multiplicação: «Mat. Designação de um operador de multiplicação, sendo graficamente representado pelo sinal gráfico x. [...] Um vezes três (1x3). Cinco vezes três (5x3).»
Em suma, recomendo «uma vez um, dois, três, etc.» e «duas vezes um, dois, três, etc.», reconhecendo embora que atualmente há quem aceite que a forma «vezes» tem certo uso como designação de um operador matemático.
P. S. – Do mesmo consulente, recebi o seguinte esclarecimento, que agradeço:
«Antes de mais, o meu muito obrigado pela vossa, sempre douta, resposta sobre o tema em assunto, a qual confirmou a minha suspeita. No vosso texto é referido que há quem defenda ser "vezes" utilizado como operador matemático. Estou convencido de que se trata de um ponto de vista sem fundamento académico; atrevo-me mesmo a dizer que não existe qualquer operador matemático com aquela designação. Será certamente uma designação coloquial, popular, facilitadora(?) que se acredita ser mais fácil para as crianças, que se iniciam naquela ciência, apreenderem o conceito da operação de multiplicação, no conjunto dos inteiros positivos. Depois... fica o hábito, que se metamorfoseia em vício (corruptela)! Quanto à operação adição, também não aceito - mesmo com um mínimo de rigor/formalismo – a copulativa e (x e y igual a...) como operador matemático de adição; efetivamente existe o operador "^" utilizado nas Álgebras Booleanas e afins, como operador lógico referente a um certo tipo de operação multiplicativa, tal como o mesmo símbolo invertido para um certo tipo de operação lógica relacionado com a adição. Mas como adição no seu sentido genérico e comum de operação matemática, dever-se-á dizer que «A MAIS B é ...», ou «somando A COM B...», ou ainda «SOMAMDO a A, B ...», etc. Mas «2 E 2...», não! Aliás, a expressão «... 2 e 2...», suscita de imediato a operação aritmética da CONCATENAÇÃO (encadeamento) – 22. Tal como «5 e 5», será 55, etc. É assim que eu, ao arrepio de alguns professores do Ensino Básico, tento ensinar a minha neta. Julgo que não trará dificuldade acrescida, mesmo para os petizes, apreenderem o sentido somatório quando se lhes diz que «2 mais 2...» [...]»
Resta-me reiterar que a atestação do dicionário da Academia das Ciências de Lisboa ocorre na minha resposta apenas para referir um uso, sem querer legitimá-lo como forma mais correta.