«Modernamente, os escritores usam as duas formas para a interrogação: 'Que diria D. Francisco de Borja?' ou 'O que diria D. Francisco de Borja?'. No entanto, os puristas, presos aos ensinamentos dos clássicos, repudiam o uso do artigo definido antes do interrogativo que, baseando-se em exemplos como estes: 'Que te fez este pobre Povo?' (Padre António Vieira); 'Que é o mundo?' (Padre Manuel Bernardes).
Agostinho de Campos, ao invocar o falar do povo rústico - tantas vezes perfeito! - e a própria lição dos letrados, considera 'o que?' autêntica deturpação da linguagem portuguesa.
Contudo, o Dr M. Rodrigues Lapa, na sua Estilística da Língua Portuguesa, pondera: 'Mas a língua progrediu, modificou-se, e hoje tão boa é uma construção como a outra.'
Herculano, respeitador da vernaculidade, não lhe repugnou escrever: 'O que é o livro?', 'O que estão revelando provisões desta ordem?'
Garrett, nas Viagens na Minha Terra, admite: 'Mas o que terá tudo isto com a jornada da Azambuja ao Cartaxo?', 'O que é um inglês, sem Porto ou Madeira... sem Carcavelos ou Cartaxo?'
Latino Coelho, purista insigne, intitula uma das suas poesias: 'O que dirias tu?'
Rebelo da Silva, em diálogo primoroso: 'O que diz, filho?', 'O que hei-de fazer?'
Apesar do exposto, em que duas formas de interrogação aparecem usadas, simultaneamente, pelos nossos melhores escritores, preferimos a boa prática de abolir o artigo definido antes do interrogativo, com vantagens até de ordem eufónica.»