Não é de forma nenhuma consensual que a pronúncia de Lisboa seja considerada a norma.
O gramático Jerónimo Soares Barbosa, na sua Gramática Filosófica da Língua Portuguesa (1881), escreveu o seguinte: “entre as diferentes pronunciações de que usa qualquer nação nas suas diferentes províncias, não se pode negar que a da corte e território em que a mesma se acha seja preferível às mais, e a que lhes deva servir de regra. Os gregos e os romanos assim o julgavam; aqueles a respeito de Atenas e estes a respeito de Roma; e nós o devemos igualmente julgar a respeito de Lisboa, há muitos anos corte de nossos reis e centro político de toda a nação.” Estas palavras mostram que no fim do século XIX a fala de Lisboa não era considerada a da norma e havia quem o desejasse, pelo prestígio da capital.
Estas palavras não alteraram a realidade, e a boa norma prosódica sempre foi considerada a de Coimbra (a lusa Atenas), berço da Academia, difusora, durante séculos, da norma linguística. Efectivamente, repare-se que se pode dizer que esta ou aquela particularidade é característica do falar de Lisboa ou do Porto, ou do Algarve, etc., sempre por referência à norma de Coimbra.
No século em que estamos, século XXI, não me parece que o argumento da capital, que até ao momento nunca teve peso a nível linguístico e que tende a perdê-lo a nível político e social, possa ser invocado para conferir prestígio a uma forma de falar em detrimento de outras.
Assim, caro consulente, claro que a pronúncia de “coâlho” e “riu” por “coelho” e “rio” vai ser sempre considerada como uma particularidade da fala lisboeta, e não a norma.
No entanto, a referência que faz ao enfraquecimento das vogais átonas pré-tónicas, essa não é uma particularidade local. Trata-se de um fenómeno característico deste último período de evolução da língua portuguesa. A vogal pré-tónica “i” na palavra “ministro” sofre, no falar contemporâneo, um processo de dissimilação e enfraquecimento, sendo lida como “e”. Já com o substantivo próprio “Filipe”, o fenómeno não é tão visível, dado o carácter mais estável dos nomes próprios.
Esse enfraquecimento não ocorre nem ocorrerá na saudação “Bom dia”, porque aí, quer o “o”, quer o “i” são vogais tónicas e não átonas. Por outro lado, na expressão “Como está?”, é natural a crase no discurso oral (“com’stá”), dado a primeira palavra terminar em vogal átona e a segunda começar por vogal também átona.
A terminar, direi que a pronúncia é também um elemento de identidade e cada um de nós tem o direito de utilizar aquela com que se identifica.