DÚVIDAS

Orações relativas com «onde»

Na frase «Os extremos do largo são, aliás, os únicos locais onde ainda se veem algumas pessoas a viver o espaço», qual a função sintática da oração «onde ainda se veem algumas pessoas a viver o espaço»?

Na minha primeira análise, seria modificador restritivo do nome, uma vez que é introduzida pelo advérbio relativo "onde" e restringe os locais a que diz respeito... No entanto, parece-me ser obrigatório na frase, o que contraria a definição desse modificador...

Na Gramática da Língua Portuguesa, de Zacarias Nascimento, aparece a informação de que o advérbio "onde" pode introduzir um complemento oblíquo (ex: «Do local onde moro avisto o palácio de Sintra» - neste caso, também está a restringir o local). Se for, de facto, complemento oblíquo, como classificar a oração?

Obrigado.

Resposta

As orações subordinadas adjetivas relativas levantam duas questões de análise:

1.  a função sintática da oração subordinada relativa em relação à oração subordinante.

2.  a função sintática desempenhada pela palavra relativa, neste caso «onde», dentro da própria oração subordinada relativa.

 As orações subordinadas adjetivas relativas desempenham funções sintáticas próprias de um adjetivo: são modificadores do nome (restritivos ou apositivos).

Assim, em ambas as frases, as orações  «onde ainda se veem algumas pessoas a viver o espaço» na primeira frase  e «onde moro» na segunda frase são  orações  subordinadas adjetivas relativas restritivas com função de modificador restritivo do nome  ao qual se referem.

a) Os extremos do largo são, aliás, os únicos locais [onde ainda se veem algumas pessoas  a viver o espaçoor.rel..]. A oração relativa introduzida pelo advérbio relativo «onde» modifica o grupo nominal «os únicos locais», sendo este grupo nominal  o referente do grupo nominal  «o espaço» na oração relativa. A oração relativa desempenha, portanto, a função sintática de modificador restritivo do nome

b) Na segunda frase, «Do lugar onde moro avisto o palácio de Sintra», a oração relativa «onde moro» modifica o nome «local». A estrutura profunda da frase é  «[Eu] avisto o palácio de Sintra do lugar [onde moroor. rel]. A oração relativa desempenha a função sintática de modificador restritivo do nome «lugar».

Analisemos, agora, apenas as orações adjetivas relativas que compõem cada uma das frases.

a) Onde ainda se veem algumas pessoas a viver o espaço.

b) Onde moro.

A estrutura profunda das orações simples seria:

a') Algumas pessoas ainda se veem a viver (n)o espaço.

b') Eu moro no local.

Repare que os verbos viver e morar são transitivos indiretos, selecionam, portanto, complemento oblíquo em ambas as frases. Note-se ainda que o advérbio relativo «onde» tem sempre o traço semântico [+ lugar], é sempre locativo, podendo ser, como é o caso, um complemento oblíquo, ou um modificador do grupo verbal, como por exemplo em:

c) Relembro o local [onde conheci o Pedro.]

d) Fui ao restaurante [onde se come o melhor cozido à portuguesa.]

Os verbos conhecer e comer são transitivos diretos, selecionam, portanto, complemento direto (o Pedro, em c) e o melhor cozido à portuguesa, em d).  O advérbio relativo «onde» desempenha a função sintática de modificador do grupo verbal dentro da oração relativa.

Assim, relativamente  à  oração subordinante, as orações  subordinadas adjetivas relativas restritivas desempenham a função sintática de modificador restritivo do nome em a), em b), em c) e em d); embora o advérbio «onde», dentro da oração relativa em que ocorre,  desempenhe a função sintática de complemento oblíquo em a) e b) e de modificador em c) e d).  

Referência bibliográfica: Gramática do português, Fundação Calouste Gulbenkian, cap.39, vol. II, p.p. 2102-2104. 

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