A forma ao, no exemplo em análise, aproxima-se das conjunções temporais e equivale a enquanto ou quando. Trata-se de uma das situações em que uma preposição ou locução prepositiva (neste caso contracção/contração) surge com valor conjuncional a ligar orações, ou, se quisermos, a introduzir uma oração subordinada, no caso subordinada temporal infinitiva.
Construções em que uma preposição – ou em outros casos um advérbio – surge a ligar orações é bastante comum. Vejamos os exemplos subsequentes:
1 Quero acabar o trabalho para ir ao cinema.
2 Em acabando o trabalho vou ao cinema.
3 Apesar de ter muito trabalho, vou ao cinema.
Em alguns casos, como em apesar de – antigamente apesar de – a sua utilização é tão frequente que as expressões são já incluídas nas conjunções ou locuções conjuncionais pelos gramáticos. Noutros casos, como em em e ao o seu uso é menos frequente e a sua mudança de uma classe gramatical para outra é mais lenta ou menos notada. Saliento que o o que surge associado a a em ao já perdeu a sua individualidade, sendo difícil saber se inicialmente se tratava de um artigo ou de um pronome demonstrativo.
A razão por que estas situações acontecem numa língua prende-se com a sua própria vitalidade e capacidade renovadora. É hoje difícil identificar a expressão em boa hora em embora e, no entanto, foi ela que lhe deu origem.
Voltando a ao, a preposição aí presente é a do latim "ad". Esta preposição tem desde o latim sentidos como o de continuidade temporal e estabelece entre os elementos que liga uma relação de subordinação. Talvez estes dois factos tenham contribuído para o comportamento da contracção ao, que nos permite, como já referi, associá-la às conjunções ou locuções conjuncionais subordinativas temporais, cuja função é ligar orações.
As gramáticas quando abordam a palavra ao – penso que, dado o novo significado que adquiriu, em que já não é perceptível a individualidade das formas originais, a podemos considerar como tal – associada a construções como a que a consulente refere salientam que esta construção é mais comum em Portugal, sendo preferencialmente usada no Brasil uma construção com o verbo no gerúndio. Assim, a «Ao cantarem todos saíram…» equivalerá no Brasil «Cantando, todos saíram…».