Estas frases apresentam algumas diferenças.
1 – «Não duvidavam de que o Mal existe.»
A utilização do presente do indicativo é a que está mais de acordo com o substantivo Mal iniciado por maiúscula. Assim, marcamos melhor a perenidade do Mal.
2 – «Não duvidavam de que o Mal existia.»
Neste caso, a existência do Mal fica limitada ao tempo daqueles que não duvidavam.
Esta frase adapta-se sobretudo a uma descrição histórica. Exemplo: Os Egípcios não duvidavam de que os seus deuses existiam.
3 – «Não duvidavam de que o Mal existisse.»
O modo conjuntivo ou subjuntivo corresponde a situações dependentes, hipotéticas, conjecturais, etc.
Por este motivo somos levados a admitir que os indivíduos em questão não duvidavam da existência do Mal ainda que não conhecessem a força, a
causa ou a entidade que o determinava.
A. Tavares Louro
N.E. – A prof.ª Edite Prada deu também o seu contributo à questão colocada pelo consulente Fernando Bueno.
A questão que o consulente Fernando Bueno coloca prende-se com um aspecto que costuma ser designado por concomitância verbal, ou sequencialização temporal,
ou, ainda, em latim ‘consecutio temporum’. Este aspecto prende-se como o facto de, nas frases complexas, haver uma articulação entre os tempos verbais das frases envolvidas, articulação essa que implica leituras diferentes para tempos, ou modos, diversos. O próprio uso da negativa, bem como as características lexicais e semânticas dos verbos envolvidos, pode ser condicionante da construção.
Nas três frases apresentadas a oração subordinante «eles não sabiam» designa um evento que se situa no passado. Num tempo passado, talvez ontem, ou há um mês eles não sabiam algo. Mas agora já sabem.
A frase subordinada tem características muito interessantes, pois reporta-se a uma entidade que, tendo em conta o conhecimento que temos do mundo, permanece no presente: o mal. Esse conhecimento vai condicionar, de alguma forma, a interpretação da frase complexa. Assim, em, (1) «Eles não sabiam que o Mal existia.» os dois verbos estão no passado e, ainda que veiculem uma ideia de “acção continuada”, posso assumir que ambas as afirmações se esgotaram, não dizendo, potencialmente, respeito ao presente. A frase (1) pode equivaler, por exemplo, a «Eles não sabiam que o João chegava tão cedo». Como o João já chegou, eles, “agora”, já sabem… Porém, como todos sabemos que o mal continua a existir, a frase «o Mal existia» pode ser interpretada como não se tendo esgotado no passado, continuando no presente.
(2) «Eles não sabiam que o Mal existe.»
A frase (2) é a que veicula informação mais adequada ao conhecimento que temos do mundo. Efectivamente, o mal não é coisa do passado – quem
dera que fosse! Enquanto em (1) se pode presumir que o mal deixou de existir, em (2) a única coisa que, potencialmente, se alterou foi o conhecimento que eles tinham de uma realidade que existia quando eles não sabiam e que continua a existir, “agora” que eles já sabem. É, pois, dado o sentido global e as restrições que o tipo de mensagem veiculada implicam, a frase mais correcta.
(3) «Eles não sabiam que o Mal existisse.»
O problema que se me coloca na aceitação da frase (3) não se prende com a sequencialização temporal, mas, sobretudo, e uma vez mais, com a mensagem veiculada. Em (1), embora o verbo existir esteja no passado, não é impossível, como já vimos, assumir que o mal ainda existe, aproximando o sentido de (1) do que, mais explicitamente, é veiculado por (2). Em (3), embora a frase não seja agramatical, tenho alguma dificuldade em aceitar o uso do modo conjuntivo, tendo em conta a mensagem global veiculada e o conhecimento que tenho do mundo em que vivo.
No entanto, noutras frases, a sequencialização temporal que nesta está presente não me parece problemática:
(4) Eles não sabiam que pudesse haver saída.
Note-se que o uso do imperfeito do conjuntivo é condicionado pela forma do verbo, como também o pode ser pelo seu sentido:
(5) *«Eles sabiam que o Mal existisse.»
(6) «Eles supunham que houvesse outra saída.»
Concluindo, embora a sequencialização temporal apresentada nas três frases em apreço seja gramaticalmente possível, considero aceitáveis apenas as duas primeiras, que repeti como (1) e (2). O factor que restringe a minha interpretação é de ordem pragmática, pois é o conhecimento que tenho do mundo que condiciona a leitura que faço. É esse mesmo conhecimento que me leva a preferir a frase (2), por ser a mais rigorosa, no contexto em que surge.