Segundo, por exemplo, os dicionários Infopédia, Priberam e Moderno Dicionário da Língua Portuguesa (Círculo de Leitores), rodriguinho significa, entre outras coisas, «[Gíria] Objecto de pouco valor; sentimentalismo barato utilizado como recurso pelo actor para fazer emocionar o público; tremelique, trejeito, frescura. (Mais usado no plural); frase feita para tudo; indivíduo excessivamente apurado no vestir; janota [...]». A Infopédia refere ainda que o vocábulo em análise é composto pelo antropónimo Rodrigo + sufixo -inho.
Entroncando, portanto, nesta linha de definição da citada palavra, surge a expressão «fazer rodriguinhos», registada também no Dicionário Priberam com o significado de «fazer intriguinhas».
Deste modo, deixa-te de rodriguinhos significará, na sua acepção mais popular, digamos assim, «deixa-te de intrigas/de conversas sem interesse nenhum».
Numa acepção um pouco mais lata, ainda que derivando sempre da linha da definição proposta, fazer algo «sem rodriguinhos» poderá igualmente significar, dependendo dos contextos, «pôr de lado tudo o que é acessório ou tudo aquilo que não interessa; sem floreados; sem dramas desnecessários; sem sentimentalismo barato». A este propósito, leia-se, por exemplo, o seguinte artigo de Eduardo Cintra Torres, intitulado justamente «Sem rodriguinhos».
Vertidas estas informações, que me parecem importantes para enquadrar o seguimento da presente resposta, passemos então à proposta de análise da origem da citada expressão. A este nível, devo dizer que em parte alguma encontro uma explicação, digamos, oficial ou dire{#c|}ta, que dê conta das razões que levaram a que a mesma começasse a ser usada, de maneira recorrente, com os sentidos já elencados.
Porém, de acordo com a investigação levada a cabo, passo aqui a sugerir algumas pistas que podem eventualmente ajudar a determinar o rasto histórico da expressão «fazer rodriguinhos»/«deixar-se de rodriguinhos»:
1) Gentil Marques, na sua recolha Lendas de Portugal (Porto, Universus, 1962, vol. III), dá-nos a conhecer um texto popular de origem algarvia intitulado «Lenda da galanteria de D. Rodrigo», que relata a história de um tal D. Rodrigo de Mascarenhas, cavaleiro «conhecido pela sua galanteria para com as damas e especial benevolência para com os enamorados». Reza, então, a lenda que, durante o reinado de D. Afonso III (época em que «a conquista do Algarve era o sonho máximo»), D. Paio Peres Correia, mestre de Sant´Iago, reunindo «a fina flor dos cavaleiros lusos, levava por diante o sonho do seu rei». Ora, por entre os cavaleiros às suas ordens, encontrava-se supostamente D. Rodrigo de Mascarenhas. O avanço contra o Mouro foi avassalador, caindo «castelo após castelo, numa entrega total». Quando chegaram «às portas de Loulé», o exército português, depois de dois dias de combate, vergou finalmente os mouros, e os cavaleiros cristãos entraram na fortaleza daquela localidade algarvia, fazendo prisioneiros os soldados mouros. Responsável por estes ficou o «galanteador» D. Rodrigo, que reparou que um dos cativos se apresentava de forma algo estranha: era «um jovem de semblante simpático, mas terrivelmente triste», que se encontrava, contrastando com todos os outros, «ricamente vestido». Assim que teve oportunidade, o cavaleiro português aproximou-se do prisioneiro e perguntou-lhe, como se de um amigo se tratasse, porque estava ele tão triste. O mouro resolveu então contar a D. Rodrigo a sua insólita história: encontrava-se profundamente apaixonado por Jarifa, uma linda mulher, filha do alcaide da cidade onde nascera e crescera. Porém, deparava-se com um grave problema, que se prendia com o facto de o pai da sua amada não aprovar o seu relacionamento amoroso. Deste modo, tinham os dois decidido casar-se em segredo. Com o obje{#c|}tivo de consumar tal pretensão, Jarifa enviou um mensageiro a Loulé que transmitiu a Abindarráez (nome do prisioneiro mouro) que ela o esperava em Silves para a concretização do tão almejado casamento. Era precisamente para lá (Silves) que Abindarráez se dirigia no preciso momento em que os portugueses chegaram para tomar Loulé, daí que ele se apresentasse vestido daquela forma. D. Rodrigo, profundamente sensibilizado por esta história de amor, resolveu libertar o prisioneiro mouro, sob uma condição, isto é, que ele voltasse a Loulé depois de consumado o casamento. E assim foi: Abindarráez casou com Jarifa no castelo de Silves e voltou, tal como prometido (com Jarifa), para junto de D. Rodrigo, retomando a sua condição de prisioneiro. D. Rodrigo, impressionado pela beleza retumbante de Jarifa, e emocionado com toda esta história de amor, não só conseguiu, junto de D. Afonso III, o perdão para os recém-casados, como também convenceu o pai de Jarifa a perdoar a fuga da sua filha. Algumas semanas depois, com o intuito de agradecer o extraordinário gesto de D. Rodrigo, Abindarráez enviou à fortaleza de Loulé emissários «com grande quantia em dinheiro e dois formosos cavalos brancos». D. Rodrigo, sorrindo, recusou tais presentes, dizendo que não estava «habituado a roubar damas, senão a servi-las e honrá-las!» «Levai antes as minhas homenagens à mulher mais bela que até hoje vi, e ao jovem de porte altivo e sangue nobre, que entraram fundo no meu coração.»
2) Por outro lado, é também na região do Algarve que surgem os famosos doces de amêndoa, chamados D. Rodrigo, igualmente conhecidos por rodriguinhos devido às suas reduzidas dimensões e ao facto de a sua apresentação final ser bastante «janota» (para utilizar um adjectivo sugerido como sinónimo do termo em análise na generalidade dos dicionários consultados), aparecendo normalmente embrulhados em papel metalizado colorido, em forma de pirâmide tosca (cf. Wikipédia). Aliás, no Priberam e no dicionário da Academia das Ciências de Lisboa, por exemplo, uma das definições propostas para o vocábulo rodriguinho é justamente: «s. m. pl. Doces de amêndoa do Algarve». É igualmente de salientar que são bastante difusas e até algo contraditórias as explicações para a origem do nome atribuído aos referidos doces, porém, não será de descartar a possibilidade de existir uma relação entre estes e a «Lenda da galanteria de D. Rodrigo».
Reitero: estas são meras pistas de análise para uma potencial descodificação das origens da expressão sugerida pela consulente, pois, na verdade, repito, não encontro, em nenhum dos muitos instrumentos linguísticos consultados, uma explicação directa e sustentada para a mesma.
Finalmente, e em estilo de nota de rodapé, creio que valerá a pena referir que, no Grande Dicionário da Língua Portuguesa, de António Morais e Silva, e no Aulete Digital, por exemplo, é apresentada como ocorrência paradigmática da expressão «Rodriguinho» um excerto da tradução da obra de William Shakespeare (A Midsummer Night's Dream), por António Feliciano de Castilho (Sonho de Uma Noite de S. João, 1874), que parece apresentar, creio eu, algum grau de compatibilidade com as pistas de análise aqui sugeridas – «[...] já disse: o teu papel é o Píramo, e mais nada. O Píramo, vês tu? é um rapazote de aspecto prazenteiro, um Rodriguinho todo alfenado [= enfeitado, cf. Priberam e Dicionário Houaiss] [...] muito senhor, muito amável [...].»