Julgo que o uso ou não uso da crase nas expressões dadas como exemplo não é aleatório. Penso que a perspectiva que explica a presença do artigo definido, e portanto a crase, é, originariamente, e por inércia actualmente, a da própria óptica ou ponto de vista do tribunal (juiz enquanto operador judiciário), e não a do condenado ou do utente da justiça ou do público em geral.
Quando se diz que um réu vai condenado a 2 ou 10 anos de prisão, parece implícito que o tribunal, ao condenar, se está a reportar a uma pena que estava indeterminada, não predeterminada, na lei penal. Efectivamente, a lei limita-se a prever um escalão penal com um mínimo e um máximo (por exemplo, o escalão de 8 a 12 anos de prisão maior) para cada tipo de crime em abstracto. O tribunal, por sua vez, faz a dosimetria concreta da pena dentro do escalão respectivo (excepcionalmente dentro de um escalão acima ou abaixo), mediante sopeso das atenuantes e das agravantes. A determinação ou definição da pena faz-se, pois, na sentença, estando feita na lei a previsão da pena somente em abstracto. A pena de prisão perpétua, é claro, não corresponde a um escalão penal, mas representa, nos sistemas legais que a admitem, a cúpula ou limite máximo natural (embora a pena seja "desnaturada") da escala que integra todos esses escalões, o que faz, verosimilmente, que seja "arrastada" para a construção linguística usada para o regime normal de prisão.
Na dita óptica, é plausível dizer-se, como dizem os tribunais, que «o réu vai condenado a uma pena de prisão de 2 anos» (subentendidamente: a uma pena de prisão não predeterminada na Lei Penal, que o tribunal determina ou define em 2 anos), em vez de se dizer que vai condenado "à" pena de prisão de 2 anos. Logo, não há desacerto gramatical ou lógico em evitar-se aqui o uso do artigo definido. E, onde não há artigo definido, não pode, obviamente, haver crase.
Na mesma óptica, quando o tribunal diz que «o réu é condenado à morte» (v.g., à forca, à electrocussão), ao exílio, à privação ou suspensão de determinados direitos civis, etc., está a reportar-se a uma pena predeterminada, logo, já definida para o delito de que o réu está acusado. Logo, faz aí sentido o uso do artigo definido. E, se há artigo definido, há crase.
Analogamente, serve o exemplo da pena de multa. É normal ouvir-se ou ler-se que «o arguido foi condenado a uma pena de multa no valor de X», não "à" pena de multa.