Em primeiro lugar, importa sublinhar que, em termos sintá{#c|}ticos, as frases em discurso dire{#c|}to diferem bastante das completivas e, como procuraremos demonstrar, não se constituem como complemento dire{#c|}to do verbo introdutor.
1. Ao contrário das completivas, não é possível encontrar nas frases em discurso dire{#c|}to um complementador (ou conjunção, na terminologia tradicional) que ligue as duas orações.
2. Tipicamente é obrigatória uma pausa, na fala, ou pontuação que a indique, na escrita, entre o verbo introdutor e a frase no discurso dire{#c|}to. Assim, uma estrutura como «* O João disse eu estou contente» é an{#ó|ô}mala, sendo possível apenas uma construção como «O João disse: – Eu estou contente.» Pelo contrário, as completivas ocorrem sem qualquer pausa entre o verbo introdutor e a oração subordinada: é bem formada uma frase como «O João disse que está contente», sendo an{#ó|ô}mala a sua equivalente com pausa, i. e. «* O João disse: que está contente». Ora, como sabemos, nunca são possíveis pausas entre um verbo e o seu complemento dire{#c|}to, o que indicia que as frases em discurso dire{#c|}to não estabelecem este tipo de relação sintá{#c|}tica com o verbo introdutor, em contraste com o que sucede com as subordinadas completivas.
3. As frases com discurso dire{#c|}to permitem a introdução de um sintagma nominal com a função de complemento dire{#c|}to do verbo sem ocasionarem qualquer tipo de agramaticalidade. Assim, é perfeitamente possível uma estrutura como «O João disse estas palavras/uma coisa extraordinária: – Estou contente.» Já numa construção completiva, a introdução de um complemento dire{#c|}to de tipo nominal dá inequivocamente origem a estruturas agramaticais, como podemos comprovar em «* O João disse estas palavras/uma coisa extraordinária que está contente». Isto significa que a oração completiva e o SN complemento dire{#c|}to do verbo competem pela mesma posição sintá{#c|}tica, não sendo possível a sua comparência simultânea. Já no caso do discurso dire{#c|}to, o fa{#c|}to de as duas formas coocorrerem indica que elas ocupam duas posições sintá{#c|}ticas diferentes: o SN será o complemento dire{#c|}to, e a frase em discurso dire{#c|}to constitui uma espécie de elaboração ou estrutura apositiva a este.
Dado que, como vimos, as frases no discurso dire{#c|}to se encontram ligadas ao verbo introdutor através de uma pausa acentuada, colocamos a hipótese de que estamos perante estruturas apositivas, tal como definidas em Mateus et al. (2003), Gramática da Língua Portuguesa, ed. Caminho: cf. «(…) aposição, um processo que consiste em justapor a sintagmas ou frases outros sintagmas e frases, materializando-se a conexão entre essas unidades através da utilização de pausas e de uma entoação específica (…)» (p. 557). Isto não invalida, no entanto, o fa{#c|}to de, em termos semânticos, as frases em discurso dire{#c|}to serem usadas para completar o significado do verbo introdutor.
Observemos, agora, os exemplos propostos:
«Quando o José abriu a caixa disse:
– É para mim!»
A primeira oração é, na verdade, como indicado na pergunta, uma subordinada adverbial temporal; a segunda será a oração principal relativamente à subordinada temporal: o fa{#c|}to de ser constituída apenas pela forma «disse» deve-se, por um lado, a termos um sujeito nulo correferente com o sujeito da primeira oração e um complemento dire{#c|}to que também não se encontra expresso, já que é “elaborado” pela frase no discurso dire{#c|}to que, segundo a análise que aqui estamos a propor, se constituiria como uma estrutura de tipo apositivo.
Já no que diz respeito à construção «Penso – disse meu pai – que te darás melhor em letras», temos uma frase intercalada «i. e. disse meu pai» que constitui igualmente uma forma de estrutura apositiva relativamente à frase em discurso dire{#c|}to.
Finalmente, a última frase sugerida é bastante diferente das anteriores: «Será que expulsá-lo da aula foi bem pensado?» Trata-se de uma oração interrogativa dire{#c|}ta em que a oração «expulsá-lo da aula» se constitui como sujeito do predicado «foi bem pensado»; estamos perante uma configuração em que a interrogação (e a dúvida que lhe está subjacente) é reforçada pela forma «será que», sendo equivalente a «foi bem pensado expulsá-lo da aula?» (sem reforço da interrogação) ou a «Expulsá-lo da aula, será que foi bem pensado?».