Do ponto de vista normativo, trata-se de formas inaceitáveis. Numa perspectiva descritiva, são exemplos de variantes marginais da língua, nas suas modalidades brasileiras.
Gostaria também de comentar aquilo que o consulente chama «estado de degeneração», porque é pertinente saber o que se quer dizer por degeneração quando se fala de língua. A descrição do uso linguístico envolve necessariamente o confronto com expressões e estruturas não normativas. As frases em questão são reflexo directo de uma maneira de falar popular, que se identifica com o ambiente dos estádios de futebol, desporto de multidões. A televisão, acabando por difundir e ampliar essas manifestações, pode levar muitos falantes menos escolarizados — entre eles os que ainda frequentam a escolaridade obrigatória — a crerem que essas formas e construções são aceitáveis. Penso que essas formas só serão interpretadas literalmente se na escola e nas famílias não houver o cuidado de informar os mais jovens sobre o carácter dialectal de tais produções. Quanto a mim, trata-se de uma intervenção que visa desenvolver a cultura linguística de cada falante, dando-lhe os meios para saber avaliar a relação das formas linguísticas com o contexto sociocultural em que elas ocorrem.
Mas também considero que condenar liminarmente o que é sinal de variação do português do Brasil pode equivaler a ignorar neuroticamente a realidade de uma língua num determinado território e contexto social: a forma escrita "nóis" não é normativa, mas refle{#c|}te uma realização fonética generalizada na pronúncia do Brasil, mesmo entre as classes cultas; e estruturas normativamente inaceitáveis como «filma nóis» e «filma eu» relevam de certas especificidades históricas do português do Brasil. Convém acrescentar que, no português europeu, formas e construções não normativas como "voceses", "pa" em vez de para, "le" em vez de lhe, «a gente vamos» levantam questões semelhantes às formuladas pelo consulente. O ideal seria que todos nós, enquanto falantes, tivéssemos cultura linguística suficiente para, por um lado, compreender a necessidade de uma norma, porque aceitar toda e qualquer variação é pôr em causa a própria possibilidade do uso linguístico em comunidade; e, por outro, encarar com mais tranquilidade e espírito crítico os usos variantes. Que um grupo de fanáticos pelo futebol apresente faixas com frases escritas em português errado é talvez menos sintoma de decadência linguística do que sinal (muitas vezes patológico) de coesão de grupo, afirmando lealdade a um clube e hostilidade a um adversário.