Numa resposta anterior do Ciberdúvidas, já antiga (1999), que cita o dicionário da Porto Editora, afirma-se que o termo alcaparra designa não só o botão floral da alcaparreira mas também o seu «fruto baciforme». Esta informação, porém, não é corroborada por uma obra mais recente da mesma editora (Grande Dicionário da Língua Portuguesa, 2001), que não faz qualquer referência ao fruto no respetivo verbete, tal como o Aulete digital e o Priberam.
A utilização do fruto, aliás, parece ser menos frequente que a do botão floral. Por exemplo, na extensa Enciclopédia de Plantas Medicinas das Seleções do Reader’s Digest, da autoria de Andrew Chevalier, cuja edição portuguesa foi publicada em 1998, refere-se que as partes utilizadas da alcaparreira são apenas a «Casca da raiz, casca, botões florais» (p. 180). Já na obra Medicina Popular, Tratamento pelas Plantas Medicinais, composta pelo naturólogo e homeopata João Ribeiro Nunes (Litexa Editora, 1999) se afirma, a respeito da alcaparreira, que «Toda a planta é útil» (p. 44), mas não se faz qualquer referência específica ao fruto...
Na Enciclopédia das Ervas e Plantas Medicinais, da autoria de René Morgan (Hemus, 8.ª edição, 1997), podemos, porém, ler que «As alcaparras são os botões florais ainda não abertos, cujo tamanho varia entre o do grão de pimenta e o de ervilha. O fruto denomina-se taperot em catalão (alcaparrão). Tanto as alcaparras como os frutos são utilizados em saladas e como condimento, dentro de vinagre» (p. 37). Neste sítio brasileiro, também se lê que «alcaparra é a flor, e alcaparrão, o fruto»
É deste termo “alcaparrão”, ainda não dicionarizado, que se servem várias empresas, sobretudo brasileiras, que comercializam os frutos da alcaparreira, como esta, esta e estoutra. Trata-se provavelmente de uma adaptação do castelhano alcaparrón, vocábulo bastante frequente no país vizinho e que figura no prestigiado dicionário da Real Academia Espanhola.
Neste sítio de uma empresa espanhola que comercializa estes frutos, lê-se, na versão portuguesa, que «Os alcaparrões são os frutos ainda verdes da alcaparreira. Têm também um sabor agridoce e muito característico como as suas parentes, as alcaparras». Este sítio, aliás, por ser multilingue, permite verificar que, enquanto a língua francesa dispõe de termo próprio para designar o fruto (câpron), em inglês e em alemão diz-se «bagas da alcaparreira» (caperberries e Kapernbeeren, respetivamente), e em russo diz-se «alcaparras grandes» (крупные каперсы), pelo menos de acordo com os tradutores do sítio. O sítio não está traduzido em italiano, mas na língua de Dante estes frutos são conhecidos por cucunci. Nalgumas regiões (por exemplo, na Sicília) constituem mesmo uma conhecida especialidade gastronómica.
Em suma, tudo indica, a meu ver, que o fruto da alcaparreira poderá ser designado por “alcaparrão”, termo já utilizado a nível comercial, pelo menos no Brasil. Apesar de se tratar de um castelhanismo, creio nada haver a obstar a este vocábulo, até porque está bem formado: na verdade, poderá considerar-se derivado de alcaparra mediante o sufixo aumentativo -ão, como sucede em inúmeras palavras do nosso idioma (caldeirão, paredão, portão, etc.). A utilização deste sufixo aumentativo justifica-se plenamente, se atendermos ao facto de os frutos da alcaparreira serem visivelmente mais bojudos que os respetivos botões florais.