DÚVIDAS

A ortografia dos nomes Vladimir e Boris

Aproveito a vossa resposta n.º 30 079 para fazer uma pergunta. Nesse caso, para manter uma certa coerência com aquilo que os senhores dizem no terceiro parágrafo, não se deveria escrever (e pronunciar) VlaDÍmir e BaRÍS (em vez dos já muito disseminados VladiMIR e BÓris)? Segundo aquilo que um falante de russo me informou, a palavra Vladimir é paroxítona, e a palavra Boris é oxítona, para além de a letra russa o ser pronunciada de um modo parecido ao nosso â fechado, quando não é acentuada. Correcto? Estendo a minha pergunta para todos os casos em que, na tradução/transliteração para o português, tornou-se corriqueiro fazer a deslocação do acento.

Resposta

Exatamente. Se quisermos, ao transliterar os nomes próprios Владимир (Vladimir) e Борис (Boris), manter a pronúncia original, como indica o consulente, é necessário reconhecer que a primeira palavra é paroxítona – não precisando de um acento gráfico em português para que se acentue assim – e a segunda, oxítona. Também é verdade que o nome Boris, em russo (e sem equivalente em português, pelo que não pode ser traduzido, e tal prática, como dissemos em resposta anterior, caiu em desuso), é pronunciado [bɐris], portanto, com redução vocálica do o – precisamente por fazer parte de sílaba átona e, acrescentamos nós, com o som [s] no fim, e não [ʃ], como habitualmente pronunciamos, ou seja, para lermos este nome tal como se pronuncia em russo, teríamos de grafar algo como Barice (neste caso, paroxítona, não se pronunciando o e final, mas que teria de ser grafado para c ter valor de [s] e não de [k], como leríamos em baric). Mas surge-nos, com isto, outro problema, ao mantermos a pronúncia, afastamo-nos da transliteração (passemos a redundância) «à letra».

Esta questão é complexa, e, enquanto não existir uma norma, será difícil estabelecer parâmetros que cumpram, ao mesmo tempo, vários objetivos: a) fazer corresponder as letras, ou seja, transliterar fielmente; b) fazer corresponder a pronúncia, procurando, nesse sentido, a melhor combinação de letras existente no alfabeto de destino; c) obedecer às regras ortográficas da língua de destino.

Desta forma, há uma certa liberdade gráfica no que diz respeito ao uso de topónimos e antropónimos estrangeiros, sendo que, tal como procurámos explicar em resposta anterior, todos os argumentos acima são válidos para adotar a «forma ideal» – se é que tal existe, pelo menos em todos os casos.

Até aqui ensinava-se que se devia traduzir todos os nomes próprios e apelidos, tal como indicado no Tratado de Ortografia da Língua Portuguesa, do doutor Rebelo Gonçalves, contudo, isto nem sempre era aplicável, e tal norma caiu completamente em desuso, o que se entende, já que nem a todos agrada ver o seu nome «mudado» no estrangeiro; por exemplo, imaginemos alguém chamado João Madeira que vai para a Rússia e passa a ser chamado Ivan Derevo (Иван Дерево – tradução de João Madeira) – quem não soubesse russo nem sequer percebia que era de si que falavam...

Tendo em conta a problemática em torno deste assunto, existem em linha no Ciberdúvidas algumas perguntas relacionadas que podem interessar ao consulente, e cuja hiperligação indicamos abaixo.

Sugerimos ainda a leitura do artigo Sobre a transliteração de outros alfabetos, na rubrica O Nosso Idioma.

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