Infelizmente, como já várias vezes referimos aqui no Ciberdúvidas, não existe uma norma para a transliteração do alfabeto cirílico.
Normalmente, o que se tenta é encontrar a correspondência fonética mais próxima do original, respeitando as normas ortográficas da língua de destino, tratemos quer de antropónimos quer de topónimos, etc. Desta forma, o já há muito consagrado antropónimo Lenine, em português (e ao contrário do russo, cuja composição letra a letra é Lenin), grafa-se com e no fim, precisamente para não termos uma palavra terminada em n, apesar de esta vogal não ser lida, como acontece com, por exemplo, Marlene.
É de sublinhar, no entanto, que, apesar de em russo não existir acento gráfico (à exceção do trema), a transliteração deve ser acentuada, para evitar que se fuja à fonética original, em que a sílaba tónica é a primeira, e não a penúltima. Portanto: Lénine/Lênine. O que não significa que esteja errada uma transliteração sem ser adaptada ao português, e portanto, sem o e final: Lénin/Lênin.
Claro que a questão é muito mais complexa do que parece à primeira vista, já que em russo se aplica uma regra fonológica denominada palatalização que, basicamente, se processa nas consoantes que antecedem vogais como e. Isto para dizer que a correta leitura do antropónimo em questão corresponderia em português a algo como Lhenin, em que se lê tal como em alho. Neste sentido, para ter um equivalente fonético muito próximo do original, exceder-se-ia a simples transliteração, já que a letra tem contextos de [l] e de [ʎ].
Assim, a tendência é simplificar e adaptar uma transliteração simples, letra a letra, mantendo as regras ortográficas da língua de destino – sempre que possível – e preferencialmente, respectiva acentuação.
Dito isto, sugerimos, então:
– Vladimir Ilitch Lénine/Lênine (ou Lénin/Lênin) – note-se que só acentuamos o sobrenome, já que a sílaba tónica do nome próprio e do patronímico é a penúltima.
– Lev Davídovitch Trotski. Aqui é de salientar ainda uma outra questão, que se relaciona com a tradução dos nomes próprios e que é corrente com o nome russo Lev, que pode ser traduzido para Leão (tal como em Leão Tolstói). Claro que a minha autoridade é pouca, mas julgo que deveria haver uniformidade, e se decidimos traduzir alguns nomes próprios, então teríamos de traduzir todos (por exemplo, Nadia equivale a Esperança), teríamos ainda de, já que enveredamos pela tradução, traduzir também os patronímicos (-itch, à letra, corresponde a: «filho de») e, finalmente, muitos dos apelidos que, tal como em português, têm significado associado. Esse tipo de tradução é, aliás, contemplado no Tratado de Ortografia da Língua Portuguesa, do doutor Rebelo Gonçalves, e por isso temos bastantes nomes aportuguesados, mas a realidade é que a tradução de nomes próprios está cada vez mais em desuso.
Concluindo, o que apontamos aqui são aproximações do que deveria constituir numa norma de transliteração, a qual não está ainda estabelecida, por isso, o que aqui expusemos não passa de conselhos. Isto é, podemos estranhar certas transliterações, mas não podemos dizer que estão erradas – apenas se aproximam mais ou menos do original, ou respeitam mais ou menos as regras ortográficas da língua para a qual se translitera (opções nem sempre associáveis).
Normalmente, há uma transliteração que vinga, pois é adotada por mais falantes, o que não significa que seja a mais correta, repito, dentro dos parâmetros ou argumentos aqui apresentados.