Grafia correta no que trata topónimos e antropónimos transliterados menos conhecidos é ainda «terreno lamacento», já que, como várias vezes abordado no Ciberdúvidas, não existe uma norma de transliteração.
O que acontece é que há uma transliteração que se vai generalizando, é adaptada pela maioria dos falantes e, assim, passa a ser considerada como «a mais correta». Podgorica é, sem dúvida, a transliteração mais corrente, não só em português como em inglês, francês e noutras línguas. Mas a verdade é que, apesar de lícita, essa transliteração não dá conta do valor da última consoante da palavra, que se lê [ts] (som que em português se encontra na palavra tsunami) e não [k]. Ora, se temos tsunami e não *cunami, não vejo porque não podemos ter Podgóritsa em vez de Podgoritsa, respeitando a pronúncia original, a questão é que estamos tão habituados à referida transliteração, que se será difícil mudar hábitos.
Outra opção seria traduzir o topónimo (pois neste caso é possível), à semelhança do nome do país de que esta cidade é capital, Montenegro – Црна Гора, cuja transliteração mais fiel à pronúncia seria Tserna Gora – mas que se traduz por: Montenegro; Црна (Negra) Гора (Montanha). Assim poderíamos fazer como com a sua capital, Подгорица: que significa algo como «Debaixo da Colina/Monte» (e por acaso até temos um topónimo português parecido: Trás-os-Montes). Mas se Podgoritsa será difícil de adotar, muito pior será «Debaixo da Montanha».
Parece que, pelo menos para já, a melhor alternativa é Podgorica, para se fazer entender. O que não significa que seja errado usar outras transliterações mais fiéis ao original, pois esse é um argumento perfeitamente válido. Nesse caso, a melhor opção será Podgoritsa. E quem sabe se daqui a uns tempos esta forma não virá a ser a mais comum, pois a língua está em constante mudança?
Quanto à acentuação desta mesma palavra, a questão é um pouco mais complexa. Contatando vários falantes nativos, verifica-se que não há uniformidade, existindo quem pareça acentuar mais a primeira, a segunda ou a terceira sílaba (nunca a última). Isto deve-se ao facto de, apesar de não se poder considerar o montenegrino uma língua tonal como o chinês, por exemplo, em que tons diferentes num mesmo contexto lexical implicam uma mudança a nível semântico, é verdade que esta língua, tal como o sérvio ou o croata, tem «acento de altura» ou «acento tonal» – em inglês: pitch accent. Note-se: «Tradicionalmente, limita-se a prosódia aos estudo de três elementos, tais como o acento dinâmico (ou acento de energia, ligado à maior ou menor força com a qual o ar é expelido dos pulmões), o acento de entonação (ou acento de altura, ligado à maior ou menor frequência do som fundamental), e a duração ou quantidade, ligada à sustentação maior ou menor do fonema» (Dicionário de Linguística, de Jean Dubois).
Em montenegrino processa-se um alongamento das vogais tónicas, verificando-se uma distinção entre sílabas proeminentes e não proeminentes (para um desenvolvimento deste tema em português, aconselhamos a consulta dos vários estudos de Marina Vigário ou Sónia Frota, por exemplo). Ainda que marginalmente, e apenas com intuito de uma aproximação exemplificativa, podemos aqui associar esta alternância à existência de acentos dinâmicos secundários (como em português encontramos em palavras como alpercezinho, em que o acento primário está na penúltima sílaba, mas cuja primeira e segunda sílabas apresentam um acento secundário (mantendo a qualidade das vogais a e e).
Em conclusão, o mais sensato será não acentuar graficamente Podgorica/tsa, sabendo efetivamente que a última sílaba não é tónica.
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Fazemos aqui um agradecimento especial ao nosso consultor Luciano Eduardo Oliveira pelo interesse dedicado a esta pergunta, e indicamos aqui a página que nos recomendou sobre o tema, que está muito bem desenvolvida.