DÚVIDAS

A função sintática de tirania

Na frase de Gil Vicente «Não se embarca tirania neste batel divinal», a expressão tirania exerce a função sintática de sujeito ou complemento direto? Parece-me óbvio ser um complemento direto, mas há quem defenda que se trata do sujeito (que eu consideraria nulo indeterminado). Será que nos poderiam esclarecer?

Resposta

É possível atribuir duas análises sintáticas à frase «Não se embarca tirania neste batel divinal», uma vez que estamos perante um verbo transitivo direto que se encontra no singular, bem como a expressão nominal que se lhe segue – tirania.

Se interpretarmos o morfema se como um pronome indefinido, então o nome tirania desempenha a função sintática de complemento direto, já que o sujeito da frase é o próprio se (substituível pela expressão alguém):

a) «Alguém não embarca tirania neste batel.»

b) «Alguém não a embarca.»

c) «Não se a embarca.»

Se interpretarmos o morfema se como uma partícula passiva, então o nome tirania desempenha a função sintática de sujeito:

d) «Tirania não é embarcada neste batel.»

e) «Ela não se embarca neste batel.»

f) «Ela não é embarcada.»

Um argumento a favor desta segunda análise é o facto de podermos ter o verbo no plural, concordando com um sujeito também no plural:

g) «Não se embarcam injustiças neste batel.»

Nota: Confrontar, nas Controvérsias, os textos sobre «A função sintática de tirania: sujeito ou complemento direto?». 

ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa ISCTE-Instituto Universitário de LisboaISCTE-Instituto Universitário de Lisboa ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa