Susana Correia - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Susana Correia
Susana Correia
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Licenciada e mestranda em Linguística pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Olá! O meu nome é Inês, sou do Cacém e sou estudante do 12.º ano do curso científico-natural. A minha questão é sobre o estilo saramaguiano. Tenho de realizar um texto segundo o estilo saramaguiano e quando o meu professor nos propôs esta tarefa o meu primeiro problema foi precisamente definir o estilo saramaguiano. Gostava que pudessem "iluminar-me" um pouco sobre este assunto.

Obrigada pela vossa atenção.

Resposta:

Não é fácil responder a perguntas deste género em dois ou três parágrafos, uma vez que Saramago não é um autor linear e, para escrever ao estilo de alguém (e sobretudo ao estilo de Saramago!), é necessário ter em conta uma série de factores que são absolutamente idiossincráticos: é complicado reflectir na escrita de outra pessoa a experiência de um autor, a opinião de um autor, as marcas de um autor. Porém, dentro de um contexto de ensino, isso pode até tornar-se interessante, já que é importante dar conta das características formais e de conteúdo dos vários autores abordados.

Saramago é um escritor polémico, quer pela forma como escreve, quer pelos temas que aborda. Ele é, definitivamente, um autor "comprometido socialmente" e esse compromisso reflecte-se na sua escrita, pela crítica social e religiosa, pelos retratos da sociedade portuguesa, actual e mais remota. Por outro lado, é também um autor introspectivo, por vezes demasiado centrado na sua própria experiência, quase fragmentada e sempre dolorosa.

Quanto aos aspectos formais, Saramago é, por excelência, um narrador (conheço-lhe apenas um livro de poemas e uma peça de teatro, que remontam ao início da sua actividade literária). Ele é, portanto, um contador de histórias. Usa parágrafos longos, com poucas ou nenhumas marcas de discurso directo (poucos travessões, por exemplo), com escasso recurso à pontuação (aspecto muito contestado na obra de Saramago...) e, mais curioso e importante ainda, é frequente o narrador interagir com o narratário, comentando o que vai escrevendo. As descrições são extensas, pormenorizadas e por isso muito ricas. Pela sua «pena» é quase possível visualizar o que nos é descrito.

Para terminar é preciso ref...

Pergunta:

Peço desculpa por insistir neste tema mas acho muito difícil, principalmente para quem é do Norte, entender esta realidade da língua portuguesa: o que é e onde posso encontrar mais informação e os exemplos de dissimilação? É muito difícil, quando não se está habituado, saber a distinção uma vez que se ouve frequentemente Lesboa.

Já agora, como se pronuncia dissimilação?

Resposta:

Por dissimilação entende-se «qualquer processo [...] em que um segmento fonético perde um ou mais traços fonéticos que tinha em comum com um segmento vizinho, diferenciando-se deste» (in Dicionário de Termos Linguísticos, vol. I, Maria Helena Mira Mateus et alii).

Pode obter mais informações sobre este assunto no dicionário supramencionado, na Gramática da Língua Portuguesa (Maria Helena Mira Mateus et alii, também) ou no manual da Universidade AbertaFonética, Fonologia e Morfologia do Português (Maria Helena Mira Mateus).

Quanto a exemplos, e já que fala na variante do Norte, temos os casos de ‘bau’ por ‘vou’, de ‘mauros’ por ‘mouros’.

Para a ajudar a perceber melhor, apresento-lhe o que se chama o ‘Triângulo Acústico das Vogais’ (que encontrará, em triângulo ou em quadro, nas referências que lhe dei) e que corresponde à representação esquemática das vogais fonéticas (orais) do Português Europeu. A negrito e sublinhado está a vogal ortográfica à qual corresponde o som em itálico.

Não recuadas Recuadas
Altas i (tino) e átono/fechado (telefone) ...

Pergunta:

Coloquei aqui ontem (6 de Janeiro de 2003) uma pergunta bastante pormenorizada sobre este tema. Não esperava ver já a resposta hoje, obviamente. Porém, pensava que a pergunta apareceria em qualquer local e isso não acontece. Coloquei o meu endereço electrónico.

Em segundo lugar vejo hoje uma resposta à consulente Graça Fernandes que pergunta "Onde se colocam as questões no novo Ciberdúvidas?". Li a vossa resposta e fiquei um bocado confuso. Segui os passos e surgem-me vários anos e, dentro destes, vários meses. Temos de percorrer ano a ano e mês a mês, todas as eventuais respostas a perguntas que nem sequer sabemos à primeira vista se podem conter o tema específico que nos interessa? Mas isso requer um tempo imenso de consulta!!! Porque não haver um local que existe em tantos outros "sites" da internet (e até no SAPO) designado por "Procurar" (Search em inglês) e mandar fazer a busca?

Em resumo: necessito de procurar "Necessitar de que, ou precisar de que alguém faça isto ou aquilo", para saber se se deve escrever "Necessitar de que" ou "Necessitar que... etc." e, do modo que propõem, não se consegue fazer a pesquisa de modo produtivo e rápido. Qualquer pessoa desistirá. Sugiro que o tentem fazer, para terem uma ideia do que estou a dizer. Muito obrigado.

Resposta:

Independentemente de conseguir ou não procurar/encontrar o que pretende, aqui vai a resposta (linguística) à questão que coloca, sobre a expressão “necessitar (de) que”.

Há duas possibilidades: ou “necessitar que alguém faça alguma coisa”, ou “necessitar de alguma coisa”, isto é “necessitar que” + oração (alguém faça alguma coisa) ou “necessitar de” + sintagma nominal (alguma coisa).

No caso de expressões como “necessitar de que alguém faça isto ou aquilo”, estamos perante um fenómeno de hipercorrecção, muitas vezes resultado da “angústia do erro” que faz com que aqueles que sabem que “a pessoa que eu gosto” é a forma incorrecta de dizer “a pessoa de quem eu gosto” acabem por incorrer em excesso de zelo.

Espero tê-lo esclarecido.