Pedro Mateus - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Pedro Mateus
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Pedro Mateus, licenciado em Línguas e Literaturas Modernas, Estudos Portugueses e Franceses, pela Faculdade de Letras da Universidade Clássica de Lisboa; mestrado em Literaturas Românicas, na área de especialização Literatura Portuguesa Moderna e Contemporânea pela mesma Faculdade.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Como se diz esta hora à noite: 12h 20min?

«Cheguei em casa as 24h e 20min»?

«Cheguei em casa as ZERO HORA e 20 min»?

«Cheguei em casa a ZERO HORA e 20 min»?

Como posso dizer corretamente?

Resposta:

Em primeiro lugar, creio que convirá talvez precisar que o verbo chegar, no contexto proposto pela consulente, deverá ser preferencialmente seguido, do ponto de vista da escrita, sobretudo no português europeu (PE), pela preposição a, e não em. Contudo, mesmo no português do Brasil (PB), parece ser essa (chegar + a) a formulação aconselhada, por exemplo, pelo Dicionário Houaiss e pelo Aurélio, ainda que o corpus CETENFolha (Folha de São Paulo) nos apresente múltiplas ocorrências, em contextos compatíveis com o que nos encontramos aqui a analisar, da opção chegar + em (leia-se, a este propósito, a seguinte resposta de Luís Filipe Cunha, que me perece ser elucidativa).

No que diz respeito à pergunta propriamente dita, direi que a formulação mais correta será «Cheguei a casa à meia-noite e vinte», sendo também de aceitar, no PE, «Cheguei a casa às zero horas e 20 minutos», e, no PB, «Cheguei a casa à zero hora e 20 minutos» (Estado de São Paulo; esta resposta de Carlos Rocha).

Já a opção «Cheguei a casa às 24h e 20minutos» não será aceitável, pois parece ficar subentendido que um dia poderá ter mais que 24 horas, o que efetivamente não corresponde à realidade (leia-se, igualmente, esta esclarecedora resposta de D'Silvas Filho).

Pergunta:

Antes de mais, permitam-me felicitar o vosso trabalho.

A questão acerca de o ananás ou qualquer outro fruto ser ou não um objecto começou entre um pequeno grupo de amigos, na sequência de um jogo. A questão é que eu pareço ser a única a afirmar que os frutos podem ser considerados objectos, baseando-me na definição dum dicionário da língua portuguesa. Contudo, várias pessoas afirmam que tudo o que é vivo não pode ser considerado objecto... Fico na dúvida e sem argumentos, uma vez que a definição do dicionário parece levantar dúvidas. Podem ajudar-me?

Resposta:

Como se sabe, a problematização do conceito de objeto tem uma larga tradição, nomeadamente, por exemplo, na área da filosofia. No entanto, como certamente compreenderá a nossa consulente, não será este o local mais ajustado para levar a cabo uma reflexão de escopo tão específico e profundo.

Assim, limitar-nos-emos, como é natural, a uma abordagem linguística mais prática, isto é, sustentada nas propostas de definição do conceito proposto veiculadas pela generalidade dos dicionários de referência consultados.

Deste modo, e a avaliar pelas definições sugeridas, por exemplo, pelo Dicionário Houaiss («coisa material que pode ser percebida pelos sentidos»), pelo Grande Dicionário Universal da Língua Portuguesa da Texto Editora («Tudo o que afeta os nossos sentidos; coisa material; corpo»), pelo Priberam («Tudo o que é exterior ao espírito; coisa»), pelo AurélioTudo que é percetível por qualquer dos sentidos»), ou pelo Moderno Dicionário da Língua Portuguesa do Círculo de Leitores («Tudo aquilo que se apresenta aos nossos sentidos»), julgo que será correto considerar o ananás um objeto.

Pergunta:

É correto escrever: «O João dirigiu-se-me...»?

Resposta:

De acordo com Celso Cunha e Lindley Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, p. 309, «O pronome se associa-se a me, te, nos, vos, lhe e lhes (e nunca a o, a, os, as). Na escrita, as duas formas conservam a sua autonomia, quando antepostas ao verbo, e ligam-se por hífen, quando lhe vêm pospostas: O coração se me confrange... [...]; A aventura gorou-se-lhe aos primeiros passos.» 

Assim, e respondendo diretamente à questão apresentada pela consulente, sim, é correto escrever «O João dirigiu-se-me...». Aliás, no corpus CETEMPúblico, são várias as ocorrências em contexto desta exata formulação: «[...] um cidadão que tinha ido assistir dirigiu-se-me simpaticamente nestes termos:[...]»; «Abu Alaa, um dos principais representantes da OLP, dirigiu-se-me, sorrindo calorosamente:[...]»; «Os jovens, aparentando ter idades compreendidas entre 18 e 21 anos, rodearam-me e um deles dirigiu-se-me em bahasa indonésio».

Pergunta:

O Dicionário Priberam online apenas reconhece a grafia interruptor. Ora verifiquei, por mero acaso, que o Dicionário da Porto Editora reconhece igualmente a forma interrutor, chegando a dá-la como exemplo de dupla grafia.

Em qual dessas fontes devo acreditar?

Resposta:

De facto, o excelente e elucidativo resumo das principais alterações introduzidas pelo Acordo Ortográfico já em vigor (ILTEC, coord. professora Margarita Correia), publicado em linha no Portal da Língua Portuguesa, confirma a existência de dupla grafia para a referida palavra: «As consoantes ‹c› e ‹p› [...] podem ou não escrever-se nos casos em que existe variação (isto é, nos casos em que podem ou não ser pronunciadas), ex.: apocalíptico e apocalítico; sector e setor; caracteres e carateres; céptico e cético; dactilografia e datilografia; interruptor e interrutor (...)» (p. 35). Note-se, no entanto, que, ainda de acordo com o mesmo documento, «o número de palavras com este estatuto é muito reduzido: 184 num universo de mais de 200 000».

Valerá ainda a pena dizer que o Vocabulário Ortográfico do Português acolhe a dupla grafia da palavra em análise (interruptor/interrutor), salientando, contudo, que a mesma é válida apenas para o português europeu. Efetivamente, no português do Brasil, a oralização do ‹p› nesta palavra parece ser obrigatória, tal como se pode confirmar no Aulete Digital.

Chamo, porém, a atenção para o facto de o programa informático

Pergunta:

Gostava de perceber qual é a origem da expressão «deixa-te de rodriguinhos».

Obrigada e cumprimentos.

Resposta:

Segundo, por exemplo, os dicionários Infopédia, Priberam e Moderno Dicionário da Língua Portuguesa (Círculo de Leitores), rodriguinho significa, entre outras coisas, «[Gíria] Objecto de pouco valor; sentimentalismo barato utilizado como recurso pelo actor para fazer emocionar o público; tremelique, trejeito, frescura. (Mais usado no plural); frase feita para tudo; indivíduo excessivamente apurado no vestir; janota [...]». A Infopédia refere ainda que o vocábulo em análise é composto pelo antropónimo Rodrigo + sufixo -inho.

Entroncando, portanto, nesta linha de definição da citada palavra, surge a expressão «fazer rodriguinhos», registada também no Dicionário Priberam com o significado de «fazer intriguinhas».

Deste modo, deixa-te de rodriguinhos significará, na sua acepção mais popular, digamos assim, «deixa-te de intrigas/de conversas sem interesse nenhum».

Numa acepção um pouco mais lata, ainda que derivando sempre da linha da definição proposta, fazer algo «sem rodriguinhos» poderá igualmente significar, dependendo dos contextos, «pôr de lado tudo o que é acessório ou tudo aquilo que não interessa; sem floreados; sem dramas desnecessários; sem sentimentalismo barato». A este propósito, leia-se, por exemplo, o seguinte artigo de Eduardo Cintra Torres, intitulado justamente «Sem rodriguinhos».

Vertidas estas informações, que me parecem importantes para enquadrar o segu...