Maria Regina Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Gostaria que fosse feita a análise sintática deste poema:

O Eco

O menino pergunta ao eco
onde é que ele se esconde.
Mas o eco só responde: "Onde? Onde?"
O menino também lhe pede:
"Eco, vem passear comigo!"
Mas não sabe se o eco é amigo
ou inimigo.
Pois só lhe ouve dizer:
"Migo", "Migo".

Cecília Meireles

Resposta:

Não sei bem qual a profundidade e extensão de análise sintáctica que pretende. Vou fazer a divisão e classificação das orações. Se pretender a particularização de algum aspecto, estou ao seu dispor para qualquer esclarecimento.

1.ª oração: o menino pergunta ao eco – oração principal;
2.ª oração: onde é que ele se esconde – oração interrogativa indirecta, substantiva objectiva directa;
3.ª oração: mas o eco só responde: onde?, onde? – oração absoluta, com valor de coordenada adversativa a nível do sentido do texto;
4.ª oração: o menino também lhe pede – oração absoluta, justaposta;
5.ª oração: eco, vem passear comigo – oração absoluta;
6.ª oração: mas não sabe – oração principal, com valor de coordenada adversativa a nível do sentido do texto;
7.ª oração: se o eco é amigo ou inimigo – oração subordinada integrante, substantiva objectiva directa;
8.ª oração: pois só lhe ouve dizer: migo, migo. – oração subordinada causal (subordinada a "mas não sabe").

A concluir, deverei dizer, cara consulente, que a análise sintáctica é um exercício de natureza lógica. A linguagem poética utiliza o código linguístico de uma forma particular, criando beleza, muitas vezes, por associações, omissões, etc., que fogem à lógica linguística ou à sua norma, havendo frequentemente ligações a nível do sentido do texto, de subentendidos e pressupostos não claramente detectáveis.

Com isto pretendo dizer que, embora, por vezes, seja admissível e, até, útil, a análise sintáctica num poema, quando a interligação de ideias é muito complexa e essa análise pode contribuir para a sua clarificação e melhor compreensão, ela é de evitar na generalidade do texto poético.

Num poema simples como este, que vive essencialmente das sonoridades, criando em quem o ouve uma sensação de quase que entrad...

Pergunta:

Muitos autores assumem que todas as orações subordinadas adjetivas funcionam como adjunto adnominal.

Acredito que todas as orações subordinadas adjetivas explicativas funcionam sintaticamente como aposto explicativo; e que apenas as orações subordinadas adjetivas restritivas funcionam como adjunto adnominal; ou, quando vêm entre vírgulas, funcionam como predicativo. Estou correto?

Exemplifico na frase:

"O menino, cuja mãe é professora, foi aprovado." existe uma oração subordinada adjetiva explicativa. Ela não estaria funcionando sintaticamente como aposto explicativo, em vez de adjunto adnominal?

Outro exemplo:

O homem, mortal, age como um ser imortal. ("mortal" é adjetivo explicativo que funciona sintaticamente como aposto explicativo) O homem, que é mortal, age como um ser imortal. ("que é mortal" é oração subordinada adjetiva explicativa e também funciona como aposto explicativo).

Mas, neste exemplo:

As crianças cujos pais são carinhosos crescem mais saudáveis. (aí, sim, a frase possui uma oração. subordinada adjetiva restritiva, a qual realmente funciona como adjunto adnominal.

Por favor, esclareçam-me.

Resposta:

A sua dúvida diz respeito ao valor das orações subordinadas relativas e ocorre porque pretende analisar os aspectos sintácticos em ligação com a morfologia (cujo estrato gramatical fundamental de análise é a palavra) e a semântica (cujo estrato fundamental de análise é o texto). O estrato gramatical fundamental na análise sintáctica é a oração.

Quando pretendemos analisar o valor de determinado termo de uma frase, verificamos que por vezes ocorre mais do que um valor, pois estamos a penetrar na semântica.

Sintacticamente, estas orações introduzidas pelo pronome relativo "que" ou "cujo" são orações subordinadas relativas. Classificam-se de adjectivas, dado o facto de desempenharem a função própria do adjectivo, a função de atributo, denominação da gramática tradicional, que me parece clara.

As orações subordinadas relativas iniciadas por "que" têm sempre um valor de atributo, o valor de um adjectivo, pois caracterizam a palavra ou sintagma ao qual estão ligadas pelo relativo. Se essa oração subordinada relativa é restritiva, desempenha a função de adjunto adnominal; se é explicativa, claramente delimitada por vírgulas, assume o valor de aposto explicativo, pois foi separada da palavra à qual estava ligada (o adjunto adnominal não se separa do termo em causa).

Quanto às orações subordinadas relativas iniciadas por "cujo", há a referir que este pronome relativo é ao mesmo tempo relativo e possessivo. Refere-se a um antecedente, com a indicação de posse, significando de que, de quem, do qual, da qual, dos quais, das quais. Provém do latim cujus, forma do genitivo, tendo sempre a ideia de pertença ou possessão.

Não está correcta a afirmação de que as orações subordinadas adjectivas "quando vêm entre vírgulas" funcionem como predicativo. Não funcionam, como s...

Pergunta:

Na frase "Faz dez anos todos esses fatos.", por que o verbo foi erradamente escrito no singular?

Na frase "Alunos e professores se confraternizaram depois da festa.", por que o verbo aparece erradamente preposicionado?

Na frase "Os corintianos se animaram com a derrota do palmeiras.", por que a regência do verbo está inadequada?

"Compute todos os dias." e "Espero que ele nos ressarça até amanhã.": por que as frases estão incorretas?

Resposta:

1.ª frase: O sujeito desta frase é "todos estes factos", pelo que o predicado tem de estar no plural: "todos estes factos fazem dez anos". "Fazer dez anos" significa aqui "completar dez anos", "ter dez anos". Estaria no singular se a frase estivesse construída de outro modo: "Faz dez anos que estes factos aconteceram."

2.ª frase: O verbo confraternizar não tem forma reflexiva. A frase correcta será: "Alunos e professores confraternizaram depois da festa.". O elemento de composição "com" tem o significado de reunião, adjunção, companhia.

3.ª frase: A regência não está incorrecta. O verbo animar-se pode ser regido da preposição com. Embora seja corrente no português coloquial do Brasil a colocação proclítica do pronome se, as gramáticas normativas, neste caso, indicam a ênclise: "Os corintianos animaram-se com a derrota do palmeiras."

4.ª frase: A frase está incorrecta, porque o verbo computar é transitivo directo, pede complemento directo (objecto directo). Quer nas acepções de calcular, contar, comparar, incluir, quer na de processar em computador, este verbo exige um complemento directo, que não está presente na frase em causa. "Todos os dias" é um complemento circunstancial de tempo (adjunto adverbial). Lembro que este verbo é defectivo, não sendo conjugado nas três pessoas do singular do presente do indicativo, nem na segunda do singular do imperativo. Também se evitam, sobretudo no discurso oral, algumas das formas que se assemelham a estas, no sentido de evitar a cacofonia. É o caso da que apresenta. 5.ª frase: A frase está incorrecta, porque o verbo ressarcir é defectivo, conjugando-se apenas nas formas em que ao "c" do radical se segue a vogal "i".

Pergunta:

Muito agradecia que me confirmassem o seguinte:

«Fulano registou-se em campo...com...»
«Fulano está registado no campo...com...»

«... o registo em campo...com...» 

«... o registo no campo...com...»
Se entendermos registar como subscrever um 'site' ou determinados serviços de um 'site', que expressão deverá ser usada?

Muito obrigada!

Resposta:

Tanto poderá usar uma expressão como outra, dependendo do que referir.

Se referir o endereço, deverá usar apenas a preposição (em), sem artigo; se apenas referir o nome do sítio, deve usar a contracção da preposição com o artigo (no).

Pergunta:

Eu sou um mero consulente cujos interesses pela própria língua são enormíssimos. Os sufixos -íssimo e -érrimo têm exactamente o mesmo significado? Tenho-os utilizado no sentido de: muito para -íssimo, como belíssimo = muito belo, e extremamente para -érrimo, como sujérrimo = extremamente sujo, mas infelizmente esta última forma raramente se encontra nas gramáticas. Qual é o termo correcto? Muito obrigado.

Resposta:

Os sufixos -íssimo e -érrimo têm exactamente o mesmo significado, servindo para formar o superlativo absoluto sintético dos adjectivos.

A sua utilização não é arbitrária. O sufixo -íssimo é o mais vulgar, e o sufixo -érrimo surge apenas na formação do superlativo de adjectivos que em latim pertenciam à 2.ª classe, terminando o nominativo em -er, a saber:

   acer, acris > acre – acérrimo;
   asper, asperis > áspero – aspérrimo;
   celeber, celebris > célebre – celebérrimo;
   celer, celeris > célere – celérrimo;
   integer, integris > íntegro – integérrimo;
   liber, liberis > livre – libérrimo;
   macer, macris > magro – macérrimo;
   miser, miseris > mísero – misérrimo;
   niger, nigris > negro – nigérrimo;
   pauper, pauperis > pobre – paupérrimo;
   saluber, salubris > salubre – salubérrimo;
   uber, uberis > úbere – ubérrimo.

Alguns destes adjectivos têm simultaneamente a forma do superlativo com base no termo latino e outra formada do adjectivo com o sufixo -íssimo: magro, macérrimo e magríssimo; negro, nigérrimo e negríssimo; pobre,...