Luís Filipe Cunha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Luís Filipe Cunha
Luís Filipe Cunha
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Doutorado em linguística; investigador do Centro de Linguística da Universidade do Porto.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

A palavra quase é considerada um advérbio de modo e de intensidade. No entanto, na frase «Ele está quase a chegar», não poderá exprimir também uma ideia de tempo? Gostaria que me dessem exemplos de frases para cada um dos casos (quase como advérbio de modo e como advérbio de intensidade), pois tenho alguma dificuldade em arranjar exemplos claros que possam ser bem compreendidos pelos meus alunos.

Resposta:

A palavra quase pode, de fa{#c|}to, assumir valores muito diversificados em português. Assim, pode veicular informação eminentemente temporal em exemplos como «Ele está quase a chegar» ou «O espectáculo está quase a começar». Nestes casos, quase exprime a iminência ou a grande proximidade temporal da situação descrita e poderá ser parafraseado por «a ponto de». Ou seja, «Ele está quase a chegar» (no sentido de «ele está a ponto de chegar») exprime a ideia da proximidade da efectivação da chegada.

Um exemplo como «O João quase arrumou o quarto» pode receber uma interpretação temporal semelhante, quando significa que «O João esteve a ponto de arrumar o quarto», mas, por qualquer razão, não chegou a iniciar essa a{#c|}tividade. No entanto, se deslocarmos o advérbio quase para uma posição pós-verbal, obteremos uma leitura bastante diferente. Assim, uma frase como «O João arrumou quase o quarto» significará que, efe{#c|}tivamente, o João iniciou a arrumação, mas, por qualquer razão, não chegou a concluí-la (por exemplo, foi interrompido antes de colocar os livros na estante). Em casos como estes, quase recebe normalmente paráfrases do g{#é|ê}nero de «não completamente» ou «de forma incompleta». A frase em análise será equivalente a «O João arrumou o quarto de forma incompleta», o que remete, sob um certo ponto de vista, para a maneira como o João arrumou o quarto. Interpretações como esta levam algumas gramáticas a considerar quase um advérbio de modo, na medida em que exprime a maneira como uma determinada situação é realizada. Um outro exemplo em que quase assume igualmente este valor poderá ser «O Guilherme comeu quase a sopa toda» na interpretação em que o Guilherme comeu efe{#c|}tivamente a sopa, mas de forma incompleta.

Finalmente, quase poderá assumir um valor "intensivo" quan...

Pergunta:

Qual o termo correcto para a acção contrária a activar algo? Inactivar, ou desactivar? Ou ambos?

Obrigada.

Resposta:

Nos dicionários consultados (Porto Editora, Lexilello e Verbo — Dicionário da Academia das Ciências) figura apenas a forma desactivar como significando a operação contrária a «activar» ou «cessar, suprimir ou anular a actividade de». A forma "inactivar" não se encontra, tanto quanto pudemos apurar, dicionarizada.

Existem, de resto, razões de ordem linguística que levam a considerar que a forma correcta é, de facto, desactivar, tal como atestado nos dicionários consultados.

Na verdade, o prefixo des- surge consistentemente associado a verbos significando «separação; acção contrária» (cf. Cunha e Cintra, 1991: p. 87). Assim, temos exemplos como ordenar («pôr numa dada ordem») vs. desordenar («retirar de uma dada ordem»); ligar («pôr em funcionamento») vs. desligar («parar o funcionamento»), entre muitos outros possíveis.

O prefixo in-, pelo contrário, significa simplesmente «negação» (cf. idem). Assim, temos exemplos como justo vs. injusto (= «não-justo») ou culto vs. inculto (= «não-culto»). Nesse sentido, a ser aceitável, uma forma como "inactivar" corresponderia a «não activar» e não à acção contrária de activar.

Um outro aspecto a ter em conta é que o...