José Mário Costa - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
José Mário Costa
José Mário Costa
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Jornalista português, cofundador (com João Carreira Bom) e responsável editorial do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa. Autor do programa televisivo Cuidado com a Língua!, cuja primeira série se encontra recolhida em livro, em colaboração com a professora Maria Regina Rocha. Ver mais aquiaqui e aqui.

 
Textos publicados pelo autor
E que tal menos desleixo e mais brio profissional?

O jornal i e o semanário Sol passaram a seguir as novas regras ortográficas em vigor oficialmente em Portugal, terminado que foi o período de transição, tal como no Brasil. Não se pode dizer é que, pelo menos no primeiro caso, a opção tenha sido minimamente ponderada. (...)

Pergunta:

Considere-se um fragmento de discurso em que um indivíduo está a falar. Naturalmente, o discurso é iniciado com um travessão. O discurso do indivíduo prolonga-se por um parágrafo inteiro. No parágrafo seguinte, o mesmo indivíduo continua a falar. Que tipo de sinalização devemos utilizar para continuar o discurso no segundo parágrafo? Repete-se o uso do travessão? Ou empregamos outro sinal? Tenho visto que a continuação do discurso de um mesmo indivíduo num segundo parágrafo é sinalizada por ">>". É correcto empregar esta sinalização?

Obrigado.

Resposta:

O uso do travessão na transcrição do discurso é uma opção (facultativa) de estilo. Há autores e publicações, jornais, por exemplo, que preferem as aspas – sejam aspas em linha [« »] ou aspas elevadas [" "]. E há outros que preferem, até, o recurso ao itálico1. E há ainda outros, como José Saramago, que pura e simplesmente dispensam qualquer dessas marcas tradicionais na sinalização do discurso direto.

No caso da utilização do travessão, classicamente, não há parágrafos, e a reprodução dos diálogos ou monólogos raramente ultrapassa a dúzia de linhas.

Se, por qualquer razão excecional, a reprodução tiver de ser especialmente extensa e com parágrafos, há duas opções possíveis:

1) O uso do itálico (com a vantagem de uma diferenciação mais clara do que é discurso direto em relação ao restante texto); ou

2) O recurso às aspas – tal como se sugere na resposta anterior "Discurso directo com mais de um parágrafo". Exemplificando, neste caso:

«Citação citação citação citação citação citação citação citação citação citação citação citação citação citação citação citação. citação citação citação

...

Pergunta:

Gostaria de saber se, no caso de uma jogadora de futebol que joga no meio-campo, é mais correto dizer-se que se trata de uma "médio" ou de uma "média". Leio escrito de ambas as formas, por isso tenho optado por... "centrocampista".

Resposta:

Recomendamos que o feminino de médio (médio-centro) seja média (que pressupõe média-centro), pelas razões a seguir expostas.

Médio-centro (ver dicionário da Porto Editora, na Infopédia) tem como sinónimo médio, palavra que faz parte da terminologia futebolística usada em Portugal. O termo médio é também usado no Brasil, segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, como redução de médio-volante, que tem significado igual a médio-centro.

No dicionário brasileiro, médio, no contexto do futebol, é um substantivo usado nos dois géneros (é um substantivo comum de dois géneros): nesta perspetiva, diz-se e escreve-se «o médio», se nos referimos a um jogador, e «a médio», se se trata de uma jogadora, portanto, sem alteração da forma da palavra. Contudo, em dicionários portugueses que registam médio na aceção em referência (por exemp...

Pergunta:

Sendo a expressão n.º uma palavra abreviada, significando que alguma coisa foi retirada, no caso, o ponto a seguir ao n significa que foram retiradas as letras úmero, e servindo o º superior de indicação do género (masculino), significando que foram retiradas as letras intermédias úmer, parece que não faz sentido, nem é correcto, que a seguir à expressão completa, n.º, se possa escrever, sem espaço, qualquer número cardinal, ou seja, "n.º1", sendo o 1 outra palavra, apesar de ser um símbolo matemático. Se se escrever "n.º1", parece que, querendo-se escrever outros cardinais, por exemplo, 2, 3, 4, etc., estes não são escritos sem espaço: "n.º1,2,3,4". O mesmo reparo deve ser feito quando se abrevia a palavra artigo, para art.º, à qual não se deve seguir o n.º do mesmo: "art.º1.º", pois também aqui o 1.º é uma palavra abreviada, que deve ser escrita com separação da anterior, mesmo que abreviada. Já agora, saliento ainda ser vulgar ver escritos em parêntesis com um espaço a seguir ao primeiro símbolo, ou, até, com espaços entre os símbolos, por exemplo, ( masculino) ou ( masculino ).

Resposta:

Tem toda a razão no que aponta, no seguimento do que várias vezes foi aqui esclarecido, sobre o tema das abreviaturas e a sua diferença com a grafia dos símbolos em geral. Em síntese:

1) Em toda e qualquer abreviatura (de palavras ou numerais) é obrigatória a inserção do ponto, com sinal de que se trata de uma redução de letras. Por isso, escreve-se n.º (o traço é uma opção de natureza gráfica), e não , como se generalizou em vários meios.

2) Se abreviação for seguida de outra(s), deve haver espaço: art.º 1.º (ou art.º 1).

3) Sem espaço, porém, o que ficar entre parêntesis, como se pôs em cima.

4) A terminação o ou a, em sentido expoente, usa-se consoante a palavra abreviada for masculina ou feminina. Por exemplo: «1.º classificado», mas «1.ª classificada».

 

[Cf., ainda, Textos Relacionados, ao lado.]

A culpa, depois, ainda é do Acordo Ortográfico...

«(...) Não se tratam de imagens "cliché ou icónicas, mas uma mulher que sofreu o choque de saber o seu destino e as dores do parto" (...)»

É uma incorreção antiga e continuada na imprensa portuguesa este (mau) uso no plural do verbo tratar, conjugado pronominalmente. Dos tais erros que, pela sua repetição, teimosa e desleixada, são bem ilustrativos de como (des)anda hoje o domínio do idioma nacional no jornalismo português*. Muito, mas mesmo muito, para além do Acordo Ortográfico, e da sua incompetente aplicação, como se continua a apregoar por aí.