Eunice Marta - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Eunice Marta
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Licenciada em Filologia Românica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e mestre (Mestrado Interdisciplinar em Estudos Portugueses) pela Universidade Aberta. Professora de Português e de Francês. Coautora do Programa de Literaturas de Língua Portuguesa, para o 12.º ano de escolaridade em Portugal. Ex-consultora do Ciberdúvidas e, atualmente, docente do Instituto Piaget de Benguela, em Angola.

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Qual é a origem o o significado da expressão «a vingança do chinês»?

Resposta:

Não encontrámos nenhuma informação sobre a origem dessa expressão, cujo significado — «vingança prometida e requintada» (Orlando Neves, Dicionário de Expressões Correntes, Lisboa, Editorial Notícias, 1998, p. 372) — se distingue do de uma outra relativa a vingança, «vingança do artista», que designa «vingança não premeditada, ocasional; pequena vingança» (idem).

Pergunta:

Em Portugal se diz Irão para o que nós, no Brasil, dizemos Irã. A diferença é pouca, mas gostaria de saber o porquê desta diferença de usos.

Resposta:

De facto, mantêm-se distintas as grafias desse país árabe, como variantes de Portugal (Irão, «forma corrente em Portugal») e do Brasil (Irã, «forma corrente no Brasil»), grafias essas que se encontram registadas no anterior Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (Coimbra, Coimbra Editora, 1966), de Rebelo Gonçalves.

Não houve, portanto, alterações com a aplicação do Acordo Ortográfico de 19901, uma vez que a forma Irão é a que se encontra contemplada no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, da Porto Editora, assim como no Dicionário de Gentílicos e Topónimos, da responsabilidade do ILTEC — cujos habitantes e/ou residentes (gentílicos) são designados iranianos ou irânicos.

Por sua vez, Irã (Dicionário Houaiss da Lí...

Pergunta:

Qual a forma correta do seguinte provérbio: «De cavalo dado não se olha os dentes», ou «De cavalo dado não se olham os dentes»?

No Guia dos Curiosos: Língua Portuguesa (Marcelo Duarte, São Paulo: Ed. Panda, 2003), o autor escreve no título do texto «não se olham», mas no interior do mesmo escreve «não se deve olhar seus dentes».

Resposta:

Várias são as formas como esse provérbio se encontra registado na bibliografia específica sobre provérbios e locuções, expressões correntes/idiomáticas ou populares, o que é atestado por algumas destas obras:

– «A cavalo dado não se olha o (ao) dente», com as variantes «A cavalo dado não olhes o(s) dente(s)1», a par de «A cavalo (que é) dado não se abre a boca» e «A cavalo dado não se olha a muda» (José Pedro Machado, O Grande Livro dos Provérbios, Lisboa, Editorial Notícias, 2005, p. 25);

– «A cavalo dado não se olha o dente» (José Ricardo Marques da Costa, O Livro dos Provérbios Portugueses, Lisboa, Editorial Presença, 2004, p. 22; Emanuel de Moura Correia e Persília de Melim Teixeira, Dicionário Prático de Locuções e Expressões Correntes, Porto, Papiro Editora, 2007, p. 121);

– «A cavalo dado não se olha ao dente» (Gabriela Funk e Mattias Funk, Dicionário Prático de Provérbios Portugueses, Lisboa, Cosmos, 2008, p. 30; Maria Ribeiro, Provérbios e Adágios Populares, Lisboa, Planeta Editora, 2003, p. 13; Maria Alice Moreira Santos, Dicionário de Provérbios, Adágios, Ditados, Máximas, Aforismos e Frases Feitas, Porto, Porto Editora, 2000, p. 23; António Moreira, Provérbios Portugueses, Lisboa, Editorial Notícias, 1996, p. 14; José Alves Reis, Provérbios e Ditos Populares, Porto, Litexa Editora, 1996, p. 8);

– «A cavalo dado não se olha a dente» [a par de «A cavalo dado não se abre a boca» e «A cavalo dado não se olha a muda»] (Deolinda Milhano, Dicionário de Ditados (Provérbios) e Frases Feitas, Lisboa, Colibri, 2008, p. 18).

1 José Pedro Machado, em O Grande Livro dos Provérbios, re...

Pergunta:

Gostava de saber qual a origem da expressão «quando o rei faz anos». Se fosse possível, gostava ainda de saber o seu sentido, uma vez que não tenho a certeza se quer dizer «muito raramente» ou «nunca».

Resposta:

Não encontrámos nenhuma informação sobre a origem da expressão «quando o rei faz anos» na bibliografia específica sobre a origem das expressões idiomáticas e correntes.

No entanto, a frase/expressão «quando o rei faz anos» encontra-se registada em vários dicionários específicos desse tipo de expressões, como locução/expressão usada para designar «muito raramente» (Orlando Neves, Dicionário de Expressões Correntes, Lisboa, Ed. Notícias, 1998, p. 308; Orlando Neves, Dicionário de Frases Feitas, Porto, Lello & Irmão, 1991, p. 309), «espaçadamente; de vez em quando» (Guilherme Augusto Simões, Dicionário de Expressões Populares Portuguesas, Lisboa, Perspetivas e Realidades, 1984, p. 348), «em raras ocasiões» (António Nogueira Santos, Novos Dicionários de Expressões Idiomáticas, Lisboa, Ed. Sá da Costa, 1990, p. 21).

Pergunta:

«A escassez de leite e outros bens essenciais era razão de ordem naquele tempo.» A expressão «razão de ordem» existe? O que significa? Está bem aplicada nesta frase? Obrigada.

Resposta:

«Razão de ordem» (política, económica, religiosa, jurídica, cultural, pessoal, profissional, etc.) é uma estrutura legítima, se a «razão de ordem» se seguir o tipo de ordem a que se refere (tal como se pode verificar pelos exemplos entre parêntesis), uma vez que designa «motivo de caráter/cariz/natureza». Sem a indicação do tipo de ordem/caráter/cariz/natureza/teor, a estrutura fica incompleta. Por exemplo:

«O João evocou razão/razões de ordem familiar para não aceitar o cargo.»

Tendo em conta o contexto da frase que nos apresenta — «A escassez do leite e outros bens essenciais era razão [...] naquele tempo» —, parece-nos que a expressão «razão de monta» seria a adequada, uma vez que é a que se encontra registada com o sentido com de «aquela que pesa, que convence, que faz pensar» (Guilherme Augusto Simões, Dicionário de Expressões Populares Portuguesas, Lisboa, Perspetivas e Realidades, 1984, p. 357).