Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Gostaria de saber se podemos utilizar o termo "telia", para nos referirmos à função. Desdobrando o termo autotelia, obtemos os termos "auto" + "telia"; este último diz respeito à função de qualquer coisa (suponho). Será portanto correcto dizermos, sobre um determinado assunto, que qualquer coisa tem uma determinada "telia"? Se sim, devemos usar aspas no termo?

Muito obrigado pela vossa resposta.

Resposta:

Segundo o Dicionário Houaiss, autotelia signifca «propriedade de quem determina por si mesmo a finalidade dos próprios atos». Contudo, como palavra autónoma, não encontro dicionarizado o termo "telia", formado pelo antepositivo telo-, do grego télos,eos-ous, «fim, resultado, conclusão», e -ia, sufixo também de origem grega usado na formação de substantivos. A verificar-se a ocorrência de "telia", suponho que tenha uso especializado, pelo que deve assinalar-se como neologismo no começo de certo tipo de textos. Assim, no contexto de uma monografia, um ensaio ou um artigo científico, depois de devidamente justificado, o termo poderá ser usado sem aspas.

Pergunta:

Recentemente estive num projecto onde traduzi a palavra inglesa «master data» para português como «dados mestres», por analogia com «hora extra»/«horas extras». No entanto, alguns colegas afirmaram que o correcto seria "dados mestre".

Agradecia que me esclarecessem sobre a forma mais correcta.

Obrigado.

Resposta:

O Dicionário Verbo de Inglês Técnico e Científico (1994) regista master data, traduzindo-a por «dados principais», ou seja, com a palavra principal no plural, como é de esperar de um adjectivo que concorda com o substantivo que qualifica. Do mesmo modo, se a intenção é recorrer à palavra mestre, que é substantivo e que, como adjectivo, tem os significados genéricos de «principal» e «que serve de guia», a regra é a mesma: porque é um adjectivo, concorda com o substantivo que acompanha. Por conseguinte, considero que se deve dizer «dados mestres».

Pergunta:

Gostaria de saber se existe o plural de metrô.

Resposta:

Existe: metrôs. Em Portugal, diz-se metro, cujo plural é, naturalmente, metros.

Pergunta:

Gostaria de saber quando o prefixo des- significa ação contrária e quando ele é uma negação.

Ex.: desarrumado, desumano, desfazer, etc.

Resposta:

O prefixo des- tem geralmente valor negativo quando associado a adjectivos (Maria Helena Mira Mateus, Gramática da Língua Portuguesa, Lisboa, Editorial Caminho, 2003, pág. 965):

desarrumado = não arrumado

desumano = não humano

E tem valor de oposição quando se liga a verbos (ibidem):

desfazerfazer

desenterrarenterrar

Tal não obsta que des- surja associado a bases adjectivais e verbais praticamente com o mesmo valor, como refere o Dicionário Houaiss:

«[exprime] aumento, reforço, intensidade: desafastar, desaliviar, desapartar, desferir, desinfeliz, desinquieto».

Pergunta:

Antes de mais, gostaria de dar os parabéns a toda a equipa do Ciberdúvidas, pelo trabalho rigoroso que nos tem vindo a demonstrar.

A minha questão é a seguinte: na seguinte frase — «Os vinhos brancos apresentam habitualmente aromas frutados e um teor alcoolémico» —, a palavra "alcoolémico"/"alcoolémica" está correcta?

Deparei-me com o facto de não aparecer em nenhum dos dicionários que consultei, o que me instigou certas dúvidas.

Os melhores agradecimentos.

Resposta:

Agradeço, em nome da equipa do Ciberdúvidas, as suas palavras de apreço.

A palavra existe (cf. Dicionário Houaiss), mas o seu uso não está correcto. Alcoolémico significa «relativo a alcoolemia» e «portador de alcoolemia; em estado de alcoolemia» (ibidem). Por sua vez, alcoolemia quer dizer «presença de álcool no sangue». Por conseguinte, seria absurdo que vinhos brancos tivessem, eles próprios, um teor alcoolémico. O que se pretende referir na frase em causa não é, portanto, o teor de álcool que os vinhos brancos tenham no sangue (que não podem ter), mas simplesmente o «teor de álcool» ou «teor alcoólico» que eles apresentam. Por último, convém completar a expressão «um teor de álcool»: «um baixo/elevado/importante teor de álcool.»