Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Pode colocar-se ponto antes de «ou seja»?

Assim: «A consciência de uma mudança ocorre depois da mudança estar assimilada. Ou seja, é no futuro...»

Obrigada.

Resposta:

É possível, mas não se recomenda como prática sistemática, porque a locução «ou seja» tem por função esclarecer o sentido de um constituinte que, normalmente, já ocorreu antes na mesma frase.

Pergunta:

Há uns dias vi a palavra "entregáveis". Percebe-se que foi traduzida à letra do inglês "deliverable". É aceitável? Qual a melhor opção, neste caso?

Resposta:

A palavra entregável está bem formada e encontra-se dicionarizada, por exemplo, no Aulete Digital.

Já quanto a ser tradução adequada de deliverable, tudo depende do contexto, visto que apalavra inglesa pode ser usada como substantivo no sentido de «produto que uma companhia promete ter pronto para um cliente» (cf. Oxford Advanced Learner´s Dictionary). A partir desta acepção, a palavra deliverable pode ser aplicada, por extensão semântica, a outras realidades e situações, como se verifica no Linguee, onde ocorre traduzida como comunicação, prestação (no sentido de desempenho), resultado, resultado tangível, produto final.

Pergunta:

Relativamente à patologia diabetes mellitus:

1. Escreve-se com letra minúscula, ou maiúscula? Exemplos: «Diabetes mellitus» ou «diabetes mellitus»?

2. Deve escrever-se a expressão em itálico?

3. E quando se caracteriza melhor a patologia, como se escreve: «diabetes mellitus insulino-tratada», ou «diabetes mellitus insulinotratada»? E: «diabetes mellitus não-insulinotratada», ou «diabetes mellitus não insulinotratada»?

Resposta:

Não encontro normas específicas para o caso em apreço. O que verifico nos dicionários especializados (cf. Manuel Freitas e Costa, Dicionário de Termos Médicos, Lisboa Porto Editora, 2005; L. Mauila et al. Dicionário Médico, Lisboa, Climepsi Editores, 2004) é que o nome latino mellitus se usa como adjectivo modificador da palavra portuguesa diabetes, sendo ambas as palavras usadas com minúscula inicial («diabetes "mellitus"») e ocorrendo a palavra latina entre aspas (o itálico também possível: «diabetes mellitus»).1

Quanto à ortografia do termo referido no terceiro ponto da pergunta, é correcta a forma aglutinada, insulinotratada, sem hífen, por estar conforme com outras palavras não hifenizadas em que também surge insulino- como elemento de composição: insulinodependência, insulinorresistência, insulinoterapia, insulinoterápico (cf. Dicionário Houaiss). Finalmente, em relação ao uso de não antes de insulinotratada, pode usar hífen, mas não é obrigatório: não insulinotratada/não-insulinotratada.

1 É controverso o género a atribuir a diabetes, conforme se pode ler na resposta A diabetes ou o diabetes. O Dicionário Houaiss indica que é palavra dos dois géneros e dos dois números. O dicionário da Academia das Ciências Lisboa regista -...

Pergunta:

Gostaria de que me ajudassem a superar uma dúvida que me há assaltado ultimamente. Muitas vezes oiço usuários da língua portuguesa que, ao usar o verbo esperar na oração principal, empregam na oração subordinada o modo indicativo correspondente ao verbo escolhido, verbi gratia: «Espero que será...»

Isto não constitui uma incorrecção? Não devem usar o modo conjuntivo? Se eu estiver equivocado, qual a razão para optar pelo modo indicativo?

Infinitamente agradecido.

Resposta:

O verbo esperar selecciona orações completivas com verbo no conjuntivo. No entanto, coloquialmente, é também possível encontrar frases — de carácter marginal na perspectiva da norma — em que ocorre o futuro simples (também chamado futuro do presente), dado o seu carácter modal.

Pergunta:

Tenho uma dúvida na tradução de nerd para totó, que já vi traduzido em más traduções televisivas. Um totó pode não ser um nerd, por exemplo.

Porque não usar nerde (ou outra alternativa) como no caso de blog que deu lugar a blogue, ou mesmo como ocorreu com o caso de pulôver?

Tomei por base as seguintes definições que podem omitir na eventual resposta online:

Nerd:

inglesa

portuguesa

Tomando a versão inglesa como a que terá mais sentido seguir, pois o termo é inglês.

Totó:

Priberam.

Resposta:

É sempre possível aportuguesar fónica e ortograficamente um estrangeirismo, pelo que "nerde" se perfila como um aportuguesamento adequado. Sucede, contudo, que essa forma ainda não se popularizou — e, nos dicionários que acolhem a palavra, ainda se mantém a grafia inglesa, nerd (cf. Aulete Digital).

Quanto à escolha de vocábulos portugueses equivalentes, as opções não se resumem a totó (palavra usada em português europeu), sendo de resto difícil encontrar uma palavra que consiga abranger todas acepções em que nerd é usado. Existe, por exemplo, maníaco (cf. Linguee), mas o Dicionário de Inglês-Português apresenta um leque de palavras que, consoante o contexto, podem apresentar-se como boas candidatas à tradução de nerd:

1. coloquial, depreciativo totó, palerminha, lorpa, banana fig. 2. coloquial, depreciativo pobre coitado 3. coloquial, depreciativo parolo, pacóvio 4. coloquial, depreciativo parvo 5. coloquial, (tecnologia) obcecado; depreciativo computer nerd fanático dos computadores.