Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

É correto dizer «muita menos gente», ou «muito menos gente»?

Obrigado.

Resposta:

A forma correta é «muito menos», mesmo quando menos acompanha um substantivo. Na língua falada, é possível ouvir "muita" em lugar de muito, sobretudo quando o advérbio modifica adjetivos: «uma praia "muita" grande». É um uso que a norma não aceita.

Pergunta:

Gostaria de saber se existe alguma regra específica para citações bíblicas no meio de um texto. Ex.: «Quantos de nós nos revemos neste episódio: "E logo Jesus, estendendo a mão, segurou-o, e disse-lhe: Homem de pouca fé, por que duvidaste?" (Mateus 14:31)», ou «Quantos de nós nos revemos neste episódio: "E logo Jesus, estendendo a mão, segurou-o, e disse-lhe: Homem de pouca fé, por que duvidaste?" , Mateus 14:31». Coloco o livro, capítulo e versículo entre parênteses, ou não? Grato pela vossa ajuda.

Resposta:

Não conheço regras estritas sobre o uso de parênteses no caso que apresenta. Os parênteses podem usar-se ou não – o que importa é manter o mesmo critério ao longo de um trabalho (artigo ou monografia).

Por exemplo, verifico que na obra de Bento XVI Jesus de Nazaré (Lisboa, A Esfera dos Livros, 2007) se usam parênteses com as referências do livro, do capítulo e do(s) versículo(s) donde a citação provém; p. ex. (idem, p. 222; Mt = «Evangelho de São Mateus», 9 = «capítulo 9», 38= «versículo 38»):

«É daqui que se deve partir para compreender a palavra de Jesus: "Rogai ao Senhor da messe que envie trabalhadores para a sua messe" (Mt 9, 38).»

Mas não encontro fonte na qual se considere condenável apresentar a citação assim:

«É daqui que se deve partir para compreender a palavra de Jesus: "Rogai ao Senhor da messe que envie trabalhadores para a sua messe" Mt 9, 38.»

Repito: deve-se sempre definir um critério e aplicá-lo com coerência a todas as citações feitas ao longo do mesmo trabalho.

Cf. As línguas da Bíblia

Pergunta:

Gostaria de saber, se possível for, o significado do nome próprio personativo Antóvila ou, ao menos, uma aproximação possível. Confesso-lhes que, em minhas pesquisas, não tenho obtido muito sucesso.

Resposta:

Nem nós conseguimos apurar nada de conclusivo sobre o nome próprio em questão.

O nome é de facto usado no Brasil, mas parece completamente desconhecido nos outros países de língua portuguesa. Somos levados a crer que o nome tenha surgido por amálgama – talvez de António e de parte de um nome não identificável acabado em -ila (Átila?).

Pergunta:

Podemos separar biblioteca assim?

Bibli-

oteca.

E ansioso assim?

Ansi-

oso.

Resposta:

Teoricamente pode-se, desde que a sequência que passa à linha seguinte não se resuma a uma vogal; p. ex., não se deve separar água assim:

á-

gua.

Nem se deve separar história desta maneira:

históri-

a.

No caso de biblioteca e ansioso parecem possíveis:

bibli-

oteca,

ansi-

oso.

No entanto, dado que foneticamente os encontros vocálicos das sequências -blio- de biblioteca e -sio- de ansioso podem ser pronunciados como ditongos crescentes – respetivamente, iu (ou io na varidedade brasileira) e io –, é de recomendar que não se separem essas vogais.

Pergunta:

Em nosso idioma, é comum tratar um homem, ou a ele se referir, pelo seu sobrenome e não pelo prenome. Deste modo, podemos dizer, por exemplo: «O Meneses comprou o carro que tanto queria.»

Observo, entretanto, que o mesmo não acontece em relação às mulheres, de modo que soaria estranho referir-se a uma mulher dizendo algo como isto: «A Brandão passou no vestibular.»

Sei que às vezes se diz em relação a um casal, por exemplo, «senhor e senhora Ribeiro de Sá», sendo ambos os sobrenomes do marido. Mas, se se tratar de mulher solteira, seria correto interpelá-la, ou a ela se referir, pelo seu sobrenome: «Carvalho, vem passear conosco»?

A minha dúvida a respeito do tema aqui ventilado se acendeu porque tenho ouvido algumas pessoas aqui no Brasil, em casos raros, interpelar mulheres, ou a elas se referir, pelos seus sobrenomes.

Por favor, a sempre confiável sentença do Ciberdúvidas. Muito obrigado.

Resposta:

O uso que observa parece recente ou é provavelmente o resultado pontual de quem pretende provocar (de forma inócua ou maldosa) a pessoa visada.

De facto, na língua portuguesa não se emprega geralmente o apelido/sobrenome para referir ou interpelar um indivíduo do sexo feminino. O uso que está enraizado é usar os vocábulos dona (abreviatura D. ou d.), doutora (abreviaturas Dr. ou dr.) seguidos do nome próprio (primeiro nome) da mulher que é assim referida ou interpelada:

(i) «Bom dia, D./Dra. Amélia.»

Certas obras registam o uso de menina em Portugal ou senhorita no Brasil como título a atribuir a mulheres jovens e solteiras (cf. Celso Cunha e Lindley Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, Lisboa, edições João Sá da Costa, 1984, pág. 294). A reaidade é que ambas as formas estão hoje em desuso, mas, a ocorrerem, associam-se preferencialmente ao nome próprio.

Observe-se, no entanto, que, pelo menos em Portugal, a comunicação social tem usado senhora com apelidos/sobrenomes para referir mulheres que ocupam o cargo de primeiro-ministro:

(ii) «a Sra. Merkel» (ou «a sra. Merkel)

(iii) «a Sra. Thatcher» (ou «a sra. Thatcher»)

Trata-se de um uso controverso, tradução literal dos títulos Frau, em alemão, e Mrs. (Mistress), em inglês. Tem também por vezes certo tom irónico, que muitos jornalistas evitam usando o nome próprio das figuras em referência:

(iv) Angela Merkel, Margaret Thatcher

Já em relação a um homem, formalm...