Pergunta:
Tendo analisado várias obras de referência (Mateus na sua Gramática de 2003 e Barbosa em Études de phonologie portugaise, entre outras), às quais pude ter acesso, verifica-se o abaixamento de [e] e [ej] resultando em [ɐ(j)] antes de consoantes palatais [ɲ, ʎ, j, ʒ, ʃ], surgiu-me a seguinte dúvida:
Esta transformação também se aplica ao verbo mexer, conjugado na 1.ª pessoa do singular, i.e. «eu mexo» [ˈmɐ(j)ʃu], quase igualando-se, a «o fecho», [ˈfɐ(j)ʃu]) e ocorrendo na elocução rápida dos verbos como descer, crescer e derivados (i.e. 'eu desço' [dɐ(j)?ʃsu] coincidindo com 'eu deixo') e, além destas, na palavra 'mesmo' onde o /e/ fechado também está em contacto com o [ʒ]? (Embora este último esteja transcrito [ˈmeʒmu] nos Dicionários da Porto Editora).
Tenho de vos confessar que, apesar de ter recorrido a outras ferramentas de consulta tais como 'wordreference' ou 'forvo', infelizmente não pude tirar uma conclusão definitiva. Se fosse este o caso duma possível variação fonética no português europeu, em que medida é aceitável na norma-padrão?
Muito obrigado pela atenção dispensada.
Resposta:
Nos dois primeiros casos em questão – mexo e fecho –, há de facto a tendência para o abaixamento de /e/, que se torna [ɐ] ou até se ditonga como [ɐj]. No entanto, há muitos falantes que mantêm [e] em mexo e pronunciam [e] em fecho, quando é nome, e [ɛ], quando é fecho, forma do verbo fechar.
Há, portanto, grande oscilação na prática, muito embora, do ponto de vista normativo, se favoreçam as pronúncias [e] e [ɛ].
Quanto a mesmo e desço, a situação é diferente porque /e/ é sempre [e] (pelo menos, na perspetiva dos usos da capital, Lisboa). Não sabemos de explicação clara para que assim seja, mas é importante assinalar que desde é [deʒdɨ] e desço é também pronunciado [deʃsu], ou seja, sem ditongação de /e/, apesar de /s/ travar sílaba (coda) e ser produzido como uma pré-palatal – sonora [ʒ] ou surda [ʃ].