Pergunta:
Peço que os consultores do Ciberdúvidas voltem a pronunciar-se sobre a concordância do verbo ser com nomes predicativos no plural, apesar de o sujeito ser singular. As respostas já existentes são poucas, e algumas delas geram dúvidas. É importante sublinhar este aspecto porque a concordância com o nome predicativo se afasta da regra geral e, por isso, suscita alguma renitência dos falantes (em rigor, dos escreventes, porque a expressão oral mais facilmente segue as intuições). Além disso, como o inglês e o francês, em estruturas semelhantes, fazem a concordância com o singular do sujeito, agrava-se a tendência para escrever da mesma maneira em português. Nalguns jornais portugueses, chega a acontecer que os autores dos texto utilizem correctamente o verbo no plural, a concordar com o nome predicativo, e os revisores mudem o verbo para o singular. Assim, é preciso sublinhar que as seguintes expressões são gramaticalmente correctas – e intuitivas – e que seriam incorrectas se o verbo surgisse no singular:
- O que ela levou foram as romãs.
- Se a política se tivesse mantido, esta turma seriam 25 alunos.
- Muitas vezes, o problema das crianças são os maus exemplos dos pais.
- A chave do Totoloto foram os seguintes números.
- Uma vez não são vezes.
- Nesse tempo, a população de Portugal eram dois milhões de pessoas.
- O direito são as regras que os tribunais aplicam.
- O alvo deles somos nós.
É certo que, nalguns casos, o verbo ser é usado no singular apesar de o nome predicativo estar no plural, mas não é essa a regra.
Obrigado!
Resposta:
1. O tipo de construção em apreço descreve-se como uma frase em que duas expressões nominais ficam ligadas pelo verbo ser: «o professor da turma é aquele homem alto». A este tipo de frase, os estudos gramaticais e linguísticos têm atribuído várias designações: «frases identificacionais», «frases equativas», «frases copulativas», entre outros termos (ver Textos Relacionados). Deixando de lado a questão da identificação rigorosa do sujeito, acontece que o verbo ser concorda em várias situações não com a expressão à esquerda – convencionalmente, o sujeito –, mas, sim, com a expressão nominal que se encontra à sua direita – também por convenção, o predicativo do sujeito. Assim, por exemplo, numa frase como «a maior riqueza do mundo são as crianças», observa-se que o verbo está no plural, a concordar com a expressão «as crianças», e não com a expressão que se encontra à cabeça da frase («a maior riqueza do mundo»), posição habitual do sujeito da frase no português. Este comportamento do verbo ser manifesta-se em três situações (as referências autor/data são as que acompanham as obras mencionadas em nota1):
I – Concordância com o predicativo do sujeito que está no plural
A concordância com a expressão nominal à direita – isto é, com o "predicativo do sujeito" (quer o seja realmente quer não) – ocorre sobretudo no plural, em casos como os seguintes1:
(a) quando o sujeito é realizado pelos demonstrativos invariáveis isto, isso, aquilo bem como pelo pronome indefinido tudo e pelo pronome relativo o que , enquanto o predicativo do sujeito corresponde a um grupo nominal no plural: