Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Existe o substantivo comentarista.

As minhas perguntas são:

– Existe um adjetivo correspondente (não o encontrei em nenhum dicionário)?

– A existir, será comentarista, "comentarístico" ou outro?

Resposta:

Comentarístico é opção correta como adjetivo correspondente a comentarista.

O sufixo -ista forma substantivos (nomes) e adjetivos. Comentarista" pode ser, portanto, adjetivo, mas é corrente como nome, como sinónimo de comentador, e é assim que geralmente encontra registo nos dicionários.

Dicionário Priberam da Língua Portuguesa regista o uso adjetival, a par do nominal, e abona-o com o seguinte exemplo: « o jornalista agradeceu aos colegas comentaristas». Este é um exemplo ambíguo porque comentarista pode ser nome nesse contexto, tal como acontece em casos em que colega se associa a um nome próprio: assim como se diz «o colega João» [o colega que é (o) João], também se emprega «o colega comentarista» [o colega que é (o) comentarista].

Atendendo a que de automobilista e jornalista derivam automobilístico e jornalístico, respetivamente, tem, portanto, toda a legitimidade o emprego de comentarístico como adjetivo relacional, isto é, relativo ao nome comentarista.

O râguebi nos Jogos Olímpicos de Tóquio 2020
Algumas notas sobre terminologia e escrita

Alguns aspetos lexicais e curiosidades à volta do râguebi (ou rúgbi), a propósito das provas desta modalidade que se disputam de 26 a 31 de julho de 2021 nos Jogos Olímpicos de Tóquio, os quais deveriam ter tido lugar em 2020, mas foram adiados devido à pandemia de covid-19.

Pergunta:

Gostaria de saber se existe algum termo para designar um grupo de apenas duas obras, com uma conexão entre si.

Por analogia, todos sabemos que um conjunto de três obras corresponde a uma trilogia. Mas e se tratarem apenas de duas obras? Existe algum termo para tal? Por acaso, o termo 'bilogia' ou 'duologia' existem?

Agradeço antecipadamente a atenção dispensada para responder a esta pergunta.

Resposta:

Em português, usa-se pouco  dilogia (ou "duologia" e "bilogia") para designar um conjunto de duas obras do mesmo autor ou que constituem uma mesma série.

Há registos de dilogia (e dialogia), mas como sinónimo de diáfora, «figura na qual se repete uma palavra já empregada, com novo matiz de significação (p.ex.: não vale a pena ter pena do adversário)» (Dicionário Houaiss). Quanto a bilogia, o dicionário Michaelis inclui esta como vocábulo em desuso, com o significado de «tratado de dois assuntos diferentes em uma só obra».

No entanto, emprega-se díptico, termo que vem das artes plásticas, mas que, por extensão semântica, se aplica também a «conjunto de duas obras da mesma natureza e que se completam» (Infopédia; ver também versão eletrónica dp dicionário de Caldas Aulete). No dicionário Priberam  regista-se díptico, como adjetivo, associado a substantivos que denotam obras não necessariamente das artes plásticas: «6. Que é composto por duas partes (ex.: folheto díptico; painel díptico; obra díptica).»

Note-se que em inglês se regista dilogy e duology em referência a duas obras que se complementam, mas trata-se de uso discutível (cf. Wiktionary). Mesmo assim, a forma duology...

Pergunta:

Gostaria de saber se as expressões «barrar a manteiga no pão» / «barrar o pão com manteiga» estão ambas corretas.

Quanto à segunda, não tenho qualquer dúvida.

Muito obrigado!

Resposta:

Ambas os usos estão corretos.

O segundo é indiscutivelmente correto, mas o primeiro, embora não pareça ter registo em dicionários ou gramáticas1, é aceitável, visto que barrar ocorre como sinónimo de espalhar em construções como «manteiga (que é) fácil de barrar (em bolos/no pão/em tostas)» ou «manteiga para barrar ((em bolos/no pão/em tostas)». Além disso, não se conhece comentário especial ou preceito normativo que impeça ou desaconselhe usos como o de «barrar a manteiga no pão». 

Barrar, no sentido de «cobrir, revestir, untar», é um derivado de barro (cf. Dicionário Houaiss).

1 Foram consultados o dicionário da Academia das Ciências, o Dicionário Prático de Regência Verbal de Celso Pedro Luft, o Dicionário Gramatical de Verbos de J. Malaca Casteleiro e o Dicionário Sintáctico de Verbos Portugueses, de Winfried Busse.

Pergunta:

Sendo hálux (1.º dedo do pé) a forma preferível a hallux, gostaria de saber o plural para hálux.

Muito obrigado pelo excelente serviço prestado.

Resposta:

A palavra hálux é um substantivo masculino dos dois números, ou seja, não se altera no plural (cf. dicionário da Infopédia e Dicionário Priberam).

É vocábulo que ocorre nas seguintes aceções: «1 Rubrica: anatomia geral. o dedo grande do pé. 2 Rubrica: anatomia zoológica. o primeiro dedo das patas traseiras dos animais» (Dicionário Houaiss).