Carlos Rocha - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carlos Rocha
Carlos Rocha
1M

Licenciado em Estudos Portugueses pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, mestre em Linguística pela mesma faculdade e doutor em Linguística, na especialidade de Linguística Histórica, pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Professor do ensino secundário, coordenador executivo do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, destacado para o efeito pelo Ministério da Educação português.

 
Textos publicados pelo autor

Pergunta:

Por que no Brasil a abreviação de Atenciosamente é At.te?

Como a Academia Brasileira de Letras chegou a essa abreviação? Não consigo entender.

Por que tem esse ponto no meio, por exemplo? Não consigo achar essa resposta em site nenhum.

Quando essa pergunta aparece, simplesmente respondem que a abreviação é essa, e não “att.”.

Obrigado.

Resposta:

A forma At.te é a abreviatura tradicional de atenciosamente, palavra que, geralmente escrita com inicial maiúscula (Atenciosamente) é uma das opções para formular o fecho de uma carta formal1.

Em Portugal também se atesta a abreviatura At.te, pelo menos, desde 1940, conforme atesta o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa que a Academia das Ciências de Lisboa nesse ano publicou.

Uma abreviatura costuma ser formada por duas ou três letras da palavra seguidas de um ponto abreviativo e, depois, da terminação, geralmente em expoente, mas hoje também no mesmo tamanho que a parte inicial da forma. Por exemplo, professora tem a abreviatura prof.ª, com ponto abreviativo e a vogal final da palavra em expoente; sendo assim, At.teou At.te – é uma forma coerente com o procedimento descrito.

Consulte o que se escreve a dado passo na página dedicada às reduções no portal da Academia Brasileira de Letras:

«a) reduções tradicionais mais ou menos fixas (V., por você, V.M., por Vossa Mercê, Sr., por Senhor), chamadas abreviaturas».

 

1 Também se emprega Atentamente, cuja abreviatura se confunde com a de Atenciosamente.

Pergunta:

A Gramática Metódica da Língua Portuguesa, de Napoleão Mendes de Almeida, no §43 do cap. 3 (Vogais), fala acerca do timbre das vogais, que podem ser abertas (á, é, ó), ou fechadas (ê, ô).

Notou a falta do "a"? Pois bem, nas observações, Napoleão explica que o a fechado (â) é estranho ao português falado no Brasil, não se admitindo a pronúncia "mâs" para "mas" nem "câda" para "cada" no português brasileiro.

Não obstante, ele menciona o a antes de consoantes nasais (inclusive citando exemplos com acento circunflexo, como câmara), e o chama "abafado" (entre aspas mesmo, parecendo não pretender que tomem por classificação oficial, e sim como descrição). Já em sua tabela, chama nasal o "ã" e o "a" antes de n (ando).

Minha pergunta é: a vogal a, antes de n e m, no português brasileiro, é considerada fechada ou nasal?

Obrigada.

Resposta:

O uso terminológico abafado só é válido como recurso descritivo e didático do gramático brasileiro Napoleão Mendes de Almeida (1911-1998).

Na perspetiva deste autor, o a é "abafado" antes de m ou n seguidos de vogal (intervocálicos): fama, Ana. Trata-se da vogal que, em Portugal, sem grande rigor, se chama «a fechado», mas que nos estudos de fonologia e fonética se classifica como «vogal média recuada», mesmo em âmbitos não universitários (cf. Dicionário Terminológico)

A vogal em apreço torna-se nasal, se ocorrer antes de m ou n seguidos de consoante: ambos, manda. Este fenómeno ocorre tanto no Brasil como em Portugal ou outro país de língua portuguesa.

Os anglicismos dos ciberataques
A propósito do ataque informático ao grupo Impresa

Em entrevista feita pelo jornal Público, em 8 de janeiro de 2022, a Rui Duro, gestor da empresa de cibersegurança Check Point Software, nota-se uma profusão de termos técnicos em inglês que os mais ciosos do vernáculo desejarão evitar.

Apresenta-se de seguida uma lista dessas palavras com comentários sobre contextos e significados destas palavras, com a indicação de equivalentes portugueses possíveis ou já com uso efetivo e estável.

Pergunta:

Antes de mais o meu grato reconhecimento ao vosso site.

A minha questão é: como devo escrever "Al Andaluz"?

Com z final ou com s? Com hífen ou sem hífen? Ou ambos os casos são aceites?

Obrigado e bem hajam.

Resposta:

Não temos uma resposta categórica sobre o assunto.

A forma deste nome ainda não estabilizou e, portanto, há várias possibilidades1, entre elas, Al-Andalus e Al Andalus.

Também se aceita Andaluz, que do ponto de vista filológico tem ampla justificação2, apesar da desvantagem de se confundir com o gentílico correspondente à atual Andaluzia, ou seja, andaluz.

A forma escolhida é a forma que se deve manter ao longo de um mesmo documento.

 

1 O elemento al, que representa o artigo árabe, pode também ocorrer com letra minúscula inicial: al-Andalus e al Andalus. A forma al-Andalus é frequente em estudos académicos em diferentes línguas, designadamente em francês, por exemplo, nos estudos de Pierre Guichard,  Christophe Picard e Cyrille Aillet. Em Espanha, vários investigadores entre os quais se destaca o arabista espanhol Federico Corriente escrevem Alandalus, porque consideram que esta «[...] reproduce exactamente la pronunciación que usaban sus nativos, en lugar de Al-Ándalus, mero cultismo contemporáneo, no exento de pedantería [...]» (F. Corriente, Diccionario de Arabismos y Voces Afines en Iberromance, Madrd, Editoria...

Pergunta:

Já foi perguntado se se deve escrever «o dever haver» ou «o deve haver». No entanto, encontro dicionarizado «deve-haver» (dicionário da Porto Editora) e sempre ouvi «o deve e o haver».

Qual a formulação (ou formulações) correta(s)?

Obrigado.

Resposta:

As expressões corretas são deve-haver e «deve e haver» (ou «o deve e o haver», com artigo definido).

dicionário da Academia das Ciências de Lisboa (ACL) regista deve-haver como o mesmo que «o deve e o haver» ou «o débito e o crédito». A palavra composta tem registo, pelo menos, desde 1940, quando a ACL publicou o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, antes, portanto, do Acordo Ortográfico de 1945.

Refira-se ainda que, separadamente, deve e haver, que são em geral formas verbais, têm também registo como nomes comuns:

deve: no âmbito da contabilidade, «débito ou despesa (de uma firma) escriturada no livro razão» e «coluna desse livro na qual são registradas as despesas»; e, no campo lúdico, «modalidade do jogo de pião (praticada em Trá-os-Montes)» (Dicionário Houaiss).

haver: «a parte de uma conta ou de uma escrituração comercial que indica o que se tem a receber; crédito» (ibidem).