Carla Viana - Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
Carla Viana
Carla Viana
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Carla Viana é licenciada em Linguística e mestranda em Linguística Computacional pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

 

 
Textos publicados pela autora

Pergunta:

Em que medida o dicionário inverso dá o seu contributo na morfologia derivacional?

Resposta:

O dicionário inverso ordena as palavras pela ordem normal do alfabeto, mas começa pela última letra de cada palavra e assim agrega todas as palavras de acordo com a sua terminação.

Desta forma, o dicionário inverso permite ao utilizador fazer pesquisas inversas, por constituintes de palavras, por terminações ou por sufixo. Este tipo de dicionário é de grande utilidade para quem pretende investigar os sufixos e/ou as derivações das palavras.

Na morfologia derivacional dá-se origem a novas palavras através de processos derivacionais de formação de palavras. Ou seja, ocorre a formação de palavras pelo acréscimo de prefixos ou sufixos a um radical. Estes sufixos ou prefixos determinam a categoria sintáctica da palavra em que ocorrem:

 

[[anti]prefixo [rugas]N]ADJ

 

[[liga]TV[ção]]N

 

Assim, o dicionário inverso, como permite pesquisas inversas, revela-se de grande utilidade na morfologia derivacional, uma vez que permite estudar os sufixos presentes nas palavras derivadas.

Pergunta:

Será flora uma palavra da família de flor?

Resposta:

A família de palavras designa o conjunto de palavras que partilham um radical comum. Estas palavras podem ser formadas pelos processos de derivação ou de composição e estão relacionadas etimológica e morfologicamente com o seu radical.

Segundo o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, a palavra flor tem origem no latim flōs, flōris, enquanto a palavra flora provém do latim Flora «Flora, deusa das flores». Por sua vez, o nome latino original deriva do nome comum latino flos, floris, «flor». Ao observarmos a etimologia das duas palavras, podemos concluir que flora e flor possuem afinal o mesmo radical, logo, pertencem à mesma família de palavras.

Pergunta:

Na frase «Este cavalo é veloz», a palavra veloz pertence a que classe de palavras?

Resposta:

A palavra veloz presente na frase é um adjectivo. Os adjectivos são palavras variáveis, e os advérbios, palavras invariáveis. Estaremos na presença de um adjectivo se houver concordância:

«Estes cavalos são velozes.»

No caso da palavra veloz, ela funciona apenas como adjectivo. Se precisarmos de usar o advérbio, usamos a palavra velozmente. No entanto, existem muitos adjectivos que funcionam também como advérbios, como a palavra rápido.

Se a concordância puder não se verificar, então é porque a forma que não concorda é equivalente a um advérbio, por exemplo:

«Ela anda rápido.»

Pergunta:

Gostaria de saber quais são as vogais temáticas nominais e quais são os elementos mórficos da palavra inconstitucionalissimamente.

Resposta:

Declare-se em primeiro lugar que anticonstitucionalissimamente é mais uma possibilidade morfológica do que uma verdadeira palavra em português, porque a base da derivação, o adjectivo constitucional não tem flexão de grau: não são, portanto, aceitáveis expressões como *«este texto é mais constitucional do que aquele» (comparativo de superioridade), *«este texto é o mais constitucional de todos» (superlativo relativo de superioridade), *«um texto muito constitucional» (superlativo absoluto analítico) ou *«um texto constitucionalíssimo» (superlativo absoluto sintético).

Apesar destas restrições, encaremos anticonstitucionalissimamente como uma palavra e façamos a sua análise morfológica. Deste modo, os elementos mórficos que a constituem são os seguintes:

[[in] prefixo [[[[constitucion] radical nominal (do latim constitutionis) [al [ø] índice temático ] sufixo ] adjectivo [issim [a] índice temático] sufixo ]adjectivo [mente] sufixo ] advérbio] advérbio

 

Relativamente à questão da consulente sobre quais são as vogais temáticas nominais presentes na forma inconstitucionalissimamente, importa salientar que o constituinte temático, sufixo que especifica a classe morfológica a que um dado radical pertence, nos adjectivos e nos nomes denomina-se índice temático, enquanto nos verbos tem o nome de vogal temática.

No português, os índices temáticos são -a (mala), -o (porco...

Pergunta:

O processo de formação de palavras que formou o vocábulo ajuizado é um processo de derivação parassintética, ou um processo de derivação prefixal e sufixal?

Resposta:

A palavra ajuizado é particípio passado do verbo ajuizar e refere-se a alguém que tem juízo, que é sensato, prudente ou judicioso. Na terminologia jurídica refere-se a alguém que é posto em juízo ou processado.

Quanto à sua formação, a unidade lexical ajuizado é derivada por sufixação: 

ajuizar] verbo > ajuizado] adjectivo

Assim, a palavra ajuizado deriva de ajuizar, que por sua vez é uma palavra parassintética.

A derivação parassintética consiste na junção simultânea de um prefixo e um sufixo a uma forma de base, não sendo possível suprimir um dos afixos, por exemplo:

ajuizar

*ajuiza

*juizar

A derivação por afixação é um processo derivacional de formação de palavras em que intervêm, de cada vez, uma base ou radical derivacional e um afixo. As palavras que apresentam mais do que um afixo derivacional resultam de vários processos derivacionais, excepto os derivados por parassíntese.