Pergunta:
Eu gostaria de tocar mais uma vez num assunto que já foi tratado cá no Ciberdúvidas, porém as respostas ainda não me satisfizeram. No dia 8 de outubro de 2024, quanto à minha pergunta em torno da frase “Bons olhos o vejam” e quanto à sua colocação pronominal enclítica, vós me respondestes o seguinte:
«Quanto à colocação do clítico, a próclise (colocação antes do verbo) ocorre porque a frase é optativa/exclamativa. Quando a frase inclui uma palavra exclamativa ou a própria frase tem uma natureza exclamativa, esses fatores geram próclise.»
De tal resposta se conclui que não seria possível construções como essas: «Vejam-no bons olhos» e «Bons olhos vejam-no».
Entretanto, recentemente, ao tratar do uso do infinitivo pessoal no seu Dicionário de Questões Vernáculas, Napoleão Mendes de Almeida traz a seguinte frase: «Perdoe-te o céu o haveres-me enganado», isso que me fez questionar se há realmente possibilidade de usar a ênclise em orações subjuntivas independentes sem a conjunção que, quando o verbo é o vocábulo que inicia a oração, como a frase : «Perdoe-te o céu o haveres-me enganado.»
O que vós dizeis sobre isso?
Desde já, muito obrigado.
Resposta:
Relativamente à construção exclamativa (1), mantemos o que ficou dito nesta resposta. Trata-se de uma estrutura fixa, com pouca variabilidade, onde se opta pela próclise por se tratar de uma frase optativa.
(1) «Bons olhos o vejam!»
Noutro plano, se considerarmos frases como (2) ou (3), estamos perante outra realidade sintática:
(2) «Vejam-no bons olhos.»
(3) «Abracem-no as boas maneiras.»
Nestes casos, estamos perante construções optativas que não apresentam um constituinte em posição pré-verbal, como acontecia em (1). Nestas situações em que a frase inicia com a forma verbal, o pronome átono surge em posição enclítica1.
Com orações optativas iniciadas por que ou que apresentem um constituinte pré-verbal, o pronome átono surge em próclise:
(4) «Que me escrevas depressa!»
(5) «Deus te acompanhe!»
Disponha sempre!
1. Cf. Martins in Raposo et al., Gramática do Português. Fundação Calouste Gulbenkian, pp. 2272-2273.